12/11/2013

Livro “Gracias a la vida — Memórias de um militante”


.Em livro de memórias, Cid Benjamin conta histórias da clandestinidade e da luta armada

LETICIA FERNANDES 

Cid Benjamin conta histórias da clandestinidade e da luta armada
Foto: Divulgação

Cid Benjamin conta histórias da clandestinidade e da luta armadaDIVULGAÇÃO
“Tá em cana”. Era 21 de abril de 1970 quando Cid Benjamin, líder estudantil e dirigente do segundo MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), ouviu as palavras do major Moacir Fontenelle. Num gesto instintivo, aplicou-lhe um golpe de judô — Cid era faixa preta e tinha sido campeão brasileiro juvenil —, fazendo com que o major caísse sobre o balcão da padaria no Lins de Vasconcelos, Zona Norte do Rio, “aparelho” onde Cid se encontraria com um companheiro.
É assim que o jornalista, de 64 anos, começa o seu livro de memórias, “Gracias a la vida — Memórias de um militante”, que será lançado na noite de terça, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon. Não se trata apenas de uma compilação de memórias e relatos históricos, mas de uma celebração da vida, incluídas aí reflexões críticas sobre a política partidária (hoje, critica o PT por ter se “amoldado à ordem”), lembranças dos horrores das torturas, de nove anos de exílio, após sair da prisão, com 39 outros presos, em troca do embaixador alemão Ehrenfried Von Holleben, passando por Argélia, México, Cuba, Chile e Suécia, do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick. E também de curiosidades, como ter assistido à Copa do Mundo de 1970 no Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e ter recebido um violão, que tocava na solitária que ocupou no Dops, chamada de “ratão”.
— Não é à toa o título do livro, não é só fazendo relação à música que eu tocava no Chile — diz Cid, referindo-se aos relatos da mãe quando o visitou em Santiago, em 1973, encontrando-o “feliz, sentado na cama feita por caixotes, recostado na parede, tocando violão e cantando Gracias a la vida, que me ha dado tanto”.
— Eu não me considero vítima, trato de ser feliz, gosto de tomar cerveja, curto samba, futebol, trato de não me deixar abater, porque, se não, o sofrimento fica eternizado — completa Cid, dizendo ter convidado a viúva do médico Amílcar Lobo, que assessorou sessões de tortura ao escritor, para o lançamento do livro.
“Gracias a la vida” traz Cid, aos 21 anos, carregando uma pistola sempre pronta para atirar; ou, numa tentativa de despistar os militares, pintando os cabelos e ficando com madeixas cor de acaju; ou, ainda, quando, na sala de torturas do DOI-Codi, levantou suspeitas ao descobrirem que carregava no bolso letra de Milton Nascimento, que pensaram ser um código.
Cid traça um perfil dos torturadores, dizendo considerá-los seres humanos “terrivelmente normais”, referindo-se à jornalista e filósofa Hannah Arendt, que humanizou a figura de um torturador da Alemanha nazista.
— Há uma concepção de que a tortura é feita por monstros. O ser humano é complexo e capaz das atitudes mais nobres e mais escrotas. A mesma pessoa é capaz de ser um torturador e um bom marido, pai, vizinho. Eu acho que isso é mais grave. Eu não tenho ódio pessoal dessas figuras.
Quarenta e três anos depois de sua prisão, já escrevendo o livro, Cid Benjamin voltou ao Dops e visitou o “ratão”. Ele conta que foi doloroso remexer no passado, mas se diz satisfeito com o resultado.
— De certa maneira, foi doloroso, condensar isso tudo nos últimos meses para fazer o livro é um esforço maior, me fez, de certa maneira, voltar àquele tempo. De qualquer forma, nunca fiquei revivendo esse tipo de coisa, eu tratei de refletir e virar essa página.



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Ontem, 11/11, no Roda Viva - TV Cultura. Veja:
http://www.youtube.com/watch?v=QnVhcg-I7zU

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