19/09/2013

Em defesa do Rio das Velhas

Pesquisadores da Dom Helder Câmara investigam danos socioambientais na região

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Pesquisadores investigam danos socioambientais na região do Rio das Velhas (Patrícia Azevedo/Dom Total)
Por Patrícia Azevedo
Repórter Dom Total


Lixo, esgoto, aterros ilegais, águas poluídas e uma tartaruga. Esses foram os elementos observados por pesquisadores da Escola Superior Dom Helder Câmara durante a travessia de ponte sobre o Rio das Velhas, em Santa Luzia. Embora pareça um elemento ‘estranho’, a tartaruga é, na verdade, a única peça que deveria estar ali, compondo a paisagem da região. 

“Essa imagem, de um animal tão pequenino lutando pela vida, nos relembrou o peso da responsabilidade que nós, seres humanos, temos para com o meio ambiente e nos ajudou a refletir sobre a nossa real atuação. De fato, não estamos preservando aquilo que nos possibilitou a vida, não estamos cuidando do nosso meio ambiente”, contou a pesquisadora Fernanda Araújo. “De fato, não sabemos e nem conseguimos imaginar como essa tartaruga ainda sobrevive, em meio a tanto esgoto e lixo”, completou a colega Ivone Patrão.



Desde que foi registrada, no dia 13 de abril deste ano, a cena se tornou simbólica e reforçou a escolha do próximo grande tema a ser estudado pelo grupo: a atual situação do Rio das Velhas nas imediações da cidade de Santa Luzia. “Já nesta primeira visita, constatamos, de forma clara e evidente, o descaso e desrespeito que assolam o rio. Decidimos, então, estudar possíveis lacunas jurídicas que têm permitido a ocorrência desses danos socioambientais na região”, explica a professora Mariza Rios, coordenadora do grupo de pesquisa e professora da Escola Superior Dom Helder Câmara, especializada em Direito. Sob sua responsabilidade, estão 20 alunos, de diferentes períodos, e três docentes. 

Irregularidades 

Durante a primeira visita ao local, a equipe percorreu trecho de 30 quilômetros entre Santa Luzia e Belo Horizonte, sempre acompanhando a trajetória do Rio das Velhas. Desde então, o trabalho de campo prossegue, com visitas periódicas à região.

De acordo com a professora Mariza Rios, dois conceitos expressos pelo pesquisador Guilherme José Purvin de Figueiredo norteiam esse trabalho de observação: o meio ambiente como direito fundamental da pessoa humana e como princípio da ordem econômica e social. “A preservação ambiental é um dever imposto a todos, principalmente ao Estado, que deverá instituir instrumentos para sua efetivação”, explicou a professora. 

Com o olhar ‘preparado’, os componentes do grupo identificaram inúmeras irregularidades, realizadas exclusivamente em função da expansão econômica e sem qualquer observância das proibições constitucionais, ambientais e urbanas. “As autoridades insistem em desprezar as normas jurídicas pertinentes e ignoram o que todos nós enxergamos, sem nenhuma dificuldade, ao passarmos pela rodovia que margeia aludido rio”, afirmou o professor Newton Teixeira, membro do grupo.

Um dos pontos mais críticos foi observado na Avenida Beira Rio, n° 9.800. Lá, uma empresa de ônibus tem realizado o alargamento e ampliação da propriedade, por meio de aterros ilegais que invadem o leito do Rio das Velhas (confira as fotos acima). Quilômetros à frente, as margens estão tomadas por lixo e entulho. É possível identificar claramente caçambas com a marca ‘Charuto’, que trazem inclusive o telefone da empresa. 

As irregularidades continuaram ao longo de todo o trajeto percorrido. Já na chegada à Santa Luzia, “um aterro sanitário adentrou, grande e desafiadoramente, na parte ribeirinha”. De acordo com os pesquisadores, o aterramento impede a água de deslizar pelo curso normal e constitui, metaforicamente falando, um ‘homicídio coparticipado’: o homem mata o indefeso rio com a anuência e o concurso ilegal do poder público.

“Conhecemos, muito a contragosto, um rio indefeso, triste, melancólico, com águas sujas, lixos ao redor, aterramentos irregulares, matas ciliares soterradas vivas, derrubadas, agonizando, sem defesa. Em nome do progresso econômico, as Leis foram ad rogadas naquele local, diante da irritante omissão míope das autoridades públicas”, relatou o grupo de pesquisa. 

Impacto

A Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas está localizada na região central de Minas Gerais, ocupando uma área de drenagem de 29.173km2, de acordo com dados da Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM). A população atingida pela bacia é estimada em 4.406.190 milhões de habitantes e está distribuída em 51 municípios cortados pelo rio e seus afluentes.

Apesar de estar totalmente localizado em território mineiro, o Rio das Velhas é o maior afluente, em extensão, do São Francisco, um dos mais importantes cursos d´água do Brasil e de toda a América do Sul. “Preservar o Rio das Velhas significa garantir que as águas do São Francisco continuem cumprindo sua função em todo o Brasil”, ressaltou Mariza Rios. 

Função que, segundo a professora, está gravemente ameaçada. Como consequência dos problemas já citados, o Rio das Velhas enfrenta a morte de peixes e demais animais que o habitam. A degradação ameaça também a sobrevivência da população ribeirinha, que depende da pesca ou do plantio às margens do rio. “Dois bens jurídicos estão em risco: o rio e a própria pessoa humana”, apontou a professora. Outro problema destacado por ela é a velocidade ‘sem precedentes’ em que ocorre a destruição e poluição do curso d’água. “Em um período de 15 dias, no intervalo entre as visitas, percebemos a diferença, só de olhar”, completou.  

Saiba mais sobre o trabalho e as próximas ações do grupo de pesquisa
Redação Dom Total

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