24/06/2012

Primado e Colegialidade


 Demétrio Valentini *

A festa de São Pedro, neste final de semana, enseja uma boa oportunidade para conferir a posição do Concílio Vaticano II, neste ano do seu jubileu.


Uma das características deste concílio é o fato de ele ter sido convocado sem um problema específico a resolver. O Papa Pio XII tinha deixa a Igreja em perfeita ordem. A rigor, não havia necessidade de um concílio.

Na verdade, a pronta acolhida da ideia de um concílio, lançado por João XXIII, cedo se mostrou quantos assuntos podiam ser abordados com proveito, a nível de concílio.

Um assunto muito importante estava pendente desde o Concílio Vaticano I, que foi interrompido e não pôde ser concluído. Tratava-se de completar o ensinamento sobre o governo da Igreja. O Vaticano I tinha definido bem a função do Papa, explicitando sua incumbência de sinal de unidade e de garantia de fidelidade de toda a Igreja a Cristo.

Faltava falar da missão dos Bispos, que com o Papa partilham suas responsabilidades para com toda a Igreja.

A missão do Papa é reconhecida, de modo tradicional, como exercendo na Igreja o Primado, palavra que evoca a missão eclesial dada por Cristo a Pedro, de cuidar de todo o rebanho.

A missão dos Bispos é expressa pela "Colegialidade Episcopal", expressão cunhada pela Igreja para indicar a responsabilidade conjunta que Cristo confiou aos Doze Apóstolos.

Confirmando tudo o que o Vaticano I tinha dito a respeito do Papa, reconhecendo, portanto, o Primado concedido a Pedro, o Concílio se dedicou exaustivamente a propor com clareza a missão dos Bispos, definindo a "Colegialidade Episcopal"

Atenta ao formato que Cristo deu ao seu grupo de Apóstolos, o primeiro e fundamental "Colégio Episcopal", a Igreja faz questão de ressaltar sua continuidade, na mesma comunhão e na mesma missão. A missão confiada aos Doze, comporta a comunhão e a igualdade entre eles, e ao mesmo tempo a missão própria confiada a um deles, Pedro, a serviço da unidade e da fidelidade de todos os outros.

Para a vida da Igreja são indispensáveis tanto a dimensão de colegialidade, como a dimensão de primado. Ambas estão a serviço da comunhão eclesial e da fidelidade a Cristo.

Quando se rompe o equilíbrio entre Primado e Colegialidade, a Igreja fica exposta a rupturas, fáceis de irromper e muito difíceis de serem depois superadas.

Em todo o caso, da reta visão da colegialidade episcopal, e da visão da Igreja como Povo de Deus, derivam as grandes intuições pastorais do Concilio Vaticano II, mostrando que o fato do Concílio ter sido doutrinário, não invalidada sua importância pastoral.

E dito de outro ponto de vista, o fato deste Concílio ter sido "pastoral", não invalida o conteúdo "doutrinário" que ele ostenta.

Uma dessas grandes intuições pastorais ressalta a importância das Igrejas Locais, como concretizações da Igreja nas realidades onde ela se insere, na diversidade de raças e culturas.

Igualmente a importância das comunidades eclesiais, onde o Evangelho pode ser vivido na prática da convivência cotidiana e da inserção no mundo.

A Igreja da América Latina nunca colocou em dúvida a importância do primado de Pedro, expresso pela figura do Papa. Será que não estaria na hora de deixar mais espaço para o exercício da colegialidade, inclusive para que a Igreja Católica da América Latina tenha condições de ir ao encontro do povo que quer participar ativamente da vida da Igreja, e nem sempre encontra o espaço adequado nas atuais estruturas da Igreja.
De novo se percebe como a recepção do Concílio não esgotou ainda sua potencialidade.

* Dom Demétrio Valentini é bispo de Jales (SP).

Fonte: www.radiovaticana.org

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