29/05/2013

Proposta polêmica de redução da maioridade penal no Brasil: avanço ou retrocesso?

O Brasil, segundo dados compilados pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela), supera em número de homicídios até mesmo países que estão em guerra como Sudão, Afeganistão e Iraque. Para o levantamento, o estudo comparou os assassinatos entre 2004 a 2007, do país e do que estão em conflitos armados. No Iraque, no período mencionado, 76.266 pessoas foram mortas. Já no Sudão foram 12.719 vítimas. Enquanto no Brasil, o saldo nefasto foi de 147.343 mortes por armas de fogo.
Outro número chocante. Uma pessoa morreu a cada 15 minutos em 2010. O ano registrou 36.792 pessoas assassinadas. A média de assassinatos é o dobro daquela que a ONU considera tolerável (dez para cada cem mil habitantes), o que coloca o País na oitava posição entre os 100 países com estatísticas consideradas relativamente confiáveis. Trocando em miúdos, o Brasil está entre os mais violentos do mundo. Portanto, quando a sociedade brasileira se sente presa numa tempestade de violência, ela não está sendo vítima apenas dos noticiários e manchetes de jornais, está de fato envolvida numa grave crise de segurança.
Neste caldeirão de medo, salta aos olhos, principalmente para quem acompanha regularmente os jornais, os crimes cometidos por jovens que gozam da imputabilidade penal, ou seja, menores de 18 anos.  A impressão que passa a sociedade é de impunidade. Uma dentista foi queimada viva dentro do seu próprio consultório. O algoz, um adolescente. Passageira de uma van foi estuprada dentro do transporte. O autor da violência, um jovem menor de idade. Para muitos que assistem aos telejornais ou lêem jornal, esses garotos não serão punidos, mas sim protegidos pela lei.

O ECA e seus opositores

A discussão respinga no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), por muitos considerado o vilão da história. Uma fonte ouvida pela Agência da Boa Notícia, que trabalha no Juizado da Infância e Juventude, garante que o ECA prevê privação de liberdade e também medidas socioeducativas. O que emperra, diz a fonte, é sua aplicação. Muitos processos estão parados. As unidades de internação apresentam um quadro de superlotação. Aplicar medidas socioeducativas como a prestação de serviços comunitários é complexo, pois o sistema se depara com o medo da população em abrir suas portas para jovens infratores. A liberdade assistida também é uma das medidas previstas no ECA, porém, falta pessoal suficiente para fazer o acompanhamento, relata a fonte da ABN, que preferiu não se identificar.

Segundo um estudo do Conselho Nacional de Justiça, Panorama Nacional - A execução de Medidas Socioeducativas de Internação (que traçou o perfil dos 17,5 mil jovens infratores (de julho de 2010 a outubro de 2011) -, no Brasil, a taxa de ocupação destas unidades é de 102%. Entre as regiões brasileiras, os estados do Nordeste apresentaram maior sobrecarga. O Ceará registra mais que o dobro da capacidade de ocupação, com 221%, seguida de Pernambuco e Bahia, com 178% e 160%, respectivamente. Existe, portanto, muito mais problemas do que apenas a existência do ECA.

Políticos se posicionam contra

Políticos da bancada federal cearense se posicionaram contra a redução da maioridade penal, por compreenderem que o debate é mais amplo do que o limite etário de imputabilidade penal. Conforme o deputado Eudes Xavier (PT), aprovar qualquer projeto de lei que defenda esse direcionamento é estabelecer uma política equivocada e que trará efeitos gravíssimos para toda nossa sociedade. “É preciso discutir outras alternativas como o agravamento da pena para quem usar menores em ações criminosas”, recomenda.

Defendendo a mesma bandeira, o deputado Chico Lopes (PCdoB) chama atenção justamente para um dos gargalos mais graves da segurança pública, o sistema carcerário. De acordo com ele, o sistema penitenciário brasileiro, apesar de registrar alguns avanços, ainda não é capaz de oferecer condições para a ressocialização dos apenados. Neste contexto, integrar adolescentes neste sistema não iria solucionar a violência, e sim agravar a situação.

“Precisamos é contar com instituições capazes de promover essa ressocialização, inclusive para os menores de 18 anos. Precisamos é de mais e melhores políticas públicas, que possam garantir à juventude alternativas reais para a sua inserção social, para que o jovem não chegue até o caminho do crime. Precisamos é de mais recursos para a educação, de um Plano Nacional de Educação aprovado e executado na prática, de mais ações de geração de emprego e renda para os jovens”, defende.

Vale destacar que nem todos os políticos são contra a redução da idade penal. Recentemente, a Assembleia Legislativa do Ceará aprovou requerimento que comunica ao Congresso Nacional o apoio do Legislativo cearense à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. E ainda no Congresso tramitam 32 Propostas de Emenda à Constituição que discutem essa redução no Brasil.

A sociedade e o jovem infrator

Mesmo diante dos argumentos dos órgãos e movimentos ligados aos Direitos Humanos e de defesa dos Direitos da Criança e Adolescente, a sociedade, se convocada, muito provavelmente, se manifestará a favor da redução da idade penal. Segundo a Folha de S. Paulo, uma pesquisa realizada pelo Datafolha em abril deste ano revelou que 93% dos paulistanos concordam com a diminuição da maioridade penal (6% são contra e 1% não soube responder). É um recorte da realidade, espelho da comoção pública frente às tragédias.

A discussão, apontam os favoráveis ao ECA, deve ser aprofundada, para além do clamor dos crimes recentes, jogando luz, especialmente, na carência de políticas públicas voltadas para a juventude e ineficácia das existentes. Já os defensores da redução bradam que um jovem de 16 anos já sabe discernir o certo e o errado. Algumas questões ficam no ar. A redução da maioridade penal seria um avanço ou retrocesso para o Brasil? Afinal, qual é a melhor idade penal? Na dúvida, fica a sugestão para uma ampliação do debate.

Fonte: Agência da Boa Notícia

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