20/08/2013

Migrantes haitianos no Brasil vivem iminência de crise humanitária, denuncia organização

Adital
Ângela Perez/ Agência de Notícias do AcrePreocupante é a palavra que minimamente define a situação dos haitianos que migram todos os dias para o Brasil em busca de melhores condições de vida e de trabalho. Muitos deles têm formação profissional, mas não conseguem emprego em seu país, sonhando poder exercer na nova terra a profissão para a qual estudou. Por enquanto são apenas sonhos, pois, segundo reportagem da Agência de Notícias do Acre (www.agencia.ac.gov.br), professores, técnicos de enfermagem, mecânicos, contadores, pedagogos, alguns com inglês fluente, conseguem trabalho explodindo pedras, perfurando rochas, na construção civil, varrendo ruas, como garis, depenando galinhas, carregando mercadorias, vendendo artesanato, entre outras ocupações. Mas eles não reclamam, bem ou mal, conseguem trabalho e planejam trazer a família.
Apenas este ano cerca de 3 mil haitianos já entraram no Brasil pela pequena cidade de Brasiléia, de 20 mil habitantes, no Estado do Acre, próxima da fronteira com a Bolívia. Desde o terremoto de 2010, a estimativa é de que 6 mil haitianos tenham aportado no Brasil pelo Acre. A grande maioria chega de forma ilegal, aproximadamente 40 por dia, contando com o suporte de atravessadores pagos. O governo brasileiro prometeu conceder até 1.200 vistos humanitários para migrantes haitianos por ano, mas essa decisão já foi revogada em abril de 2013, segundo informações da ONG Conectas. Restou apenas a disposição para o risco de uma viagem de 15 dias, passando pela República Dominicana, Panamá e Peru, até chegar à fronteira e à possibilidade de, já em solo brasileiro, conseguirem permissão para trabalhar.
Ângela Peres/ Agência de Notícias do Acre
Sair de um Haiti devastado pelo terremoto (quase 250 mil mortos) e com 80% dos habitantes vivendo abaixo da linha pobreza, foi a saída encontrada por Vilsaint Letesse, entrevistado pela Agência de Notícias do Acre. Pedagogo de formação, ele deixou a esposa e a filha para trás em janeiro de 2012. Conseguiu emprego na usina hidrelétrica de Santo Antônio, em Rondônia. Seu trabalho é explodir pedras. Um ano depois, ele já conseguiu trazer a esposa e planeja mandar buscar a filha, que foi deixada aos cuidados da avó. A filosofia é que qualquer trabalho fixo é melhor do que não ter nenhuma perspectiva.

Até saírem de Brasiléia e conseguirem um trabalho, os imigrantes ainda precisam passar por mais uma provação, aguardar num abrigo a permissão do governo para trabalhar no Brasil. Cedido pelo Governo do Estado, o espaço tem capacidade para 200 pessoas, mas conta atualmente com mais de 800, o que fez com o que o governo acreano decretasse estado de emergência social. A ONG Conectas denuncia a iminência de uma crise humanitária nesse "campo de refugiados”. Além dos haitianos, a grande maioria, já há registro de migrantes dominicanos, senegaleses e até um de Bangladesh.
João Paulo Charleaux, coordenador de Comunicação da Conectas, que esteve no local, afirma que o Brasil maquia uma crise internacional e precisa articular uma solução urgente no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização dos Estados Americanos (OEA). Os mais de 800 migrantes dividem apenas cinco latrinas e 10 chuveiros, com esgoto correndo a céu aberto e pessoas amontoadas num espaço de 200 metros quadrados, com teto de zinco, lonas plásticas servindo como divisória e um calor de até 40 graus.
Muitas delas estão sendo atendidas no pequeno hospital de Brasiléia com crises de diarreia e problemas respiratórios. Na hora da distribuição de comida é comum a ocorrência de tumultos, contidos com total despreparo pelos funcionários do governo destacados para a tarefa de organizar o abrigo. Para o diretor da Conectas, eles não têm experiência prévia na gestão de questões humanitárias e não dispõem de tradutor. Mas não basta boa vontade e dedicação.

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Ângela Peres/ Agência de Notícias do Acre
ata-se de uma questão regional, que envolve, pelo menos cinco países: Brasil, Peru, Bolívia, Equador e Haiti. Pediremos a realização de uma audiência temática na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA e enviaremos nossas constatações a dois relatores independentes da ONU, um para migrantes e outro designado para acompanhar a situação de direitos humanos no Haiti”, afirma Charleaux.

A Conectas apurou que o Estado do Acre tem uma dívida de R$ 700 mil com a empresa que provê alimento para o abrigo e o prazo para pagar terminaria no último dia 15 de agosto. Há três meses não há repasse de verba do governo federal destinado ao atendimento dos migrantes haitianos. Além disso, na avaliação de Charleaux, Brasiléia é um barril de pólvora que pode explodir a qualquer momento, pois os moradores afirmam que não aguentam mais a situação. Os hospitais ficam lotados e há competição com os moradores por vagas de emprego.

Com prefácio do Prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel, a Adital lançou em 2013 o livro "Haiti por si: a reconquista da independência roubada”. A publicação resgata história do país mais pobre da América Latina e Caribe e tenta mostrar quer os próprios haitianos podem ser protagonistas da reconstrução do país em áreas como soberania alimentar, economia, cultura e democracia participativa. Para adquirir o livro acesse aqui.

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