24/12/2013

Edward Snowden, o homem que marcou 2013

Se até o ladrão Ronald Biggs ganhou asilo no Brasil, porque não acolher um herói americano?


(Foto: Arquivo)
Por Lev Chaim*

O dissidente do serviço secreto norte-americano, Edward Snowden, foragido na Rússia, sem dúvida, marcou o ano de 2013. Antes dele, espiões dissidentes eram vistos apenas como traidores. Com a dissidência de Snowden, muita coisa mudou. Os seus relatos da espionagem ilegal dos serviços secretos norte-americanos, totalmente fora do controle do parlamento e da justiça daquele país ou seja lá de que país for, chocou o mundo e fez com as pessoas começassem a pensar no assunto.

Tudo começou com os atentados terroristas nos Estados Unidos em setembro de 2001. A partir daquele momento, os governos ocidentais, principalmente o norte-americano, montaram um poderoso serviço secreto de espionagem,totalmente fora do controle da justiça e do parlamento, ou seja, totalmente ilegal, com a desculpa de caçar terroristas. Washington aumentou o seu poder às custas da diminuição da privacidade de seus próprios cidadãos e de outros países.

Com a denúncia dos casos de espionagem em massa pelo governo norte-americano, confirmou-se um pesadelo muito maior do que aquele que já havia sido previsto em livros de ficção: espionagem de populações inteiras, militarização da internet e o fim da tão decantada privacidade. Após as revelações de Snowden, o assunto acabou na ponta de língua das pessoas em todo o mundo, gerando condenações a Washington.

As ressonâncias das revelações ainda soam por todo o planeta, graças à coragem de Snowden nem enfrentar a poderosa máquina secreta de espionagem norte-americana. E graças também a alguns jornalistas corajosos, o mundo tomou conhecimento destas práticas ilegais de espionagem e do acúmulo secreto de dados pessoais, sem nunca terem tido a permissão para tal. Era como se todos fossem terroristas.

O mau caráter do governo Bush e assessores, que levou o mundo ocidental à guerra no Iraque, sem qualquer prova concreta da existência de armas químicas do governo de Saddam Hussein, já era conhecido. Com as revelações de Snowden, a máscara do democrata Obama, o mais republicano de todos os democratas, também caiu por terra. Em seu governo, essa colossal espionagem cresceu ainda mais.

Com a descoberta desta espionagem ilegal, que atingiu cidadãos e governos, colocou-se em discussão a validade do conceito de “democracia” nos tempos de hoje. Até mesmo a livre concorrência entre países e empresas ficou comprometida. O sistema neoliberal foi implodido pelo seu maior propagador - o governo em Washington.

Num recente programa da televisão holandesa, denominada Labirinto, falou-se justamente no dilema de nossa sociedade atual, que pode ser resumido na seguinte pergunta: como progredir com as pesquisas científicas e levar em conta alguns compromissos morais para com a sociedade, tendo a sociedade em geral como a grande beneficiária deste progresso? Se a ciência é a busca da verdade, como salvá-la da comercialização e privatização predatórias que beneficiam apenas alguns poucos?

A mídia, seja ela tradicional ou social, é o cardápio para o apetite das pessoas em controlar determinadas medidas de seus governantes eleitos. Portanto, a mídia tem o dever de evitar tentações e mostrar esses escândalos ilegais de espionagem, delatadas por dissidentes, justamente agora após o aparecimento do principal deles, Edward Snowden. E de acordo com especialistas no assunto, mais dissidentes virão a público.

O governo que arromba a privacidade de seus cidadãos ilegalmente não pode produzir avanços científicos que possam beneficiar grande parte da sociedade, como proclamam muitos cientistas ligados ao setor privado ou acadêmico.Não sou a favor da censura ao desenvolvimento científico e tecnológico. Sou a favor de um controle para que este desenvolvimento possa ser objetivado para beneficiar o maior número de pessoas.

Digo apenas que tem que haver um compromisso a respeito das metas a serem atingidas e do total de beneficiários. Com esta espionagem em massa, onde segredos são roubados, gera-se o perigo de uma ciência cada vez mais privatizada e cada vez mais cara. Se crianças ocidentais não morrem em resultado de uma simples diarreia, por que as africanas sim? Simples, não é mesmo?

Com tudo isto em mente, chego à mesma conclusão que muitos já chegaram há algum tempo (antes tarde do que nunca): Edward Snowden, o ex-espião que está sendo perseguido pelo governo norte-americano como um vilão traidor, na verdade, deve ser elevado ao status de herói,inclusive pelos cidadãos dos Estado Unidos. E ele fez o que fez, para tentar salvar o que resta de democracia no mundo.

É importantíssimo que a população norte-americana, como um todo, seja conscientizada dessa prática ilegal de seu governo, com a desculpa de estar combatendo terroristas. E tudo isto feito à revelia do povo, da justiça e do parlamento. E ser conscientizado de que o povo é quem mais perde com tudo isto, pois acaba sendo vítima sem se dar conta.

Os cientistas que trabalham em pesquisas avançadas também têm que se unir e desenvolver um senso moral e ético para levar adiante o seu trabalho, tendo como objetivo o beneficio de um maior número possível de pessoa se não apenas o aumento dos ganhos de alguns poucos. O trabalho desses cientistas é importante desde que ele possa ser divulgado livremente.

A presidente Dilma adiou a sua visita a Obama devido os escândalos de espionagem, inclusive dela própria e de membros de seu governo. Ela comprou armas russas e agora aviões suecos em detrimento dos produtos norte-americanos. Por que não, agora,coroar tudo, dando o asilo político a Edward Snowden? Se até o maior ladrão da história britânica, Ronald Biggs (que ele descanse em paz), ganhou asilo no Brasil, por que não Edward Snowden, o homem que marcou para sempre o ano de 2013?
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou 20 anos para a Rádio Internacional da Holanda, país onde mora. Escreve às terças-feiras para o Domtotal.

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