Remontagem celebra centenário de Nelson Rodrigues.
Peça expõe temas polêmicos, como o incesto, e fala da hipocrisia.
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Quinze anos depois da estreia na Ópera de Arame, a peça “O Casamento”, baseada no romance de Nelson Rodrigues, fez a reestreia com o elenco original no palco do Teatro Guaíra, em Curitiba, na noite de sexta-feira (30). A companhia carioca Os Fodidos Privilegiados trouxe a remontagem para o Festival de Teatro de Curitiba para homenagear o centenário de Nelson Rodrigues.
Diante dos olhares atentos da plateia que lotou o Guairão, os atores encenaram a história em que o Dr. Sabino, rico empresário do ramo imobiliário, descobre na véspera do casamento da filha Glorinha que o futuro genro é homossexual. Como na primeira montagem, a atriz curitibana Guta Stresser interpreta Glorinha e contracena grande parte do espetáculo com Dani Barros, ganhadora do Prêmio Shell de Teatro deste ano de Melhor Atriz, que faz a personagem Maria Inês.
Sob direção de Antônio Abujamra e João Fonseca, que também está em cena no papel de Dr. Sabino, a obra rodrigueana critica os conceitos da moral e dos ditos bons costumes da sociedade brasileira contrapondo-os à hipocrisia. Escrito na década de 70, o texto coloca as estruturas social e familiar em xeque frente a temas tabus para a época.
Sem evitar a nudez cênica, os personagens são colocados em situações que escancaram dramas familiares que circundam a perversão sexual, o homossexualismo, o adultério e o incesto. O exagero, marca dos textos de Rodrigues, está presente e serve para exacerbar a crítica.
“Se todo mundo conhecesse a vida sexual do outro, ninguém falaria com ninguém”, a frase final de “O Casamento” resume o objetivo da obra.
Tragicomédia
O recurso cômico, algumas vezes escrachado, é usado para reforçar que as relações propostas em palco são meras ações representativas do cotidiano. Principalmente, as que se referem às dúvidas, aos laços e intrigas familiares e de dinheiro apresentadas normalmente em qualquer preparação de casamento.
O recurso cômico, algumas vezes escrachado, é usado para reforçar que as relações propostas em palco são meras ações representativas do cotidiano. Principalmente, as que se referem às dúvidas, aos laços e intrigas familiares e de dinheiro apresentadas normalmente em qualquer preparação de casamento.
“O amor normal é triste”, diz Dr. Sabino em uma das cenas quando expõe que prefere a secretária à esposa. Já que a funcionária é “louca”, opina ele, e se deixou envolver em troca de aventura sexual.
Por esta e outras, o enredo costurado com drama, mini tragédias e comédia é apresentado ao público sem qualquer restrição de linguajar ou pudor. É a vertente rodrigueana de "A vida como ela é" ao vivo.
As confissões amorosas, as traições e a obscenidade sexual provocam risos, muitas vezes um pouco contido. Afinal, o julgamento de que qualquer coincidência com fatos reais é mera coincidência pode soar esclarecedor.
Do público
Ao desvendar as histórias de “O Casamento” o público reage de diferentes formas. Para o carioca Jorge Luiz Spotozito, que assistiu ao espetáculo e conta que já participou de uma outra montagem do mesmo texto, a plateia “se chocou, com certeza”.
Ao desvendar as histórias de “O Casamento” o público reage de diferentes formas. Para o carioca Jorge Luiz Spotozito, que assistiu ao espetáculo e conta que já participou de uma outra montagem do mesmo texto, a plateia “se chocou, com certeza”.
Já Salete Zanon Tizo, que assistiu pela primeira vez, a peça foi "muito bonita". “Me diverti”, comenta.
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O jovem ator André Daniel acredita que a plateia curitibana pode ter estranhado um pouco o “deboche, o escracho, a tragediazona pastelão” que o enredo oferece. “No intervalo, as pessoas que estavam sentadas na fileira atrás de mim foram embora”, contou.
Para a mãe de Guta Stresser, Diva Labatut, que acompanhou a versão de 1997 e a reestreia do mesmo grupo, “todo o elenco evoluiu”. “Eles [os atores] estão mais soltos. E Curitiba também se abriu”, opinou.
A atriz Zezé Polessa, que se sentou à plateia para ver “O Casamento”, ressaltou que a encenação estava à altura do texto. “O elenco está afinado e consegue estabelecer uma linguagem própria”, apontou com autoridade.
Do palco
O cenógrafo e ator Nello Marrese revelou que estava ansioso pela reestreia. “É uma delícia fazer, mas dá medo. Às vezes olhava e via de um lado a Guta e de outro a Dani, duas grandes atrizes, e pensava: o que estou fazendo aqui?”, entregou. Marrese ainda falou que voltar e encenar esta peça “foi uma surpresa ótima”.
O cenógrafo e ator Nello Marrese revelou que estava ansioso pela reestreia. “É uma delícia fazer, mas dá medo. Às vezes olhava e via de um lado a Guta e de outro a Dani, duas grandes atrizes, e pensava: o que estou fazendo aqui?”, entregou. Marrese ainda falou que voltar e encenar esta peça “foi uma surpresa ótima”.
“Este Festival é uma delícia, cidade de pessoas bonitas, pensantes, é muito bom estar aqui”. Entretanto ele aponta que sentiu o público mais tímido que há 15 anos. “O riso estava embutido”, resumiu.
A protagonista Guta Stresser contou, em entrevista após a apresentação, que a melhora de todos os atores ao longo dos 15 anos de intervalo de reunião do mesmo grupo é evidente. Contudo, “o fôlego já não é mesmo”, brincou.
A atriz que ainda na infância estreou no palco do Teatro Guaíra em uma apresentação de balé, disse que é emocionante estar novamente no espaço. “Eu me recordo da cantina, da sala das costureiras... De tudo”, enfatizou com um sorriso.
Reunir o mesmo grupo é muito bom. São pessoas como da família. É maravilhoso perceber quanta coisa mudou”
Dani Barros, atriz sobre a remontagem da peça
Ela ainda comentou que foi inevitável durante a encenação não recordar da montagem apresentada na Ópera de Arame. “A toda hora vinham flashes na minha memória”. Sobre a reação da plateia, ela também confessou que sentiu os espectadores um pouco chocados. “Estou achando que o mundo ‘encaretou’”, disse.
Para Dani Barros, voltar ao Festival de Curitiba é retornar às origens. “Reunir o mesmo grupo é muito bom. São pessoas como da família. É maravilhoso perceber quanta coisa mudou”, refletiu. Em 1997, na primeira versão de “O Casamento”, tanto Dani, como Guta, eram atrizes que davam os primeiros passos na carreira.
Fazendo referência ao nome da companhia, Os Fodidos Privilegiados, a melhor atriz do ano, segundo a premiação do Shell de Teatro contou: “percebo como naquele tempo eu era ‘fodida’ e agora sou um pouco mais privilegiada”, e riu.
Serviço
A peça será exibida novamente neste sábado (31), também no Teatro Guaíra. Ainda há ingressos para a plateia, e a apresentação será às 21h. O Guaíra fica na Rua Conselheiro Laurindo, s/nº. As entradas podem ser adquiridas no site do Festival.
Serviço
A peça será exibida novamente neste sábado (31), também no Teatro Guaíra. Ainda há ingressos para a plateia, e a apresentação será às 21h. O Guaíra fica na Rua Conselheiro Laurindo, s/nº. As entradas podem ser adquiridas no site do Festival.
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