24/10/2012

O Cardeal Lorscheider e o Vaticano II


Padre Geovane Saraiva*

Dom Aloísio Cardeal Lorscheider (1924-2007), foi aquele que melhor compreendeu o Concílio Vaticano II, num esforço de vivê-lo, na mais profunda coerência, destacando-se como defensor destemido da criatura humana em toda sua plenitude. Daí sua corajosa e profética sabedoria, ao afirmar: “O vaticano II faz-nos passar de uma Igreja-Instituição por uma Igreja-sociedade perfeita para uma Igreja-comunidade, inserida no mundo, a serviço do reino de Deus; de uma Igreja-poder para uma Igreja pobre, despojada, peregrina; de uma Igreja-autoridade para uma Igreja serva, servidora, ministerial; de uma Igreja piramidal para uma Igreja-povo; de uma Igreja pura e sem mancha para uma Igreja santa e pecadora, sempre necessitada de conversão, de reforma; de uma Igreja-cristandade para uma Igreja-missão, uma Igreja toda missionária”.

Jamais podemos esquecê-lo, na sua doçura e ternura em pessoa, alegria constante, posições corajosas e determinadas, ao mesmo tempo, pregava e anunciava o Evangelho com coragem profética e grande sabedoria, carregando sempre no seu grande coração as alegrias, as esperanças, as tristezas, as angústias e os sofrimentos de sua querida gente (cf. GS 200). Além de travar, sem jamais se cansar, uma luta pela redemocratização, pela liberdade de expressão, pela dignidade da pessoa humana e pelo fim da tortura em nosso querido Brasil.

Dom Sérgio da Rocha, Arcebispo de Brasília, fala assim:“como foi preciosa sua participação no Concílio Vaticano II, no início do seu episcopado. Entretanto, o significado de sua figura e o alcance de sua atuação vão muito além do interior da Igreja, repercutindo na sociedade brasileira e no mundo. Homem de diálogo, conforme o espírito do mesmo Vaticano II, empreendendo esforços para a edificação de uma sociedade justa, solidária e fraterna, querida pelo Criador e Pai”.

Seu esforço foi constante, no sentido de tornar a Igreja no século XX mais apta para anunciar o Evangelho à humanidade, especialmente quando o Vaticano II fala do dever e do direito do apostolado dos cristãos leigos, fazendo entender com todas as letras que ele vive no coração do mundo, e ao mesmo tempo são convocados a ser sal, luz e fermento, nas mais diversificadas realidades em que estão inseridos e desempenham suas funções, individual ou coletivamente, sempre em comunhão com a Igreja, através dos pastores (bispos, padres e diáconos).

Na Arquidiocese de Fortaleza, nos seus 22 anos à frente da mesma, seu modo de proceder foi como que, sine qua non, no sentido de que o povo de Deus compreendesse o seu chamado na grande tarefa de evangelizar a realidade do mundo por ele vivida. Quis ele mostrar, através de sinais e gestos concretos, que toda Igreja é missionária, no âmbito da economia, da política e, sobretudo, da promoção da justiça e da paz, sem jamais esquecer a realidade do trabalho, saúde e educação, sonhando com um modelo de Igreja que sai do templo e vai às ruas, sendo uma presença viva no meio do povo, num ardente desejo de ver a realidade transformada.

Dizia o Cardeal Lorscheider: “Enquanto tivermos o povo à margem, excluído do processo econômico, social e cultural, nós não podemos nos iludir que vamos resolver os problemas do Brasil”. Padre Manfredo Araújo de Oliveira interpretou com muito rigor e sabedoria esse pensamento do nosso terno e eterno pastor:“Dom Aloísio Lorscheider, com muita ternura, mas com firmeza profética, levantou sua voz em nome de Deus para denunciar as injustiças gritantes, presentes na vida dos cearenses, frente a uma sociedade que, tendo se acostumado com a miséria como algo natural, se tornava insensível aos sofrimentos humanos”.

*Padre da Arquidiocese de Fortaleza, Escritor, Membro da Academia de Letras dos Municípios do Estado Ceará (ALMECE), e da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza.
Pároco de Santo Afonso

Autor dos livros:
“O peregrino da Paz” e “Nascido Para as Coisas Maiores” (centenário de Dom Helder Câmara);
“A Ternura de um Pastor” - 2ª Edição (homenagem ao Cardeal Lorscheider);
“A Esperança Tem Nome” (espiritualidade e compromisso);
"Dom Helder: sonhos e utopias" (o pastor dos empobrecidos).

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