06/03/2014

A hipocrisia em que o Brasil naufraga

Condena-se a malícia de camisetas Adidas e exalta-se a nudez explícita da mulata Globeleza.
As camisetas Adidas são mais provocantes que a mulata Globeleza em sua nudez explícita?
Por Carlos Eduardo Leão*

Causam-me espécie algumas incongruências de pensamento que nos cercam como povo e nação. Algo fortemente ligado à hipocrisia que, por sua vez, é a arte da dissimulação. Algo que, no pensamento de Nietzche, tem tudo a ver com jogo e manuseio de máscaras que conduzem a um formato ético-estético de criação de si ou de fatos como uma verdadeira segunda natureza. Enfim, o hipócrita é o ator ou atriz interpretando a conveniência.

Exemplo dessa assertiva são as camisetas mundiais da Adidas criadas para propagar a Copa no Brasil e recentemente proibidas por estamparem motivos pretensamente ligados ao sexo ou à sua propaganda. Foram  tidas e havidas pela Embratur  como algo intolerável por macular definitivamente os princípios morais da maior nação católica do mundo. Estimulariam o execrável turismo sexual. Seriam  mais um atrativo aos forasteiros que se cansarem de Neymar, Cristiano Ronaldo, Messi, Rooney, Iniesta e companhia.

As estampas, para os muito detalhistas ou para os que têm apenas sexo no pensamento, podem, realmente, remeter as referidas camisetas ao apelo sexual já que aludem a bumbuns "cobertos" por "fio dental" que, por estarem virados para cima, adquirem a forma de coração. E, para piorar a situação, o "coração" substitui a palavra "love" na frase "I love Brazil". Na outra estampa, uma bela brasileira de biquini cobrindo sumariamente um corpo escultural é apreciada por um "Lookin´ to score" onde os dois "os" do Lookin´ funcionam como olhos desejosos da modelo. Gravíssimo!

É muito louvável a preocupação de nossas autoridades com a preservação da  "família, tradição e costume" do brasileiro e de sua imagem internacional. Apenas pergunto, aos que me lêem, se a escultural Globeleza, literalmente pelada e artisticamente pintada para camuflar discretamente o desejo, sambando com a sensualidade que excita e incita, mostrando ao mundo o atual carnaval brasileiro com toda performance dos passos perfeitos e traços físicos dignos dos cinzéis de Michelangelo, está incluída nos mesmos padrões das camisetas? Acho que não, senão não seria ela a nossa embaixadora do carnaval mundo afora. E aí, Nietzche? Dureza, não?

Nossas praias, cantadas em verso e prosa para os quatro cantos da Terra, são mostradas ao mundo como atrativos importantes na divulgação do país para o turismo internacional, sempre ajudadas pelas nossas belezas naturais filmadas em close-up e confirmando a máxima de que aqui temos, também e principalmente, as mais lindas bundas do planeta. Tudo isso embalado no hit Lepo Lepo, cuja letra, uma ode explícita ao sexo, canta "Eu não tenho carro, não tenho teto / E se ela ficar comigo é porque gosta / Do meu ranranranranranranran lepo lepo / É tão gostoso quando euranranranranranranran o lepo lepo", maximizada, claro, por uma bela coreografia pornô  que regeu  o carnaval 2014.

E a violência? Para não incitá-la, nossas atentas autoridades proibiram rinhas de galo, cachorro, passarinho, armas de brinquedo e outras medidas de eficiência questionadas. Enquanto isso, o sangue só falta jorrar em nossas salas de TV seja com as notícias estarrecedoras  nos telejornais, nos cidadesalerta, nos teste de fidelidade da vida, seja nas propagandas dos MMAs, dos UFCs ou no incentivo cada vez maior às práticas marciais e assemelhados com finalidades muito pouco ortodoxas em relação à sua real e milenar filosofia. Enfim, todos os ingredientes necessários para perpetuá-la em nossa cultura, hoje muito bem representada pelos Blackblocs, pelos justiceiros dos postes, pela polícia despreparada e pela crescente agressividade da população.

Conta a lenda que nos bastidores do Supremo, Barroso, em relação aos mensaleiros, fez a seguinte pergunta para Joaquim Barbosa: "Teve quentão? Teve foguete? Teve fogueira? Teve sanfona? Não.!!!", responde Barbosa. "Então não foi quadrilha", rebate Barroso.

Este mesmo dissimulado Luis Roberto Barroso acertou na mosca quando disse que, para a infelicidade do presidente Barbosa, o seu voto tinha o mesmo valor do dele. Certamente, meu caro ministro. Os votos realmente são iguais. A diferença está no homem.
*Carlos Eduardo Leão é médico e cronista.
Dom Total

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