08/01/2015

Apoio a Francisco diante das críticas

domtotal.com


Não podemos perder a esperança que o papa trouxe a


uma Igreja altamente desmoralizada.



Este papa trouxe esperança e alegria para muitos cristãos.


Por Leonardo Boff*

Li com um pouco de tristeza o artigo crítico de Vittorio Messori no Corriere della Sera, exatamente no dia menos adequado: a feliz noite de Natal, festa de alegria e luz: “As escolhas de Francisco: as dúvidas sobre a reviravolta do Papa Francisco”. Ele tentou prejudicar essa alegria ao bom pastor de Roma e do mundo, Papa Francisco. Mas em vão, porque não conhece o sentido de misericórdia e de espiritualidade desse papa, virtude que Messori seguramente não demonstra. Por trás de palavras de piedade e de compreensão, traz um veneno. E o faz em nome de tantos outros que se escondem por trás dele e não têm a coragem de aparecer em público.


Quero propor outra leitura do papa Francisco, como contraponto à de Messori, um convertido que, a meu ver, ainda precisa levar a termo a sua conversão com a recepção do Espírito Santo, para não dizer mais as coisas que escreveu.


Messori demonstra três insuficiências: duas de natureza teológica e outra de compreensão da Igreja do Terceiro Mundo.


Ele se escandalizou com a “imprevisibilidade” desse pastor, porque “continua perturbando a tranquilidade do católico médio”. É preciso se perguntar sobre a qualidade da fé desse “católico médio”, que tem dificuldade de aceitar um pastor que tem o cheiro das ovelhas e que anuncia a “alegria do evangelho”.


São, em geral, católicos culturais habituados à figura faraônica de um papa com todos os símbolos do poder dos imperadores pagãos romanos. Agora, aparece um papa “franciscano”, que ama os pobres, que não “veste Prada”, que faz uma crítica dura ao sistema que produz miséria em grande parte do mundo, que abre a Igreja não só aos católicos, mas também a todos aqueles que trazem o nome de “homens e mulheres”, sem julgá-los, mas acolhendo-os no espírito da “revolução da ternura”, como ele pediu aos bispos da América Latina reunidos em 2013 no Rio.


Há um grande vazio no pensamento de Messori. Estas são as duas insuficiências teológicas: a quase ausência do Espírito Santo. Diria mais, que ele incorre no erro teológico do cristomonismo, isto é, só Cristo conta. Não há propriamente um lugar para o Espírito Santo. Tudo na Igreja se resolve com o Cristo somente, o que o Jesus dos Evangelhos exatamente não quer.


Por que digo isso? Porque o que ele deplora é a “imprevisibilidade” da ação pastoral deste papa. Pois bem, essa é a característica do Espírito, a sua imprevisibilidade, como diz São João: “O Espírito sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai” (3, 8). A sua natureza é a repentina irrupção com os seus dons e carismas. Francisco de Roma no seguimento de Francisco de Assis se deixa conduzir pelo Espírito.


Messori é refém de uma visão linear, própria do seu “amado Joseph Ratzinger” e de outros papas anteriores. Infelizmente, foi essa visão linear que fez da Igreja uma cidadela, incapaz de compreender a complexidade do mundo moderno, isolada no meio de outras Igrejas e dos caminhos espirituais, sem dialogar e aprender com os outros, também eles iluminados pelo Espírito.


Significa ser blasfemos contra o Espírito Santo pensar que os outros pensaram apenas de modo equivocado. Por isso, é sumamente importante uma Igreja aberta como a quer Francisco de Roma. É preciso estar aberta às irrupções do Espírito chamado por alguns teólogos de “a fantasia de Deus”, por causa da sua criatividade e novidade, nas sociedades, no mundo, na história dos povos, nos indivíduos, nas Igrejas e também na Igreja Católica.


Sem o Espírito Santo, a Igreja se torna uma instituição pesada, cansativa, sem criatividade e, em um certo ponto, não tem nada a dizer ao mundo que não sejam sempre doutrinas sobre doutrinas, sem suscitar esperança e alegria de viver.


É um dom do Espírito que este papa venha de fora da velha cristandade europeia. Ele não aparece como um teólogo sutil, mas como um Pastor que realiza aquilo que Jesus pediu a Pedro: “Confirma os irmãos na fé” (Lc 22, 31). Traz consigo a experiência das Igrejas do Terceiro Mundo, especialmente as da América Latina.


Esta é outra insuficiência de Messori: não ter a dimensão do fato de que, hoje em dia, o cristianismo é uma religião do Terceiro Mundo, como acentuou tantas vezes o teólogo alemão Johan Baptist Metz. Na Europa, vivem apenas 25% dos católicos; 72,56% vivem no Terceiro Mundo (na América Latina, 48,75%).


Por que não pode vir dessa maioria alguém que o Espírito fez bispo de Roma e Papa universal? Por que não aceitar as novidades que derivam dessas Igrejas, que já não são Igrejas-imagem das velhas Igrejas europeias, mas Igrejas-fonte, com os seus mártires, confessores e teólogos?


Talvez, no futuro, a sede do primado não será mais Roma e a Cúria, com todas as suas contradições, denunciadas pelo papa Francisco na reunião dos cardeais e dos prelados da Cúria com palavras só ouvidas na boca de Lutero e, com menos força, no meu livro condenado pelo cardeal J. Ratzinger, Igreja: carisma e poder (1984), mas lá onde vive a maioria dos católicos: na América, África ou Ásia. Seria um sinal justamente da verdadeira catolicidade da Igreja dentro do processo de globalização do fenômeno humano.


Esperava mais inteligência e abertura de Vittorio Messori com os seus méritos de católico, fiel a um tipo de Igreja e renomado escritor. Este papa Francisco trouxe esperança e alegria para tantos católicos e outros cristãos. Não percamos esse dom do Espírito em função de raciocínios bastante negativos sobre ele.

Corriere della Sera, 24-12-2015.

*Leonardo Boff é teólogo.

 



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