09/04/2013

Acima de tudo, um observador

Nos meses de abril e maio, a Vila das Artes recebe mostra sobre o cineasta Jacques Tati, promovida pelo Sesc
Impossível não pensar em algum filme de Jacques Tati sem deixar escapar um sorriso. Ou um riso mesmo. Imortalizado por seus personagens cômicos, o ator e cineasta francês deixou um legado valioso não apenas no campo do humor, mas da estética, ao explorar meticulosamente elementos como cenografia, caracterização e expressão dos personagens, efeitos sonoros, cores ou contraste entre preto e branco – muitas vezes sem ajuda das palavras ou diálogos. 

Cartaz do filme Meu Tio, de 1954, que integra a mostra realizada na Vila das Artes

Não obstante, Tati ainda é pouco conhecido pelo grande público brasileiro. Pensando nisso, o Sesc, em parceria com a Embaixada da França e Cultures France, promove a mostra “Tati por Inteiro”, que chegou a Fortaleza no último dia 3, na Vila das Artes. As exibições acontecem durante os meses de abril e maio, toda quarta-feira, sempre às 18h30. A ação vem na esteira do sucesso da Mostra de Cinema Francês Contemporâneo, realizada em 2009 pela Embaixada da França, também em parceria com o Sesc. 

Na última quarta, a mostra teve início com o documentário “Tati: seguindo os passos do Sr. Hulot” (1986), dirigido por sua filha, Sophi Tatischeff. A produção apresenta Tati como autor, produtor e diretor, divulgando diversos registros de seu trabalho, elaborados ao longo de suas viagens pelo mundo.

Amanhã é a vez do filme “Carrossel da Esperança” (Jour de fête, 1949), primeiro longa-metragem de Tati, adaptado do curta “L' École des Facteurs” (1947) – por sua vez, a primeira produção do diretor a ganhar alguma notoriedade no meio. No roteiro, um carteiro (interpretado pelo próprio Tati, como viria a ser de praxe em suas futuras produções) assiste a um documentário sobre o correio nos EUA durante uma sessão de cinema ambulante e decide implementar aquelas técnicas de entrega de correspondência em sua pequena cidade. Sem sucesso, claro.
Segundo críticos, trata-se de um momento inicial de sua filmografia, que já anuncia a abordagem melancólica do tema da modernização da vida, mas ainda em tom de inocência. O argumento de “Carrossel da Esperança” foi premiado no Festival de Veneza e chamou atenção de produtoras.

Filmografia

Assim, Tati partiu par ao projeto que viria a ser o mais famoso de sua carreira: “As Férias do Senhor Hulot” (Les vacances de Monsieur Hulot, 1953), no qual criou a famosa personagem de cachimbo e guarda-chuva – considerada uma espécie de alter-ego do cineasta.

Na trama. Sr. Hulot vai passar férias em um balneário na costa do Atlântico, repleto de veranistas em descanso e lazer. Desastrado, o homem provoca situações de confusão, nas quais prevalecem a sátira e a crítica social. Nesse sentido, Tati revela-se um grande observador do cotidiano e do comportamento humano.

Com poucos diálogos, a produção segue uma lógica de filme mudo, pontuada por música e efeitos sonoros. É quando Tati começa a imprimir seu estilo próprio de trabalhar esses elementos.

Cinco anos depois, o cineasta recria Sr. Hulot no filme “O Meu Tio” (Mon Oncle, 1958), no qual a fica ainda mais evidente a crítica à modernização da sociedade em especial da Paris pós-guerra dos anos 1950, com seus excessos de preocupação com bens materiais e de consumo.

O roteiro gira em torno da família Arpel, que possui uma casa incrivelmente funcional em um bairro muito bem localizado. Infelizmente, pelo menos para a Sra. Arpel, seu irmão, Sr. Hulot, não se enquadra naquilo que considera apropriado – entre seu amor por cães de rua e sua aversão pelas belezas industriais. Pior, tem uma influência forte sobre o filho do casal, que insiste em imitá-lo. 

O filme estreou no XI Festival de Cannes, no qual recebeu o Prêmio Especial do Júri. No ano seguinte, foi vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

Tati só voltaria a filmar em 1964, quando começou a trabalhar em “Tempo de diversão” (Playtime), lançado em 1967. O longo tempo de execução deveu-se ao porte do filme, com seu cenário colossal para a época – praticamente uma cidade, com restaurantes, farmácias, prédios comerciais e um aeroporto. Segundo historiadores do cinema, foi a produção francesa mais cara da época, que levou o diretor à falência.

Em “Tempo de diversão”, Tati volta a encarnar Sr. Hulot, dessa vez como um parisiense “perdido” em uma Paris moderna e emaranhada de edifícios. Ao mesmo tempo, ele encontra um grupo de turistas americanas.
Depois dos prejuízos, Tati precisava fazer um filme para reequilibrar sua situação financeira. Assim surgiu “As aventuras do Sr. Hulot no trânsito louco” (Trafic), filmado na Holanda. Por fim, o cineasta dedicou-s e a “Parada” (Parade, 1974), filmado em parte em vídeo e financiado pela televisão sueca. Trata-se de uma performance circense filmada, na qual Tati realiza seus atos de mímica.

Ao longo da mostra, haverá ainda um dia dedicado aos curtas-metragens do cineasta, com “Cuida da tua esquerda”, de 1936, o já mencionado “Escola de carteiros” (1947) até “Curso noturno”, de 1967. 

Mais informações

Mostra Tati por Inteiro. Toda quarta-feira, às 18h30, na Vila das Artes (R. 24 de Maio, 1221, Centro). Gratuito. Contato: (85) 3452.9090

ADRIANA MARTINSREPÓRTER
Diário do Nordeste

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