Ao transitar por Fortaleza, não é difícil encontrar, seja nos cruzamentos, nas praças ou terminais de ônibus, crianças pedindo dinheiro. Contudo, o que muitos não sabem é que dar esmola para crianças, em vez de ajudá-las, pode atrapalhar ainda mais a sua saúde e o seu retorno para as famílias.
Em 2013, de acordo com pesquisa do observatório nacional da campanha Criança não é de Rua, que reúne várias entidades da sociedade civil e do poder público, 178 meninos e meninas estavam em situação de rua no Ceará, destas, 106 estão na Capital. Outra pesquisa está sendo desenvolvida pela Prefeitura de Fortaleza, para saber qual o perfil do morador de rua na cidade, que deve ser divulgada ainda este semestre.
Futuro
Segundo o promotor de Justiça Edson Landim, a prática de dar esmolas para crianças é extremamente prejudicial. “Dar esmolas não garante o futuro da criança, mas ajuda a manter a sua situação de vulnerabilidade social. Isso porque, na maioria das vezes, essa criança é explorada por alguém ou vai usar o dinheiro para comprar álcool, cola ou crack”, destaca.
Para conscientizar a população sobre os males que dar esmolas podem causar na vida das crianças em situação de rua, o Ministério Público iniciou neste mês a sétima edição da campanha “Não dê esmola à criança em situação de rua”. Ontem, sexta-feira, o cronograma da campanha teve início com panfletagem e bandeirada na Avenida Silas Munguba, em frente ao Campus do Itaperi, da Universidade Estadual do Ceará (Uece).
Conforme o promotor de Justiça, o lançamento oficial da campanha irá acontecer no próximo dia 17 de maio. “Fizemos essa primeira ação no Itaperi para sensibilizar os universitários, que são formadores de opinião. A nossa intenção é conscientizar as pessoas, porque estamos bem próximos ao período da Copa do Mundo. O Castelão fica próximo a três terminais de ônibus em que é comum encontrar crianças em situação de rua. Queremos prevenir a exploração sexual dessas crianças e também o tráfico de pessoas”, ressalta.
Perfil
Apesar de ainda não ter sido concluída uma pesquisa que revele o perfil dessas crianças, o promotor de Justiça aponta uma entrevista que ele mesmo fez, com 48 crianças, que viviam próximo ao Terminal da Parangaba.
“A maioria tem mais de 8 anos, é criada só pela mãe que, ou foi abandonada pelo companheiro ou é viúva, e não estudam porque não têm documentos, como a certidão de nascimento”, destaca Edson Landim.
Com o objetivo de reencaminhar essas crianças para a comunidade ou suas famílias de origem, existe o Projeto Ponto de Encontro, desenvolvido pela Secretaria de Direitos Humanos da Prefeitura de Fortaleza.
De acordo com a coordenadora do projeto, Patrícia Queiroz, essa iniciativa faz contato direto com as crianças e adolescentes, através de 30 educadores sociais, presentes em vários pontos da cidade, como a Avenida Beira-Mar e os terminais da Parangaba e da Lagoa.
“Esses profissionais atuam em dupla ou em trio e dependendo da situação da criança ou adolescente, encaminhamos para a família, para os albergues e abrigos ou para tratamento de drogadição”, enfatiza a coordenadora do programa.
Entretanto, de acordo com as informações de Patrícia Queiroz, cerca de metade dessas crianças não conseguem ser reinseridas no ambiente familiar. “O nosso maior desafio é quando eles estão acompanhados das famílias na rua, porque aí eles não tem para onde voltar. E muitas dessas famílias também tem membros viciados em drogas”, acrescenta.
Superação
O recepcionista Fernando Iago Ferreira, aos 5 anos, vivenciou essa situação. “Eu fui pra rua com 5 anos de idade e fiquei até os 9. Fui influenciado por dois tios que ainda hoje moram nas ruas”, disse.
A sua situação mudou quando recebeu o convite da Organização Não-Governamental (ONG) O Pequeno Nazareno, que trabalha para garantir proteção às crianças e adolescentes com esse perfil.
“Nós realizamos o acolhimento institucional e temos uma unidade com 53 hectares em Maranguape, na Região Metropolitana de Fortaleza, para acolher essas crianças. Lá, elas estudam, fazem esportes. Hoje, uma ou duas crianças desistem de ficar na casa durante o ano. Mas, quando começamos, não era assim. Em 1996, por exemplo, 80% das crianças que foram acolhidas, desistiram”, explica o coordenador de projetos da ONG, Adriano Ribeiro.
Fernando Ferreira guarda boas recordações dos momentos que passou no Pequeno Nazareno. “Aceitei o convite e morei lá por oito anos. A hora que mais gostava era a de praticar esportes, principalmente de futebol. Gostaria que os meninos e meninas que estão hoje nas ruas de Fortaleza tivessem a sorte que eu tive, de encontrar uma instituição que acreditou em mim”, ressalta.
Kelly Garcia
Repórter
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Diário do Nordeste
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