24/01/2012

Ó São Paulo, contagia-nos com a fé que te animou!

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo (SP)
A cidade de São Paulo comemora 458 anos de fundação no dia 25 de janeiro, dia em que a Igreja comemora a festa da Conversão do apóstolo São Paulo. Ela nasceu em 1554, em torno da missão dos Padres Jesuítas, quando ainda vivia o fundador da Companhia de Jesus, S.Inácio de Loyola. Entre seus fundadores estão o Pe. Manuel da Nóbrega e o Beato Pe. José de Anchieta.
Nada mal para uma cidade, ter na sua origem um bem-aventurado, um colégio, uma capelinha e um projeto de sociedade com valores cristãos, como foi no caso de São Paulo! O Páteo do Colégio lá está, a recordar aos habitantes sempre apressados da Paulicéia, ocupadíssimos em ganhar a vida, esta origem humilde, mas clarividente da Metrópole Paulistana; e, perto dali, na Praça da Sé, o próprio Anchieta, de cruz na mão e dedo apontando para o alto, recorda a todos os que passam o caminho para alcançar a vida plena...
A história da cidade e a história da Igreja nela presente estão entrelaçadas profundamente. Pelo menos até o início do século XX. Desde que a cidade se tornou um centro econômico e cultural tão expressivo e complexo, como ela é atualmente, esta relação da Igreja com a cidade ficou bem mais diluída e sutil. De resto, com a presença de tantos outros grupos religiosos, não católicos, a Igreja Católica aparece de forma diversa do que no passado. A secularização é um fato também por aqui.
Teria a Igreja perdido sua importância na cidade grande? Devemos ficar angustiados por não estarmos mais tanto em evidência, como já estivemos no passado? Penso que não, nem deve isso nos desorientar ou desanimar. Nossa presença, por certo, continua ainda muito expressiva; há uma presença e organização capilar de comunidades, paróquias, igrejas, capelas, centros de referência da Igreja, colégios, escolas, seminários, casas religiosas, obras sociais e culturais, meios de comunicação grandes ou pequenos... Precisamos acreditar no potencial que nossa Igreja ainda possui para realizar bem sua missão e otimizar o uso desse potencial em vista da vida e da missão da Igreja nesta cidade. Talvez nosso “campo” possa produzir muito mais fruto do que está produzindo.
Há, porém, outra questão a recordar: vivemos numa cidade pluralista, sob todos os pontos de vista, onde cada um tem a liberdade de afirmar e expressar suas convicções; nós também. O impacto maior ou menor sobre o meio social e cultural vai depender do vigor e da profundidade dessas convicções; se elas forem pouco profundas, não produzirão efeitos, podendo ser mesmo facilmente absorvidas e suplantadas por outras convicções mais fortes ou, simplesmente, abandonadas, por serem consideradas pouco relevantes. Não pode ser assim a nossa fé cristã!
E então voltamos novamente nosso olhar para os fundadores de São Paulo e para nosso Patrono, que deu o nome a esta Cidade. Os missionários chegaram aqui com fortes convicções e um entusiasmo por Cristo e pelo Evangelho, que os fazia crer que era possível, nesses sertões desconfinados, e com as populações indígenas e européias, realizar aqui um projeto de convívio que tivesse por base os valores nos quais acreditavam. E lutaram bravamente para isso, enfrentando dificuldades inimagináveis para quem anda hoje pela Avenida Paulista, ou trafega pelas Marginais congestionadas... Creram fortemente na força transformadora do Evangelho e na providência de Deus. Sabiam que nem tudo dependia deles. Creram, trabalharam e confiaram.
Por outro lado, olhamos para o apóstolo São Paulo: com quanta firmeza e profundidade lançou-se à missão, depois do seu encontro inesperado com Jesus Cristo às portas de Damasco?! “Sei em quem acreditei”, dizia ele (cf 2Tm 4,8). Sua fé e seu amor por Cristo o faziam transpor montanhas, percorrer caminhos intermináveis, entrar em cidades desconhecidas, enfrentar perseguições e prisões e, finalmente, o martírio. São Paulo nos dá o exemplo do que devemos continuar a fazer hoje, nesta grande Metrópole. E, mesmo contra toda esperança humana, continuar a realizar a obra de Deus. Deixemo-nos contagiar com a mesma fé que o animou e com o mesmo ardor missionário que ele viveu.

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