
Encerrada há sete anos com a mãe (de 101 anos) no mesmo quarto, continua a sonhar com as borboletas, os passarinhos e os formigueiros que fizeram parte da sua infância, por terras alentejanas. E, mais importante – como faz questão de sublinhar – continua a manter um diálogo permanente com Deus. Pode soar a devaneio, mas a lucidez e a clareza com que expõe as suas ideias demonstram que se trata de convicção, de uma forma determinada e genuína de viver a fé.
«Estou aqui fechada e estou feliz porque estou com Deus. Sinto que Ele me chama continuamente e me põe à prova. Podem não acreditar, mas quando Lhe peço qualquer coisa, sei que ele me ouve, porque sinto um arrepio na espinha», afirma à FÁTIMA MISSIONÁRIA, sentada na borda da cama, onde todos os dias reza pelo menos quatro horas. Duas ao acordar e mais duas antes de adormecer.
Licenciada em Farmácia e formada na espinhosa escola da vida, Maria do Céu especializou-se em diagnósticos sentimentais. As amigas adoram ouvir os seus conselhos e nunca saem de pensamentos a abanar. Sentem-se reconfortadas com as 'injeções' de fé, de otimismo, bom senso e felicidade. «As pessoas andam muito tristes, preocupam-se muito com o materialismo e não sabem ver o lado bom da vida. Eu faço da vida uma história bonita», explica a ex-professora de física e matemática.
Maria do Céu Sales nasceu há 73 anos em Alcaria Ruiva, no concelho de Mértola, no seio de uma família abastada para a época. Logo aí começou a distinguir-se pela tendência filantrópica. Emprestava as botas a quem andava descalço e dividia o lanche com as crianças da escola. Quando terminou o magistério primário, casou-se. Sabia que o futuro marido tinha uma doença complicada, mas mesmo assim, decidiu seguir em frente.
Já casada e a morar em Lisboa, tirou o curso de Farmácia. Deu aulas de físico-química e matemática, foi catequista e participou ativamente em associações de cariz religioso.
Aos 46 anos, foi-lhe diagnosticado um cancro. Davam-lhe dois meses de vida. Digeriu a notícia em silêncio durante cinco dias, o tempo suficiente para marcar uma consulta no Instituto Português de Oncologia (IPO). Só depois contou ao marido e aos dois filhos. Conseguiu que lhe removessem o tumor em França, mas a partir daí a saúde nunca mais foi a mesma.
Mesmo assim, teve forças para cuidar do marido, até ao seu último suspiro. Quando ficou de cama, vencida pelo cansaço, a mãe disponibilizou-se para a ajudar. Hoje, os papéis inverteram-se e é Matilde Sales que está acamada. Partilham ambas o «quarto encantado». Um espaço iluminado por uma ténue luz amarelada, povoado por bibelots, figuras religiosas, borboletas em arame dourado, perfumes, fotografias, marionetes e livros, muitos livros. «É muito bom estar aqui. Aprende-se muito em silêncio. E isso é mais importante do que a vida lá fora», assegura Maria do Céu.
Fátima Misisonária
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