Padre Geovane Saraiva*
Neste mundo conturbado em que vivemos, quando o Ter nos é
apresentado como algo supremo e absoluto, em detrimento do Ser, que é colocado
em segundo plano, o que devemos fazer? É preciso que tenhamos um olhar de
sabedoria, profundo e, ao mesmo tempo paciente, para com o mundo em que a
pessoa humana está inserida. José Saramago, ao ser acusado de pessimista, respondeu:
“Eu não sou pessimista. O mundo é que é péssimo”.
Para todos aqueles que desejam ardentemente viver a sua fé, no
seguimento de Jesus de Nazaré, urge pensar e refletir sobre sua própria
vocação, no sentido mais amplo da antropologia cristã: ser pessoas otimistas,
num mundo extremamente marcado pelo pessimismo, com o compromisso de
edificá-lo, através da fé que professam, numa dinâmica, sempre projetada para o
futuro, num desejo de ajudar a perceber o momento presente, nos sinais de
esperança e otimismo.
Francisco de Assis, no seu otimismo e no seu relacionamento
íntimo com Deus e com suas criaturas, rendia graças ao bom Deus deste modo: “Tu
és o santo Senhor e Deus único, que operas maravilhas. Tu és forte; tu és
grande; tu és o altíssimo. Tu és o rei onipotente, santo pai, rei do céu e da
terra; tu és o trino e o uno, Senhor e Deus, o bem universal; tu és o bem, todo
bem, o sumo bem, Senhor e Deus, vivo e verdadeiro. Tu és a delícia do amor; tu
és a sabedoria; tu és a humildade; tu és a paciência; tu és a segurança; tu és
o descanso; tu és a alegria e o júbilo; tu és a justiça e a temperança; tu és a
plenitude da riqueza; tu és a beleza; tu és a mansidão; tu és o protetor; tu és
o guarda e o defensor; tu és a fortaleza; tu és o alívio; tu és nossa
esperança; tu és nossa fé. Tu és nossa eterna vida, ó grande e maravilhoso
Deus, Senhor onipotente, misericordioso redentor”.
Olhando para a vida desse homem marcado profundamente pela graça
de Deus, supliquemos para que a nossa vida aqui na terra seja uma bela
caminhada, que podemos chamar de êxodo rumo à eternidade. Por causa da
eternidade, que já experimentamos aqui, de algum modo, Deus exige algo de cada
batizado, numa palavra, a ser sinal de contradição.
Como tão bem disse Dom Aloísio Lorscheider na sua Carta Pastoral
de oito de dezembro de 1989: “O Reino de Deus não se constrói sem sacrifício,
sem renúncia a si mesmo, sem aceitação da cruz. Celebrar é recordar aqui e
agora o que Deus realizou no passado da história da salvação, tornando vivo e
presente todo esse passado e projetando-o ativamente para o futuro”.
O exemplo mesmo vem do Filho de Deus, na profecia do velho
Simeão, que se realizou na realidade e cultura de seu tempo, resgatando a
esperança e trazendo otimismo para a humanidade, ao colocar o menino nos braços
e dizer: Este menino será sinal de contradição (cf. Lc 2, 33-35). Embora ele
assumisse em tudo a condição humana, menos o pecado, causou escândalos e
conflitos, além de questionar os donos poder, ao mesmo tempo em que defendeu os
marginalizados e excluídos. Por fim recebeu o preço de sua missão: a morte de
cruz.
No alto da montanha, Jesus Cristo, antes da sua paixão, com
Moisés e Elias revelou o esplendor de sua face amiga, dizendo-nos que haveremos
de nos transfigurar, na seguinte afirmação: “Nós somos cidadãos do céu. De lá
aguardamos o Salvador, o Senhor, Jesus Cristo. Ele transformará o nosso corpo
humilhado e o tornará semelhante ao seu corpo glorioso” (Fl 3, 20-21).
Guardemos no íntimo do coração a mensagem de otimismo e esperança,
deixada por Dom Helder Câmara, o artesão da paz e cidadão do mundo, ao falar
com paixão que Deus é amor: “Fomos nós, as tuas criaturas que inventamos teu
nome!? O nome não é, não deve ser um rótulo colado sobre as pessoas e sobre as
coisas... O nome vem de dentro das coisas e pessoas, e não deve ser falso...
Tem que exprimir o mais íntimo do íntimo, a própria razão de ser e existir da
coisa ou da pessoa nomeada... Teu nome é e só podia ser amor”.
*Padre
da Arquidiocese de Fortaleza, Escritor, Membro da Academia de Letras dos
Municípios do Estado Ceará (ALMECE), e da Academia Metropolitana de Letras de
Fortaleza.
Pároco
de Santo Afonso
Autor
dos livros:
“O
peregrino da Paz” e “Nascido Para as Coisas Maiores” (centenário de Dom Helder
Câmara);
“A
Ternura de um Pastor” - 2ª Edição (homenagem ao Cardeal Lorscheider);
“A
Esperança Tem Nome” (espiritualidade e compromisso);
"Dom
Helder: sonhos e utopias" (o pastor dos empobrecidos).
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