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A 19 meses do início dos Jogos Olímpicos, nem metade da
meta de despoluição foi alcançada.
Os primeiros navegantes portugueses chegaram à baía em 1.º de janeiro de 1502, 63 anos antes da fundação da cidade, que completa 450 anos em março. Depois disso, ela já perdeu mais de 90 quilômetros quadrados em sucessivos aterros e pelo menos 68% da cobertura original de manguezais, conforme estudo do geógrafo Elmo Amador, morto em 2010. Do grande conjunto de ilhas e praias poucas mantêm as características originais que lhe conferiam, no passado, o título de paraíso tropical. Cartas náuticas do século 16 mostram baleias, aldeias indígenas e o pau-brasil explorado pelos colonizadores.
A segunda maior região metropolitana do País cresceu às margens da Guanabara. Hoje, cerca de 4,2 milhões de pessoas ainda vivem sem saneamento básico nos 15 municípios do entorno da baía, que recebe em média 10 mil litros por segundo de esgoto sem tratamento. O volume diário equivale a 346 piscinas olímpicas cheias.
A promessa da atual gestão do PMDB não foi a primeira a naufragar. Anunciado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG) começou a ser executado em 1995 e foi prorrogado oficialmente sete vezes. Consumiu mais de US$ 1,2 bilhão e continua inacabado até hoje.
Quatro grandes estações de tratamento foram construídas, mas faltaram as redes de esgoto, que ficam escondidas debaixo da terra. “Não é um projeto que teve boa reputação”, reconheceu o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que financiou a obra.
Um novo financiamento de R$ 1 bilhão foi aprovado pelo BID em 2012. O governo estadual afirma que estão em andamento obras e licitações para concluir as ligações entre as redes e construir uma nova estação, em Alcântara.
A conta para resolver o problema do esgoto na região metropolitana, porém, seria de pelo menos R$ 8 bilhões, estima o coordenador do Programa de Saneamento Ambiental do Entorno da Baía de Guanabara (Psam), Gelson Serva.
O PDBG estava tão queimado que mudou de nome. “Estamos avançando no planejamento. Concluímos este ano planos de água e esgoto para 8 dos 15 municípios, e os outros estão em curso”, diz Serva.
O engenheiro florestal Axel Grael, vice-prefeito de Niterói, critica a falta de coordenação. Vários órgãos governamentais respondem por partes do problema na baía. Ele cita como exemplo a experiência realizada na Baía de Chesapeake, nos Estados Unidos, com a criação de sistemas de monitoramento e a definição de metas a serem cumpridas.
“Nosso problema não é falta de dinheiro. Além do planejamento, precisamos de uma política clara de regulação. Se não tiver quem cobre, as metas não serão cumpridas”, diz Grael, lembrando que até hoje a Companhia de Águas e Esgotos do Estado (Cedae) não é regulada por uma agência externa – a previsão é de que isso ocorra a partir de agosto. “Portugal tinha uma situação igual ou pior que a do Brasil na área de saneamento e em dez anos se igualou à realidade europeia.”
Na Olimpíada, a baía receberá as provas de iatismo. Em janeiro, a velejadora e campeã mundial Martine Grael, sobrinha de Axel, postou uma foto em que aparecia sentada na prancha de frente a uma TV encontrada no local de competição. Fez sucesso nas redes sociais e chamou a atenção para o problema do lixo flutuante.
As estações de tratamento do Rio têm capacidade instalada para receber 49% da carga produzida, mas o esgoto coletado e tratado representa hoje cerca de 39% do total, segundo técnicos da Secretaria do Ambiente.
O deputado estadual e líder do governo da Assembleia, André Corrêa (PSD), que vai assumir a pasta, foi procurado pela reportagem, mas não deu entrevista. A estação de São Gonçalo já foi inaugurada quatro vezes e a de Paquetá se tornou um símbolo dos erros do programa: fora de uso durante longo tempo, ficou deteriorada e o governo desistiu de colocá-la em funcionamento.
Carioca
“O Rio Carioca, que dá nome a quem nasce na cidade e deságua na baía, é uma cloaca”, diz o urbanista e historiador Nireu Cavalcanti. Ele cita o caso do Rio Tâmisa, na Inglaterra, que ficou contaminado por mais de um século e hoje é um dos mais limpos do mundo. “Enquanto governo e sociedade aceitarem que isso aconteça com um rio de 4 km de valor tão simbólico para a cidade, todo o restante é demagogia.” Para Cavalcanti, a despoluição do Rio Carioca é “um ponto de honra”.
Um dos vencedores da premiação anual do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), em dezembro, foi o trabalho “Entre Rios: proposta de reestruturação do ciclo das águas urbanas de Botafogo”, de Romulo Guina.
Prevê um sistema biológico para despoluir o Rio Carioca, hoje canalizado, que seria aberto na Enseada de Botafogo. O presidente do IAB-RJ, Pedro da Luz Moreira, critica o andamento das obras de despoluição da baía e diz que é importante dar visibilidade para o problema. “Na medida em que se amplia a visibilidade, tornando a baía e os rios mais próximos, a população vai passar a cobrar mais.”
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