07/08/2015

A riqueza e a elegância


No Brasil recente o dinheiro sujo vai mostrando cada vez mais sua cara imunda.





Ufa! Estamos fartos de histórias de roubalheiras, crimes e atrocidades diversas cometidas em nome do dinheiro, também conhecido como a semente do capeta. No Brasil recente o dinheiro sujo vai mostrando cada vez mais sua cara imunda – passeando de Ferraris e Lamborghinis, navegando em iates ou reformando sítios de luxo de guerreiros do povo.


Hoje, para aliviar, me lembrei de algumas histórias onde o dinheiro aparece de forma mais limpa ou elegante, digamos assim.  O primeiro caso é o de Brigitte Bardot. Nos tempos em que a atriz era jovem, viveu uma de suas (muitas) aventuras amorosas com o industrial alemão Gunther Sachs, playboy herdeiro de um império. Com a chegada da idade e a partida de seus antigos amores, Brigitte afastou-se do cinema e dedicou-se à proteção dos animais, criando um abrigo gigantesco para receber bichos abandonados ou em risco de extinção. Pois bem: contam que o tal abrigo andava mal das pernas, sob risco de fechar as portas. No passado, Brigitte ganhara de Gunther um anel de brilhantes valiosíssimo, uma obra prima presenteada no calor da paixão de seu amado. Não teve dúvidas: abriu o cofre e resolveu leiloar a joia para levantar uma graninha. A peça, disputadíssima por um seleto grupo de investidores e amantes do cinema, foi arrematada por um anônimo que pagou uma fortuna muito acima do valor estimado. Dias depois, Brigitte recebeu de volta o anel e um bilhete carinhoso do autor da façanha milionária: o próprio Gunther Sachs, já velhinho como ela. (Soube que o playboy e gentleman Gunther Sachs teve um final triste: muito doente, suicidou-se há alguns anos em seu chalé alpino).


A outra história envolve uma professora no Brasil. Como seus semelhantes da penosa carreira, ela trabalhava como doida, sempre no sufoco, dando aulas aqui e ali para pagar as contas. Correndo de um lado para o outro, cheia de compromissos, pilotava seu único bem: um velho Ford Del Rey caindo aos pedaços. Certa manhã, ao estacioná-lo com pressa e atrasada para uma das aulas, distraiu-se por um segundo e – crás! – reduziu a cacos o farol de uma reluzente BMW novinha, logo atrás. Dado a ausência de testemunhas do evento, poderia ela ter caído fora, estacionando outra vez bem longe e safando-se de aborrecimentos. Mas, não: rabiscou um bilhete com nome e telefone, assumindo a culpa e colocando-se à disposição do dono para reparar o prejuízo. Encaixou o papel no limpador de para-brisas e correu pra sua aula. No dia seguinte tocou o celular. Ela atendeu tremendo: era mesmo o dono da BMW.


– Relaxa, moça; não precisa pagar nada, tenho seguro. Seu bilhete vale mais que a porcaria do farol. Só liguei para lhe agradecer; isso é raro nesse mundo – disse o homem, certamente um rico elegante.


Deixei a terceira história para o final porque ela gira em torno de – acreditem! – um político. Trata-se de um sujeito idealista e distinto. Depois de uma carreira vitoriosa como empresário, o cara tinha acumulado fortuna e feito de tudo na vida. Daí resolveu dedicar seu talento e experiência da terceira idade à causa pública. Entrou na política meio no entusiasmo e candidatou-se a prefeito. Um tanto alheio às safadezas de uma campanha e levado por sua boa fé, recebeu apoios diversos de gente de todo tipo – inclusive dos interesseiros de plantão, aqueles que apostam em todos os candidatos para garantir o futuro butim. Foi eleito. Na primeira semana, um desses apoiadores pediu-lhe uma audiência. Assentou-se bem à vontade, arrogante e, sem mais rodeios, atacou:


– Olha doutor; botei dinheiro na sua campanha e ajudei a lhe eleger.


– Ah, sim, muito obrigado!


O homem deu um sorrisinho safado e mudou o tom:


– Obrigado, ? Agora quero minha parte nas obras.


O prefeito – também homem de negócios calejado – não titubeou:


– Quanto você gastou na campanha?


– Tanto – disse o empreiteiro. E sacou a cópia dos depósitos.


O prefeito pegou a calculadora, conferiu tudo, chegou ao total. Não era pouco. Pegou o telefone, confirmou as tais doações.


Tranquilamente, tirou do bolso do paletó seu talão de cheques – pessoal – preencheu um deles e entregou-o ao visitante:


– Tá aqui. Não lhe devo mais nada, certo?


Dá vontade de ser rico só pra fazer umas coisas assim, não dá?



*Fernando Fabbrini é roteirista, cronista e escritor, com dois


A riqueza e a elegância

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