17/10/2012

A missão hoje fala outra linguagem


Mundo
Especial outubro missionário

Texto Gianfranco Graziola | Foto E. Assunção | 17/10/2012 | 07:45
Os missionários «não são mais os omniscientes salvadores da pátria, mas irmãos que partilham a caminhada do Reino de Deus que acontece na ferialidade da vida», considera Gianfranco Graziola, em missão no Brasil
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Quando se fala de missão pensa-se em aventuras extraordinárias, em histórias, em eventos onde há sempre um herói para quem olhar e pelo qual se pode apaixonar. A missão hoje tem outro horizonte, fala outra linguagem, sobretudo num contexto como o da América Latina onde, o papel dos países emergentes, como é o caso do Brasil, exige ultrapassar clichés tradicionais. Exige enfrentar os novos desafios que os povos nativos e as culturas tradicionais têm pela frente, um pouco devido aos grandes empreendimentos do Plano de Aceleração ao Crescimento – PAC, aos quais se juntam neste momento as gigantescas obras da Copa do Mundo 2014 e das Olimpíadas de 2016. 

As migrações do campo para cidade, o abandono forçado dos povos nativos do seu ambiente natural, a precariedade da vida social, o aumento da violência e as grandes e graves injustiças obrigam o missionário a envolver-se nos campos da justiça e paz e dos direitos humanos. Foi o que aconteceu na minha história de vida e nos 12 anos de Roraima e Brasil que tenho. 

Comecei a minha experiência brasileira e latino americana numa paróquia do interior no meio de colonos para depois passar em poucos dias a realidade fascinante e desafiadora do povo Yanomami, com a aprendizagem da língua como porta para entrar, tirando as sandálias, num universo totalmente diferente e ao mesmo tempo rico de emoções e sentimentos e onde a vida tem outra cor, outro ângulo de observação, outra visão. 

Quatro anos mais tarde, quando começava a saborear a beleza e a riqueza da filosofia do bem viver, foi-me colocado outro desafio missionário: deixar o universo Yanomami para uma nova experiência na área da justiça e paz. A linguagem era totalmente diferente, mas o mais desafiante era construir e entender, e ainda hoje o é, o que significa dedicar-se e trabalhar as dimensões da justiça e paz, dos direitos humanos e das realidades sociais com as quais se confronta a caminhada dos missionários e missionárias, mas também dos cristãos em geral. 

Após seis anos nesta experiência nada fácil, posso dizer que hoje, como nunca, é importante trilhar os caminhos da justiça e da paz assim como o dos direitos humanos. Por isso é preciso deixar-se desafiar, derrubar muros e cercas que constantemente construímos, deixar o mundo da cristandade, das certezas, da paroquialidade para nos aventurarmos nos novos areópagos da missão onde as pessoas lutam no dia a dia por ver reconhecidos seus direitos, para uma vida digna, por outro modelo de sociedade mais humana e democrática. 

Eis porque hoje estou convencido que a missão tem a linguagem dos conselhos paritários, da participação na construção de um novo modelo de Estado, de uma formação e consciência cidadã onde nós missionários não somos mais os omniscientes salvadores da pátria, mas irmãos que partilham a caminhada do Reino de Deus que acontece na ferialidade da vida e tem vitórias e derrotas e o diferencial de uma fraternidade universal.

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