07/01/2015

Apoio ao Papa Francisco contra seus detratores

Apoio ao Papa Francisco contra seus detratores





Leonardo Boff


Está se articulando em várias partes do mundo, mas principalmente na Itália entre cardeais e pessoas da Cúria mas também entre grupos leigos conservadores, uma dura resistência e demolição da figura do Papa Francisco. Escondendo-se atrás de um escritor leigo famoso, convertido, Vittorio Messori, mostram seu mal-estar.


Assim que com tristeza li um artigo de Vittorio Messori, no Corriere della Sera de Milão com o titulo: ”As opções de Francisco: dúvidas sobre a virada do Papa Francisco” (24/12-2014). Esperou a véspera do Natal para atingir mais profundamente o Papa. O que lhe critica é especialmente a sua “imprevisibilidade que continua perturbando a tranquilidade do católico médio”. Ele admira a perspectiva linear “do amado Joseph Ratzinger”. E sob palavras piedosas instila insidiosamente muito veneno. E o faz, como confessa, em nome de muitos que não têm coragem de expor-se.


Quero propor um contraponto às dúvidas de Messori. Este não percebe os novos sinais dos tempos trazidos por Francisco de Roma. Ademais demonstra três insuficiências: duas de natureza teológica e uma de interpretação da relevância da Igreja do Terceiro Mundo.


Ele se escandalizou com a “imprevisibilidade” deste Pastor “que continua perturbando a tranquilidade do católico médio”. Há de se perguntar pela qualidade da fé deste “católico  médio” que sente dificuldade de entender um pastor que tem “odor de ovelhas” e anuncia “a alegria do evangelho”. São geralmente católicos culturais, habituados à figura faraônica de um Papa com todos os símbolos do poder dos imperadores romanos pagãos. Agora comparece um Papa “franciscano”que confere centralidade aos pobres, não “veste Prada”, critica corajosamente o sistema econômico que produz tantos pobres no mudo, que abre a Igreja a todos os seres humanos sem julgá-los, mas acolhendo-os no espírito que ele chamou de “revolução da ternura”, falando aos bispos latinoamericanos.


Há um notável vazio no pensamento de Messori. Estas são as duas insuficiências teológicas: a quase ausência do Espírito Santo e o cristomonismo. Quer dizer: só Cristo conta. Não há propriamente um lugar para o Espírito Santo. Tudo na Igreja se resolve unicamente com Cristo, coisa que não corresponde ao que ensinou Jesus. Por que digo isso? Porque o que ele deplora na ação pastoral do Papa é a “imprevisibilidade”. Ora, esta é a característica do Espírito no dizer de São João:”Ele sopra onde quer e lhe ouves voz mas não sabes de onde vem nem para onde vai”(3,8). Sua natureza é a irrupção imprevista.


Messori é refém de uma visão linear, própria de seu “amado Joseph Ratzinger” e de outros Papas anteriores. Ora, importa reconhecer que foi exatamente esta visão linear que transformou a Igreja numa fortaleza, incapaz de compreender a complexidade do mundo moderno, isolada no meio das demais Igrejas e caminhos espirituais, sem dialogar e aprender dos outros, também iluminados pelo Espírito Santo. Seria blasfemar contra o Espírito imaginar que os outros somente pensaram erros. Por isso é sumamente importante uma Igreja aberta, como o quer o Papa Francisco, para perceber as irrupções imprevistas do Espíprito na história. Não sem razão alguns teólogos o chamam a “fantasia de Deus”, em razão de sua criatividade e novidade para a história e a Igreja.


Sem o Espírito Santo a Igreja se tornaria uma instituição pesada, e criatividade. No fundo, teria pouco a dizer ao mundo a não ser doutrinas sobre doutrinas, sem levar a um encontro vivo com Cristo e sem suscitar esperança e alegria de viver.


Significa um dom do Espírito o fato de que este Papa tenha vindo fora da velha e cansada cristandade européia. Não se apresenta como refinado teólogo, mas como um zeloso Pastor que realiza o mandato de Jesus a Pedro:”confirma os irmãos e as irmãs na fé”(Lc 22,31). Carrega consigo a experiência das Igrejas do Terceiro mundo, particularmente, da América Latina.


Esta é outra insuficiência de Messori: o de não ter dimensionado o fato de que hoje por hoje, o Cristianismo é uma religião do Terceiro Mundo, como tantas vezes o tem enfatizado o teólogo alemão J. B. Metz. Na Europa os católicos não chegam a 25%, enquanto que no Terceiro Mundo alcançam quase 73% e na América Latina cerca de 49%.


Por que não acolher a novidade que se deriva destas Igrejas já que não são mais Igrejas-espelho das velhas Igrejas europeias, mas Igrejas-fonte  com seus mártires, confessores e teólogos?


Podemos imaginar que num futuro não muito distante a sede do primado não continue mais em Roma com a Cúria, com todas as contradições recentemente denunciadas com coragem pelo Papa Francisco com palavras somente ouvidas da boca de Lutero e no meu livro Igreja: carisma e poder (1984), que lido na ótica de hoje é antes um livro inocente que crítico. Faria sentido que a sede primacial estivesse lá onde se encontra a maioria dos católicos que está na América Latina, Africa e Ásia. Seguramente seria um sinal inequívoco da verdadeira catolicidade da Igreja dentro da nova fase globalizada da humanidade.


Esperava, sinceramente, uma maior inteligência de fé e mais abertura de Vittorio Messori, não obstante seus méritos de católico, fiel a um modelo clássico de Igreja e de notório escritor. Este Papa trouxe esperança e ar fresco para tantos católicos e a outros cristãos que se orgulham dele.


Não percamos esse dom do Espírito por causa de análises antes negativas que positivas e que não reforçam a “alegria do evangelho” para todos.


* teólogo da libertação. Leonardo Boff escreveu Francisco de Assis e Francisco de Roma, Mar de Idéias, Rio, 2014.



http://goo.gl/JKUGyE

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