Dom Anuar Battisti*
Muitas vezes só valorizamos algo quando o perdemos. Sentimos o quanto amamos alguém, quando se está longe. Essa experiência da perda faz parte da vida humana. No entanto, existem perdas que acontecem por vontade própria, por uma decisão pessoal, condicionada pelo meio em que se vive.
Ninguém nasce alcoolista, dependente químico, ladrão, assassino, corrupto, safado...
O ser humano está sujeito a todo tipo de situações que não dependem de uma decisão unicamente pessoal. Para que ele decida algo é levado em conta uma série de fatores, que vem desde a concepção, até a educação, a formação ética e religiosa. O meio ambiente em que vive é determinante na formação do caráter e da hierarquia de valores e das suas escolhas. A velha frase ainda vale: "Diga com quem andas e direi quem és!"
Diante das escolhas feitas durante a vida não adianta chorar o paraíso perdido. Cada ser humano é livre para escolher e é obrigado a aceitar as consequências das próprias escolhas. Não adianta buscar culpados, jogar a responsabilidade nos ombros dos outros. A família faz o seu papel, a escola faz a sua parte, as igrejas vivem a sua missão, porém ninguém pode determinar a trajetória de ninguém.
E tudo isso é lindo, é maravilhoso, mas também é o tendão de Aquiles de toda a humanidade. Neste fim de semana quando a campanha contra as drogas sai às ruas, descem pelas antenas em nossas casas, chegam aos ouvidos pelos mais variados meios de comunicação, devemos nos questionar: Será que estamos fazendo a nossa parte para evitar o crescimento do número de dependentes químicos?
As associações dos Alcoólicos Anônimos, a experiência do Amor Exigente, as casas de recuperação ou de apoio, as mais variadas obras sociais, todas são iniciativas que brotam do coração inquieto de quem quer um mundo melhor.
Muitas dessas entidades são mantidas pelo esforço de centenas de voluntários e de colaboradores, tocados pela dignidade e desejo profundo de resgate da cidadania. Com certeza são iniciativas louváveis, profundamente cristãs e humanitárias. Mas sabemos que enquanto dedicamos energias para recuperar um ser humano, há outros entrando no mundo das drogas.
Sabedores desta triste realidade, o que leva a continuar essa luta é saber que um cidadão recuperado é um cidadão a menos caído nas ruas. O trabalho fundamental de prevenção e repressão está cada vez mais complicado. Mas não podemos desanimar em recuperar o paraíso perdido.
Nunca pode faltar o apoio aos homens e mulheres da segurança pública. Temos que denunciar sem medo, pois sabemos muito bem que há, inclusive, autoridades, "gente grande" envolvida no tráfico de drogas, contribuindo com toda essa podridão. Por que não atacar a indústria, a origem de toda essa máfia organizada internacionalmente? Não existe outra resposta a não ser o desejo do lucro fácil, da ganância em acumular riquezas, em manter impérios econômicos, viver na mordomia à custa da morte de seres humanos.
Por outro lado, a busca da prática dos vícios nasce do vazio do ser humano, da falta de sentido na vida, da negação de Deus, da perda da dimensão sobrenatural. Tudo em nome da felicidade. Fazem o querem; nada e ninguém valem mais do que as suas decisões; pensam que tudo o que vem do outro é autoritarismo, manipulação, inclusive da escola, da Igreja, e da própria família.
Hoje virou moda não acreditar em nada que seja superior a própria intelectualidade. São senhores de si, do céu e da terra. Criam para si seus próprios deuses, constroem altares e templos para dizer que não têm fé. Tudo isso é pura saudades do paraíso perdido. No fundo, tudo isso é uma grande sede de voltar para Deus.
*Arcebispo Metropolitano de Maringá (PR)
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