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Por Marco Politi
O silêncio do L´Osservatore Romano sobre a sentença da Corte Constitucional italiana, que legalizou a fecundação heteróloga, é o sinal mais evidente da mudança de clima introduzido pelo papa Francisco em relação à temática da bioética. Nenhuma excomunhão, nenhuma cruzada.
Que fique claro: o pontífice argentino não muda uma vírgula da posição doutrinal da Igreja Católica. Quando os mesmos problemas – hoje sob a atenção da opinião pública na Itália – explodiram em Buenos Aires, a Conferência Episcopal Argentina, juntamente com o cardeal Bergoglio, se pronunciou claramente contra a fecundação heteróloga, a barriga de aluguel e o casamento gay. Desde então, a sua atitude não mudou. O seu "não" continua.
O que o novo clima do pontificado reflete é a vontade de não interferir como Santa Sé em uma questão que diz respeito ao Estado italiano, porque os problemas de cada nação são de competência dos episcopados locais. As relações com as instituições e a situação sociopolítica italiana – disse o Papa Bergoglio, encontrando logo após a sua eleição os prelados da Conferência Episcopal Italiana (CEI) – são "coisa de vocês". E o repetiu duas vezes para deixar claro que não haveria mais instruções da Secretaria de Estado vaticana sobre como gerir os assuntos italianos.
Naturalmente, isso implica que o pontífice concorda com as interrogações postas pela presidência da CEI quando é contestado um direito individual à filiação "desvinculado de qualquer visão relacional", negligenciando também, desse modo, o "direito do filho de conhecer a sua própria origem biológica". Mas, mesmo nesse caso, uma mudança de terminologia no comunicado da presidência da CEI sinaliza um novo modo de abordar problemáticas que, durante o pontificado de Wojtyla e de Ratzinger frequentemente desencadearam guerras religiosas. Na CEI, expressa-se o "necessário respeito pela obra da Corte Constitucional" e não se lançam raios, mas são trazidos à atenção "alguns pontos problemáticos".
Dessa forma – e este é o segundo elemento de novidade da situação que foi gerada com o advento de Bergoglio – a discussão é deslocada para um terreno mais laico. Em vez de uma reproposição de uma "verdade" que cai de cima em nome de uma dogmática lei divina, abre caminho um debate, mesmo que polêmico às vezes, sobre visões diferentes de mundo e das relações.
No L´Osservatore Romano, significativamente, Lucetta Scaraffia levanta a questão (no caso da mulher de Milão) de uma gravidez que começou aos 54 anos, declaradamente fora do ritmo biológico normal das mulheres. No que se refere à barriga de aluguel, a colunista do jornal vaticano, retomando temáticas expostas na França pela filósofa feminista (obviamente laica) Sylviane Agacinski, foca a atenção sobre o risco (que hoje tende a se tornar práxis já) de um mercado que leva ou força por necessidade mulheres pobres do Terceiro Mundo a "vender o seu corpo ou na forma de óvulos ou como útero". Não estamos aqui – pergunta-se Scaraffia – na presença de uma nova forma de exploração?
É evidente que, a partir desse ponto de vista, a problemática passa a fazer parte do âmbito da visão de mundo de cada pessoa; apela a uma reflexão sobre a relação entre as novas tecnologias e a utilização do corpo das mulheres (quer se trate de barriga de aluguel ou útero "emprestado"); em última instância, é um apelo ao legislador para avaliar o que é mais positivo em relação ao "humano".
Não é evidente que aqueles que, por exemplo, no momento da legislação sobre o aborto – lutando por aquilo que era considerado legitimamente como uma conquista das mulheres –, rejeitavam a ideia da "mãe-contêiner", forçada a levar a termo uma gravidez indesejada, sejam hoje automaticamente a favor da "mulher-contêiner", que, por dinheiro ou solidariedade, passa por uma gravidez em nome de terceiros.
Em outras palavras, tendo saído do campo dos dogmas impostos ex cathedra, entra-se na dimensão da discussão livre, em que não é óbvio que a barriga de aluguel seja em si mesma "progressista" e a rejeição de tal práxis seja por si só "reacionária".
Não é por acaso que, no mundo judaico, tradicionalmente não obcecado pela fobia sexual que caracterizou durante séculos a doutrina católica, manifestam-se perplexidades sobre a fecundação heteróloga. Há um grande favor aos procedimentos de reprodução assistida para superar as dificuldades de um casal, explica o rabino-chefe de Roma, Riccardo Di Segni, mas, em relação à fecundação com óvulos ou gâmetas de terceiros, a avaliação muda dramaticamente e é negativa.
"É um procedimento desaconselhado, até por motivos éticos e psicológicos", afirma Di Segni. "Devemos nos interrogar, por exemplo, sobre a identidade do doador, sobre as possibilidades de que sejam transgredidas algumas proibições, incluindo a proibição gravíssima do incesto (sobre os filhos do doador) e sobre os problemas que podem surgir nas relações pai-filho e mãe-filho".
Il Fatto Quotidiano, 11-04-2014.
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