17/10/2012

A arriscada austeridade de Portugal


Policiais em frente ao Parlamento Português durante protesto de manifestantes contra o orçamento do governo, em Lisboa (Foto: AP Photo / Francisco Seco)A nova proposta de Orçamento do governo de Portugal, apresentada na última segunda, dia 15, enfureceu a população. Assustou aqueles que temem um agravamento do desemprego e piora na taxa de crescimento e recebeu críticas de analistas econômicos. Tudo por causa do seu excesso de austeridade. A versão final do documento, que deve ser votado até o fim de novembro, aumenta os impostos em 48%, reduz em 50% benefícios sociais para idosos e desempregados e prevê um corte de € 630 milhões com pessoal – apoiado em uma redução de 2% dos funcionários públicos e cortes de horas extras. A proposta inclui ainda um pacote de privatizações de estatais, como a empresa aérea TAP e os Correios.
A solução encontrada pelo ministro das Finanças do país, Vitor Gaspar, apoiada pelo premiê português, Pedro Passos Coelho, é mais um passo para tentar atingir as metas econômicas definidas em conjunto com as autoridades europeias. A crise econômica de 2010 levou Portugal para sua mais grave recessão em 40 anos. Em 2011, o país recorreu a um empréstimo de € 78 bilhões do Banco Central Europeu, da Comissão Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Em contrapartida ao empréstimo, Portugal definiu uma meta de déficit orçamentário de 4,5% do Produto Interno Bruto para 2013.
Com um dos maiores índices de desemprego da sua história, que chegou a 15,6% em agosto, Portugal decidiu adotar medidas de austeridade ainda mais duras para alcançar a meta estipulada. Segundo o Ministério das Finanças, o pacote vai equivaler a 3,2% do Produto Interno Bruto (PIB) português em 2013, e só assim será possível atingir a meta. “Recusar este Orçamento de Estado colocaria em risco o programa de ajustes”, disse o ministro das Finanças Vitor Gaspar. “Não há margem para manobra para evitar as medidas de austeridade. Esta proposta para 2013 é a única possível”. O ministro da Economia de Portugal, Álvaro Santos Pereira, reconheceu que a proposta de Orçamento é "a mais dura das últimas décadas". "Em termos fiscais, não é o melhor estímulo para a economia, mas é o orçamento necessário para o país", afirmou Santos Pereira em entrevista.
Assim como aconteceu em setembro, quando milhares de pessoas foram às ruas contra um aumento na contribuição para a previdência, centenas de manifestantes protestaram em frente à Assembleia contra o projeto de Orçamento. Um grupo conseguiu romper as grades de proteção e a driblaram a segurança reforçada para fazer uma grande fogueira diante do Parlamento. Movimentos sociais prometem cercar o Parlamento neste fim de semana.
Não foi apenas a população que protestou. Em editorial, o jornal Público, um dos principais do país, rechaçou as medidas e afirmou que “o Orçamento exigirá mais sacrifícios da classe média do que dos mais ricos”. Também criticou os métodos do pacote, dizendo que “85% da austeridade virá por aumento de impostos – contrariando a promessa do governo de racionalizar o Estado e evitar gastos desnecessários”.
Vozes estrangeiras fizeram coro às críticas de Portugal. Em um artigo no jornal britânico Financial Times, o economista-chefe do Citigroup, Willem Buiter, criticou as excessivas medidas de austeridade. Segundo ele, o pacote pode levar Portugal a uma recessão ainda mais grave. Biter afirma que há uma “fadiga da austeridade” na Europa, e que a única saída possível seria um calote. “Torna-se necessária para salvar o euro e criar as condições para a retomada do crescimento uma reestruturação da dívida dos mais prováveis países insolventes: Grécia, Portugal, Irlanda, Chipre e possivelmente Espanha, Itália e Eslovênia”, escreveu.
A maior prova de que o governo português pode ter exagerado no aperto das finanças foi a declaração de Christine Lagarde, diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, na Assembleia Anual do FMI e do Banco Mundial, em Tóquio. Na quinta-feira, 11, Lagarde disse que quando muitos países adotam as mesmas medidas de austeridade ao mesmo tempo, o resultado é um impacto negativo na economia. “Os países da Zona Euro não deveriam agarrar-se cegamente a metas orçamentárias se o crescimento econômico cair além do previsto”, disse Lagarde. “Em vez de uma redução frontal e massiva, às vezes é preferível dispor de um pouco mais de tempo para os ajustes”. Em seu relatório Perspectiva Econômica Mundial, o FMI recomenda mais investimento e menos austeridade como solução para os países saírem da crise. Sinal dos tempos.


Revista Época

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