07/05/2013

O alcoolismo dos asnos e outras pérolas dos livros editados pelo Senado


NOS BARES DA VIDA Capa de O  cavalo – Grandeza e legado. Quadrúpedes abastecidos com cidra e cerveja (Foto: Igo Estrela/ÉPOCA e reprodução)O livro O cavalo – Grandeza e legado: a família equídea e o que ela inspirou, do jornalista e oficial de cavalaria aposentado Claudio Fornari, é uma obra rara. Existem apenas 270 exemplares em estoque, todos preservados numa só cidade: Brasília. O livro apresenta milhares de verbetes do cavalo como “animal em pessoa” – e outros sobre a influência equina na cultura ocidental. Alguns verbetes seminais: roncolho (cavalo que tem apenas um testículo, mas ainda pode reproduzir), bagaceiro (o último cavalo a chegar numa carreira) e, finalmente, jumento recolhido (aquele que passa muito tempo separado das fêmeas, torna-se irrequieto e impaciente, algo compreensível, pois tem condições de cobrir até 15 fêmeas). No verbete “alcoolismo equino”, aprende-se que há quadrúpedes bêbados. “Os burros, por exemplo”, diz o texto. “Os asnos viciados em álcool são muito frequentes. Os donos dos animais estacionam na porta dos bares e, enquanto bebem e conversam, os animais são abastecidos de cidra e cerveja, tornando-se mais fáceis de tratar que seus donos, que pelo menos não mordem nem dão coices quando estão de pileque.” Não se sabe quem, ao estar de pileque, não dá coices nem morde: se o dono ou o burro.

Na introdução (ou “Galope de apresentação”), Fornari convida: “Pule para a garupa e cavalgue conosco!”. ÉPOCA subiu na garupa. É um trote de 501 páginas, editado em papel especial pelo Senado da República. O Senado? “O Conselho Editorial do Senado sente-se honrado de poder patrocinar volume tão singular”, diz a contracapa do livro. Pouca gente sabe, mas o Senado, embora não esteja produzindo muitas leis, deu para produzir muitos livros: são cerca de 70 mil acumulando poeira num depósito em Brasília. Há toda sorte de títulos ali, para promover senadores e fazer agrados a amigos da Casa.


Fornari, o autor do compêndio de equinos, é parceiro de Joaquim Campelo, funcionário que manda no Conselho Editorial do Senado e determina que obras serão publicadas. A ex-mulher de Campelo assinou as gravuras de cavalinhos que ilustram o dicionário de Fornari. Ganhou R$ 22 mil pelo serviço, mais que o próprio autor do livro. “Publicamos lixo editorial”, afirma Carlyle Madruga, funcionário do Senado e integrante do Conselho Editorial. “Se tivesse participado de uma reunião para discutir esse livro, teria me manifestado contra.” Outro conselheiro, o diplomata Carlos Henrique Cardim, diz nem ter sido informado sobre a publicação do livro.


O Senado não informa quanto gastou para publicar o dicionário. Diz apenas que o livro de Fornari “é uma referência importante”. Fornari ainda afirma: “Estou trabalhando numa segunda edição. Mas quero uma editora particular, porque tem mais amplitude”. O final do dicionário oferece uma página em branco para que os leitores colaborem com a obra. “Sempre há lugar no pasto para novos potros”, diz o texto. Como informa um dos adágios do dicionário: de alguns equinos, só se espera o coice. 

Revista Época

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