Maria Clara Lucchetti Bingemer
Teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio
Adital
As novas tecnologias trouxeram à humanidade um sem número de mudanças comportamentais, físicas, mentais e existenciais A própria maneira do ser humano entender e administrar sua corporeidade, sua subjetividade, sua identidade mais profunda e verdadeira hoje não pode prescindir da contribuição e da presença que estas novas tecnologias trouxeram ao cotidiano das pessoas.
O telefone celular revolucionou a concepção de espaço. É uma extensão do próprio corpo humano e faz a pessoa móvel e encontrável em qualquer tempo e lugar. Não existe mais possibilidade de preservar a própria intimidade, pois em qualquer lugar onde se esteja, o espaço pode ser invadido por um toque da campainha do celular, chamando a pessoa à realidade de que ela não tem mais como se esconder, a não ser desligando o aparelho.
Nesse sentido, o isolamento e a solidão onde eram e são ainda gestadas as grandes reflexões e contemplações que fizeram a humanidade caminhar ao longo de tantos milênios e séculos, hoje encontram-se sob novo regime. O telefone celular, em uma casa de retiro por exemplo, permite que a pessoa fuja às recomendações do pregador e faça chamadas furtivas para a família ou os amigos, rompendo o silêncio que aquele ambiente, onde está por opção, pretenderia garantir.
Por outro lado, a internet mudou radicalmente a concepção de tempo. Em questão de segundos pode-se falar e ser respondido para e por qualquer latitude e lugar do mundo e do universo. Pesquisas são feitas pela internet, bibliotecas acessadas. Fora os encontros e as salas de chat que, em tempo virtual mas não menos real, proporcionam às pessoas discussões temáticas, conversas íntimas, encontros que depois se desdobram no tempo real.
A rapidez com que essas novas tecnologias se fizeram parte do cotidiano de tantos e tantas, no entanto, traz também novas possibilidades e muitas vantagens, abrindo um sem número de novos horizontes. Mesmo em termos de vida espiritual e de oração.
Para as pessoas que, por exemplo, passam o dia na frente de um computador, este pode converter-se muitas vezes em capela. São cada vez mais numerosos os sites que oferecem orientação para a oração diária, com textos bíblicos, capelas virtuais, e mesmo a possibilidade de conversar com algum orientador que se disponha a receber consultas e dar conselhos para a vida espiritual através do mundo informático.
Da mesma maneira, o telefone celular pode ser uma preciosa ajuda para que alguma conversa ou consulta espiritual seja feita em questão de segundos, até mesmo quando as pessoas se encontram em países e mesmo continentes diferentes.
Muitos pensadores nos têm alertado para os perigos e riscos de que estas novas tecnologias nos obliterem para as relações humanas mais profundas e mesmo nos conduzam a um pensar que terá muito de superficial e pouco de realmente refletido e assimilado.
No entanto, cabe aqui o discernimento. Sabendo usar as novas tecnologias, elas podem também ser um poderoso instrumento de ajuda à vida espiritual e até mesmo à missão. Pelo espaço cibernético podem circular textos, poemas, orações, enfim, materiais que, compartilhados em tempo recorde, farão bem a corações angustiados e espíritos abatidos. Poderão também oferecer novo atrativo às pessoas que buscam uma vida espiritual e desejam vivê-la intensamente ainda que em meio ao seu agitado cotidiano.
Como toda conquista humana, fruto da criação de Deus, deixemos que as novas tecnologias nos elevem o espírito e não o embotem. Que o fecundem e não o esterilizem. Assim, novos horizontes se abrirão para a vivência da relação com a Transcendência que se faz cada vez mais necessária e desejada nos dias que correm.
[A escritora é autora de "Crônicas de cá e de lá” (editora Subiaco), que pode ser encomendado diretamente à escritora pelo e-mail – agape@puc-rio.br – Preço: R$ 20,00.
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