20/06/2015

Ben Stiller e Naomi Watts protagonizam filme


O diretor volta a extrair de suas próprias experiências a inspiração para o seu recente trabalho.




Incomodados com o envelhecimento, estão cansados da maneira conservadora como vivem.



Por Nayara Reynaud


O escritor francês Victor Hugo disse certa vez que “os quarenta são a velhice da juventude” e é bem esta sensação de finitude que os protagonistas de “Enquanto Somos Jovens” (2014) sentem.


Sem filhos por opção – no momento, porque Cornelia (Naomi Watts) teve muita dificuldade para engravidar antes – e sem realizar as mesmas coisas do início do relacionamento – não viajam, por exemplo, porque Josh (Ben Stiller) nunca termina o seu documentário –, o casal novaiorquino quarentão se sente estagnado, constatando que eles não alcançaram muitos dos objetivos que traçaram.


Não é surpresa saber que este é o novo filme de Noah Baumbach, cineasta com uma filmografia dedicada às crises de diversas fases: o autobiográfico “A Lula e a Baleia” (2005), baseado em sua própria adolescência conturbada pela separação dos pais; o sucesso indie “Frances Há” (2012), retrato agridoce de uma geração que, aos vinte e tantos anos, vê a realidade sobrepor seus grandes sonhos; além de “Margot e o Casamento” (2007) e “O Solteirão” (2010), que já flertavam com as crises de meia-idade.


Agora que está com 45 anos, o diretor volta a extrair de suas próprias experiências – ele namora desde 2011 a atriz de 31 anos Greta Gerwig, protagonista de seus dois últimos longas e do próximo, “Mistress America” (2015) – a inspiração para o seu recente trabalho. Com a diferença que, neste, o foco recai muito mais no conflito de gerações.


Quando seus amigos Marina (Maria Dizzia) e Flatcher (Adam Horovitz, o Ad-Rock do Beastie Boys, ícone da geração X) têm um bebê e passam a dedicar todo seu tempo para a criança, além de instigá-los a terem um filho também, Cornelia e Josh passam a olhar para si e perceber como chegaram aos 40. Se “envelhecer é cansar de si mesmo”, segundo o poeta e crítico literário Mário da Silva Brito, os dois, esgotados com sua própria rotina, veem no jovem casal Darby (Amanda Seyfried) e Jamie (Adam Driver) uma chance de renovação.


Consumidores adictos das novas tecnologias, ficam encantados com os novos conhecidos, não só porque o rapaz é um documentarista iniciante que diz ser fã de Josh, mas por causa do jeito descolado dos dois. Os jovens moram em um loft junto com outra garota (Dree Hemingway), onde montam seus próprios móveis, usam máquina de escrever e mantêm uma coleção de vinis e VHS.


Para completar todo o estereótipo hipster – lembrando que esse estilo de vida alternativo, que se tornou um termo pejorativo hoje em dia, surgiu em Williamsburg, no Brooklyn, bairro retratado na história – usado por Baumbach, Jamie usa chapéus vintage e Darby faz sorvetes artesanais.


Há também certos excessos na sequência em que os novos amigos levam Josh e Cornelia a um ritual xamânico com ayahuasca, digna dos filmes de Judd Apatow. Mas, diferente de “Bem-Vindo aos 40 Anos” (2012), escrachada comédia com temática parecida daquele diretor e produtor, Noah prefere as situações cotidianamente inusitadas e os diálogos certeiros e refinados, que remetem a outro cineasta.


“Enquanto Somos Jovens” é, talvez, um dos longas mais “woodyallenianos” que não foram dirigidos pelo próprio Woody Allen, com uma clara referência a “Crimes e Pecados” (1989) em sua subtrama metalinguística.


Se a cartela inicial traz uma citação à peça “Solness, O Construtor” (1892), do norueguês Henrik Ibsen, que trata do medo do personagem principal de deixar a porta aberta aos mais novos, o temor deste protagonista se manifesta quando ele tem de fazer isso no que diz respeito ao seu próprio trabalho.


Empolgado com a aparente generosidade do jovem casal, Josh, que não conseguiu colaborar com o sogro (Charles Grodin), também documentarista, dispõe-se a ajudar no projeto de Jamie sobre o Facebook e as relações reais, chegando até a ceder a fonte principal de seu interminável documentário – o especialista vivido pelo cantor folk Peter Yarrow – que vai das guerras à situação na Turquia para falar da América.


No entanto, como todo homem vivido desconfia da juventude porque já passou por esta fase, ele vai encontrar no jovem a mesma ambição de seu início de carreira, embora os métodos dos dois sejam totalmente diferentes. O que resulta em um debate ético sobre verdade e ficção nos documentários – culminando na discussão artificial, talvez sendo esta a intenção, do clímax –, mas também sobre o relacionamento dos dois casais e dessas duas gerações.


Nesse último quesito, o diretor às vezes cai no maniqueísmo, mas é difícil o público não simpatizar com qualquer um dos quatro personagens principais, mesmo que rejeite algumas atitudes ou pensamentos, até porque ele prefere deixar boa parte do julgamento ao espectador.


Tal empatia se deve em grande parcela ao elenco. Ben Stiller está em sua melhor forma, enquanto Adam Driver mostra por que é uma das grandes apostas de Hollywood. Naomi Watts destaca-se com um ótimo timing mesmo em um papel que merecia mais complexidade, assim como se ressente o pouco espaço dado a Amanda Seyfried. É uma pena que os personagens femininos, tão bem trabalhados por Baumbach em outros longas, sejam tão reduzidos neste, que, aliás, não tem a mesma inspiração e autenticidade de “Frances Ha”, embora tenha maior alcance.


E se o espectador – assim como quem escreve esta crítica – se identifica mais com o filme anterior do cineasta, possivelmente fará outras releituras com o passar do tempo, quando encontrar seus novos sonhos e frustrações ao rever “Enquanto Somos Jovens”. Até porque aí já terá a certeza de Millôr Fernandes de que “qualquer idiota consegue ser jovem”, mas que “é preciso muito talento pra envelhecer”.


Clique aqui, assista ao trailer e saiba onde o filme está em cartaz na Agenda Cultural!



Reuters

 



http://www.paroquiasantoafonso.org.br/?p=15739

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