23/08/2015

Clássico da literatura é ousado nos cinemas


“O Pequeno Príncipe” é um filme para nossos tempos de insensatez e mesquinhez.





Por Alysson Oliveira


A princípio, é uma atitude arriscada e perigosa do animador Mark Osborne (de “Kung Fu Panda”) adaptar para o cinema o livro “O Pequeno Príncipe”, que parece tão amado quanto mal compreendido – a ponto de ser rotulado como literatura infantil, ou, na trívia clássica, o favorito das misses.


Não contente em saltitar nesse campo minado, o diretor expande a trama, atualizando-a e criando uma nova moldura. Num ano em que “Divertida Mente” desponta como candidato a melhor animação, “O Pequeno Príncipe” tem muitas chances de disputar o posto.


A premissa básica está lá, mas o que Osborne e seus roteiristas (Irena Brignull e Bob Persichetti) fizeram foi ler o livro de Antoine de Saint-Exupéry, publicado em 1943, liberar-se dele e fazer um filme que é uma lufada de ar fresco na história já tão conhecida.


O longa começa com uma abertura com ilustrações semelhantes às famosas do livro, criando um ambiente onírico que logo é dissipado quando nos deparamos com uma garotinha (voz de Mackenzie Foy, na versão original; Larissa Manoela, na nacional) prestes a passar por uma entrevista para entrar numa escola prestigiada.


Pressionada por sua mãe – viciada em trabalho e que já planejou milimetricamente o futuro da filha até a vida adulta –, a menina acaba fracassando. Sua última chance de ser aceita numa boa escola é morar no mesmo bairro onde essa está localizada.


Sozinha na nova casa, enquanto a mãe passa o dia inteiro trabalhando, a garota tem um esquema rígido de estudos, que deve ser seguido com as devidas marcações num quadro enorme na parede. Sua concentração, no entanto, é abalada por um velho aviador (Jeff Bridges/Marcos Caruso) excêntrico que mora na arruinada casa ao lado e tem um pequeno avião em seu jardim.


Nesse momento, o filme segue de perto o livro de Saint-Exupéry, enquanto o aviador conta à garota suas aventuras quando conheceu o principezinho, descrevendo as pessoas e criaturas que cruzaram seu caminho – como a raposa, a rosa, a cobra, o rei e um empresário.


Osborne retém não apenas a narrativa do livro aqui. Estão presentes a mesma linguagem poética – ao mesmo tempo ingênua e melancólica – e vários desenhos que remetem ao original, muito bem combinados com stop motion e animação digital.


Até aqui teríamos um curta que beira a perfeição. Mas o diretor e sua equipe vão além, expandindo a temática da perda, memória e amizade, criando uma fábula melancólica sobre nossos tempos sombrios e o direito ao sonho como forma de resistência à alienação e mecanização de nosso mundo. Sua posição crítica à sociedade industrial e de consumo, a seu modo, dialoga bem tematicamente com a animação brasileira “O Menino e o Mundo”, de Alê Abreu.


Quando a garotinha encontra o personagem-título já adulto, ele não é mais pequeno, nem príncipe, e seus sonhos e desejos tornaram-se coisas do passado. Cooptado por uma sociedade cinzenta, fria e mecanizada, o rapaz é uma espécie de renegado da meritocracia, que aspira por um mundo melhor, mas sente-se incapaz de agir. Seus impulsos de ação – assim como suas utopias – aparentemente dissiparam-se com o tempo, sumiram com o fim de sua infância.


É diante dessa decepção que a menina precisa repensar seu presente e o peso tão árduo que carrega em seus frágeis ombros, imposto pela mãe para um futuro que ela escolheu para a filha.


Longe de celebrar apenas “a criança que existe dentro de cada um”, “O Pequeno Príncipe” é um filme para nossos tempos de insensatez e mesquinhez. Osborne clama por um mundo menos opressivo, mais colorido e livre.


Clique aqui, assista ao trailer e saiba onde o filme está em cartaz na Agenda Cultural!



Reuters

 



Clássico da literatura é ousado nos cinemas

Um comentário :

  1. Participei dessa peça no Colégio da Imaculada Conceição: direção de Mattos Dourado!

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