Dom Alberto Taveira Corrêa*
Nas primeiras páginas do livro da criação (Cf. Gn 1–4), o autor sagrado expôs com perspicácia a sabedoria como Deus criou o mundo e nele introduziu, ao final da luminosa descrição poética e profundamente religiosa, o homem e a mulher, feitos à sua imagem e semelhança, com inteligência e liberdade. Deus, fonte de todo bem, viu que tudo era muito bom (Gn 1,31). Começou a aventura da liberdade!
Muitas pessoas foram convocadas por Deus a participarem da construção de uma história de salvação. Noé encontrou graça aos olhos do Senhor (Gn 6,8), quando a terra estava cheia de violência (Gn 6,13). Abraão foi escolhido e chamado por Deus (Gn 12), também Moisés (Ex 3), Samuel (1 Sm 3), Isaías (Is 6) e Jeremias (Jr 1), ao lado de tantos outras pessoas, que aprenderam, no meio de luzes e sombras, a discernir a voz do Senhor. E ainda foram muitas as histórias de infidelidades, pecados, traições, nas quais um povo de cabeça dura (Ex 32,7-14; Atos 7, 51) voltou atrás, depois de se decidir pelo seguimento da palavra do Senhor. E Deus, em sua misericórdia, sempre estava aberto para o perdão.
Na plenitude dos tempos (Gl 4,4), foi chamada uma jovem, quem sabe, apenas adolescente, a Virgem Maria, na qual o Céu encontrou a mais transparente de todas as respostas (Lc 1–2). Nela a Palavra Eterna de Deus se fez carne. Em nome da humanidade foi o “sim” que a Deus agradou, a contrapartida da humanidade para se realizar a salvação, mãe que fez a vontade de Deus (Cf. Mc 3,34). E veio Jesus Cristo!
Depois dos anos vividos em Nazaré, Jesus vai ao Jordão, acolhe a voz do Pai e a manifestação do Espírito Santo e inicia a pregação do Reino. Jesus chamou os primeiros apóstolos, abriu o leque para convocar o que foram chamados de discípulos, envolveu famílias amigas, como vemos nas visitas a Marta Maria e Lázaro, teve colóquios de amizade e confidência com Pedro, Tiago e João, olhou com amor provocante e desafiador para muitas pessoas, suscitando nelas a decisão pelo seu seguimento, dirigiu-se às multidões, consolou, curou e perdoou! Ninguém passou em vão ao seu lado!
No correr do caminho, conquistou discípulos e amigos, mas também granjeou reações ferrenhas de seus opositores e esteve com grupos que lhe prepararam verdadeiras armadilhas verbais (Cf. Mc 11–12). Para estupor de todos os que nele depositam a segurança de suas vidas, foi até considerado um homem possuído por Belzebu (Cf. Mc 3,20-35). Sabemos que muitas ciladas foram preparadas para prendê-lo, o que só aconteceu quando chegou a hora de passar deste mundo para o Pai (Jo 13,1). Ele é Senhor da História, mas submeteu-se ao julgamento da própria história, deixando aberta a margem da maravilhosa e terrível realidade da liberdade humana, para que todos os seres humanos possam decidir-se diante dele. Os que se decidem pelo seu seguimento participarão de suas alegrias e também de suas provações ou privações. A eles caberá usar o precioso dom da liberdade, para tomar decisões acertadas, para se erguerem das próprias quedas e assumirem o norte de suas vidas, iluminados que foram pela bússola da fé.
São Paulo, um dos chamados na undécima hora (Gl 1,11-24), fez a experiência da fé em Jesus Cristo (2 Cor 4,13–5,1). Nele é possível encontrar alguns critérios para as decisões a serem tomadas, pois todos nós somos igualmente chamados o seguimento de Cristo, aprendendo a pensar o que é certo e realizá-lo (Oração do dia do IX Domingo do Tempo Comum).
A luz da fé, suscitada pelo seguimento de Jesus, provocado pelo anúncio da salvação, é o horizonte para as decisões. O cristão não é indiferente diante dos cruzamentos das estradas de sua vida. Ele escolhe o que é conforme a Cristo e ao seu Evangelho, sem medo de nadar contra a correnteza. Por causa de sua fé, fala e dá testemunho corajoso (2 Cor 4,13), superando a pusilanimidade que conduz à omissão vergonhosa. Para tanto, sua força está na oração, com a qual experimenta a presença certa daquele Senhor que escolheu para seguir (1 Ts 5,17; 2 Ts 1,11.3,1).
Diante das dificuldades, é sua tarefa vencer o desânimo (2 Cor,16-17) e erguer os que estão caídos. Cabe-lhe sempre tomar a iniciativa! Sabe que os sofrimentos, as dores e a própria morte não têm a última palavra, pelo que se renova dia a dia (2 Cor 4,16) e aposta sua vida no que é invisível e eterno (2 Cor 4,18).
Decisões a partir da fé, oração, iniciativa, coragem diante dos obstáculos, capacidade de olhar para o alto! Nada menos do que a proposta da Igreja para todos e não para um grupo de privilegiados. A decisão está nas mãos de nossa liberdade!
*Arcebispo metropolitano de Belém do Pará.
Fonte: ZENIT
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