23/07/2013

Carismático e macho

O líder anticorrupção 'perfeito' que os russos precisavam para enfrentar o Kremlin

Aleksej Navalny: apelo simples e contundente contra corrupção
Por Lev Chaim, de Amsterdã*

Pergunte a qualquer cidadão urbano russo, como ele descreveria o ativista anticorrupção, Aleksej Navalny: “carismático e macho”. E se você olhar as fotos do ativista, por ocasião de sua prisão em Moscou, logo após ele ter se inscrito para a eleição da prefeitura da capital do país, que ocorrerá em setembro, a primeira eleição livre de Moscou desde 2003, você concordaria com o diagnóstico. Ele tem todos os atributos físicos que faltam ao presidente Vladimir Putin.

Na foto de sua prisão, espalhada pelos jornais de todo mundo, pode-se contar, ao todo, sete policiais da tropa de elite, com as mãos em torno de seus braços musculosos, em volta do seu tórax rígido, com músculos bem delineados, tal qual um atleta olímpico. Isto, além de ser elegante e alto, tudo que o Putin não é, mas faz de tudo para parecer que seja.

As fotos do presidente russo falam por si: em paradas e exercícios militares, a cavalo, de férias na Sibéria sem camisa, com músculos e gorduras, que nada condizem com a sua fama de campeão de judô. Como escreveu um jornal holandês, são fotos masculinizadas ao máximo. Com estadistas, em sua maioria, ele está sempre sentado. Isto, talvez para esconder a sua verdadeira altura – 1,55m ou 1,65m, pois ninguém sabe oficialmente. 

Já o ativista russo de 36 anos, com cabelo curto, ares de professor e atleta de maratona, com a personalidade estóica de monge budista, transformou-se definitivamente em um ídolo da oposição, logo após a sua prisão decretada pelo juiz, a mando do Kremlin. E ainda a seu favor, pode-se dizer que ele não é político e nem ideólogo de qualquer partido, mas simplesmente um ativista contra a corrupção da elite do poder. 

Aleksej Navalny se autodenomina um nacionalista democrata que luta pelo desenvolvimento máximo de seu país, sem os abutres corruptos. Com este apelo simples e contundente, numa oposição bem atípica, ele irritou o Kremlin. Com sua condenação a cinco anos de prisão por “fraudes”, o presidente Vladimir Putin mostrou todos os seus dentes ao mundo:que o Kremlin faz o que quer do aparato judicial russo e condena aqueles que se interpõe em seu caminho.

Se antes o mundo podia fingir que nada via e tratava Putin com todas as pompas, chegou-se agora a uma encruzilhada, principalmente, a Europa, que depende da importação do gás russo. E não é apenas um caso. Em Paris, o economista russo exilado, Sergej Goeriejv, disse que já não volta ao seu país com medo de ser preso, porque participou de investigações sobre a honestidade do processo contra o ex-homem forte da petrolífera Yukos, Michail Chodorkovsky, que ainda se encontra preso.

Agora, com a prisão do ativista anticorrupção, Aleksej Navalny, o Kremlin mostrou algumas rachaduras no centro do poder, segundo analistas políticos russos. Quais seriam as consequências desse estapafúrdio ato? Para o próprio Navalny,  este gesto já foi uma vitória para as milhares de pessoas que protestaram próximo ao Kremlin, na semana passada, contra a sua condenação.

Há indícios de que o poder na Rússia está dividido entre duas formas de pensar: prender os seus inimigos à maneira stalinista - sem oposição, sem problemas; ou, de uma forma mais moderna,ou seja, manter a oposição, incômoda, marginalizada. Pelo visto, a visão stalinista venceu mais uma vez e os seus efeitos funestos já são bem visíveis. 

Em primeiro lugar, com a prisão do ativista anticorrupção, o Kremlin reativou o movimento de protesto no país, fazendo com que todos se colocassem atrás de Navalny, transformando-o em líder incontestável, coisa que durante anos a oposição russa não havia conseguido. 

Em segundo lugar, a prisão o fez um dissidente político e o transformou em uma estrela internacional, já que, antes, ele era apenas conhecido dos russos que protestavam e de alguns gatos pingados no Ocidente, familiarizados com a situação interna do país. 

Em terceiro lugar, a prisão do ativista veio confirmar o que todos já suspeitavam - fazer negócios na Rússia é o mesmo que entrar em um campo minado sem a devida proteção. Mesmo que você tenha um contrato assinado, quem manda é o Kremlin. 

E quarto efeito desta série sucinta, que poderia ainda ser bem mais longa, foi mostrar a manipulação da justiça russa pelo Kremlin, que fez com que os russos e não russos perdessem totalmente o pouco da fé que ainda restava no sistema judicial do país. Putin e seus asseclas condenam quem eles querem e os juízes são joguetes em suas mãos. 

Se o presidente Putin, já tinha motivos para detestar Alexsej Navalny, agora ele tem motivos de sobra para odiá-lo.Não só a intervenção do Kremlin no veredicto da justiça, mas o próprio processo em si acabaram por revelar o verdadeiro rosto dos poderosos: tudo pelo poder e pelo acúmulo de fortunas.

É uma pena que os movimentos de rua do Brasil não possuem um líder carismático como este russo. Também é uma pena que os russos não saibam se mobilizar tão bem como os brasileiros. Talvez o papa possa dar uma mãozinha às populações desses dois países, que lutam contra a corrupção no poder. No Vaticano, o Santo Padre já passou a vassoura. Tchau e até a próxima terça-feira.
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou 20 anos para a Radio Internacional da Holanda, país onde mora. Ele escreve todas as terças-feiras para o Dom Total.
Dom Total

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