23/11/2011

Dúvidas dos leitores

FUI ou FOMOS ao jogo eu e o meu filho?
Rigorosamente, “FOMOS ao jogo eu e o meu filho”. O sujeito (=eu e o meu filho) é composto e corresponde a “nós” (=1ª pessoa do plural).
Entretanto, quando o sujeito composto aparece posposto (=depois do verbo), é aceitável que se faça o que se chama concordância atrativa (=o verbo concorda com o núcleo do sujeito mais próximo). Isso significa que “FUI ao jogo eu e o meu filho” também é aceitável.
Portanto, estão corretas as duas concordâncias: “PASSARÃO o céu e a terra” ou “PASSARÁ o céu e a terra”.
Leitor pergunta: “Jornal de grande circulação de São Paulo publicou entrevista de ex-ministro na qual teria dito: Quem conduziu…foi o PSDB e eu. Não seria … fomos o PSDB e eu?”
Eu também prefiro a segunda opção: “…fomos nós (=o PSDB e eu)”. Mas isso não significa que o verbo no singular concordando somente com o PSDB esteja errado. É a tal concordância atrativa.

Uso de estrangeirismos
O uso de palavras estrangeiras na língua portuguesa não é assunto que possa ser tratado com tanta simplicidade como alguns imaginam.
Meus leitores bem sabem que não sou um purista, do tipo que rejeita qualquer “estrangeirismo”. Entretanto, sou contra a invasão dos “modismos” e dos “exageros desnecessários”.
Quanto a este assunto, eu me considero um moderado. Já expus o meu pensamento aqui, mas não custa repetir:
1o) Toda vez que surgir a necessidade de usarmos uma palavra ou expressão estrangeira, devemos buscar uma forma equivalente em português. Em vez de “beach soccer”, podemos usarfutebol de areia. Por que “dar o start” ou “startar”, se podemos iniciar ou começar?
2o) Se a tradução não “funciona”, devemos tentar o “aportuguesamento”: contêiner, estressado, futebol, blecaute, bufê…
É lógico que sempre haverá casos discutíveis: correio eletrônico ou e-mail, xampu ou shampoo?
3o) Caso a tradução e o aportuguesamento “fracassem”, só nos resta aceitar o termo estrangeiro na sua forma original: software, marketing, impeachment, réveillon…
Leitores desta coluna pedem espaço para expor suas ideias:
“As companhias telefônicas mencionam na propaganda ligações de longa distância. Isso é tradução literal do inglês. No Brasil essas ligações são conhecidas como “interurbano”. Na televisão dizem que ‘nossas operadoras esperam sua ligação’ quando o termo usual no Brasil é “telefonista”. Estamos perdendo nosso idioma.”
Outro leitor nos escreve: “Algumas pessoas têm a mania idiota e colonizada de encher suas frases e discursos de termos e expressões em inglês (…) Costumam se justificar dizendo que ‘em inglês fica mais conciso, preciso. Quando me dizem isso, peço logo para verterem para o inglês a frase Era uma vez um velhinho… Em português são 5 palavras e 23 caracteres (inclusive os espaços). Em inglês, Once upon a time there was a little old man… 10 palavras e 44 caracteres.”
Concordo em parte com os leitores. Não há necessidade alguma de substituirmos as “velhas” telefonistas pelas “modernosas” operadoras. Também prefiro o tradicional interurbano, mas vamos botar um pouquinho de pimenta no assunto, para tornar a discussão mais gostosa: a expressão ‘ligação de longa distância’ não estaria sendo usada num sentido mais genérico, para englobar o DDD e o DDI?
Mais leitores se manifestam:
“Pude constatar, em algumas páginas portuguesas na Internet, o uso de “páginas domésticas” em vez de “homepage”, confirmando assim a xenofobia que ocorre em Portugal…”
“Foi uma surpresa ao me deparar com as traduções de nomes estrangeiros em Portugal. Já pude perceber há bastante tempo, desde meus primeiros dias de Internet. (…) “Grid de largada” lá é “Grelha de partida”. O piloto Mika Hakkinen nesceu em Helsínquia, na Finlândia. E que tal a tradução de “mouse” para “rato”, referindo-se a um dos principais acessórios de qualquer PC hoje em dia?”
Para nós brasileiros, o problema torna-se maior quando o termo estrangeiro já está consagrado. A substituição fica muito difícil. Não acredito que “páginas domésticas”, “grelha de partida” e “rato” venham a ser usados no Brasil.
“Os portugueses criticam duramente o fato de usarmos o termo “bonde” (de origem inglesa) para designarmos o que aqui se chama de um “eléctrico”. No entanto, usam calmamente termos tais como “tablier” (do francês) para designar o painel de automóvel, “mable” (do inglês) para designar um tipo de sofá, além das citadas “impeachment”, “shopping center”, “talk show”…
Tudo isso prova que não devemos ser radicais. Podemos valorizar a língua portuguesa, mas sem xenofobia.
Duro mesmo é caminhar no calçadão da praia de Ipanema no Rio de Janeiro, com toda aquela beleza que Deus lhe deu, e repentinamente encontrar um tal “Muscle Beach”. Será que uma “musculação na praia” não faria o mesmo sucesso?  

Dúvidas dos leitores

qua, 16/11/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
OBRAS-PRIMAS ou OBRAS-PRIMA?
O certo é OBRAS-PRIMAS.
Se a palavra composta, com hífen, é constituída de um substantivo e um adjetivo (ou adjetivo + substantivo), os dois elementos vão para o plural: altas-rodas, altos-fornos, altos-relevos, amores-perfeitos, batatas-doces, boas-novas, boias-frias, cabeças-chatas, cachorros-quentes, dedos-duros, guardas-civis, matérias-primas, meias-luas, meios-fios, ovelhas-negras, peles-vermelhas, puros-sangues…

OBRAS-PRIMAS e PROTAGONISTAS?
Leitor quer saber se está correto o uso das palavras obras-primas e protagonistas? “Não são palavras que definem uma condição de exclusividade, ou o uso se modificou a ponto de designar as obras ou os personagens mais importantes?”
Vejamos o que está registrado em nossos dicionários:
1ª) Obra-prima: “obra primorosa, das primeiras no seu gênero, obra
capital, a melhor obra de um autor, obra mestra” (Caldas Aulete); “obra que é das primeiras em seu gênero, a melhor obra de um autor” (Michaelis).
O uso está realmente modificando o sentido original da palavra, ou
seja, obra-prima deixa de ser a obra maior de um autor para tornar-se sinônimo de qualquer grande obra, de obras importantes. Isso não me agrada. Prefiro respeitar a origem da palavra. Rigorosamente, cada autor só tem uma obra-prima.
2ª) Protagonista: “pessoa que em uma peça teatral representa o
principal papel” (Caldas Aulete); “principal personagem de uma peça dramática” (Michaelis).
Originariamente, protagonista só havia um. A culpa da “pluralização dos protagonistas” só pode ser das modernas telenovelas.
Que uma telenovela tenha mais de um protagonista, “dá pra engolir”. Entretanto, não esqueça que protagonista principal é redundante e protagonista secundário não existe.

CURIOSIDADES
Carta de leitor: “Recentemente escutando uma rádio, pude observar o locutor dizendo: ‘Nossos preços são terríveis para concorrência’. Fiquei imaginando: 1. Os preços são tão ruins (altos) que são terríveis para a concorrência; 2. Os preços são terríveis para a concorrência, de tão baixos, assusta. Creio que o item 2 deva estar certo. Pelo menos, deve ser isso que o anunciante deve estar querendo passar. Mas não ficaria melhor dizer simplesmente que nossos preços sãomenores que o da concorrência.”
É óbvio que a segunda interpretação é a que traduz a intenção do anunciante. Quanto à ambiguidade da frase, isso é frequente em linguagem publicitária. E é intencional. A linguagem de duplo sentido é uma das maneiras mais eficazes de atrair a atenção dos clientes.
A ambiguidade é ruim em situações sérias. No famoso e triste episódio do Banco Marka, ouvimos alguém do Banco Central afirmar: “Conseguimos a melhor cotação do dólar”. Resta saber, melhorpara quem?
Voltando às curiosidades.
Outro leitor acha estranha a história do exame médico. O paciente faz exame para saber se o tumor é maligno. Responde o médico: “Deu positivo”. Infelizmente o resultado do exame não é “positivo” para o paciente. Para ele, não é uma boa resposta. No caso, positivo significa que o tumor realmente é maligno.
Outro leitor pergunta: “É comum ouvir-se a expressão aniversário de 6 meses de uma empresa, ou aniversário de 3 meses de namoro. O uso de aniversário para designar outros intervalos de tempo que não o anual é aceitável?”
Nosso leitor internauta tem razão. Aniversário vem do latim anniversarius e significa o “que volta todos os anos, anual”. Portanto, “aniversário de 6 ou 3 meses” só se for no sentido metafórico. Rigorosamente é uma incoerência, a etimologia (=origem da palavra) está sendo desrespeitada. Isso me fez lembrar a sugestão de um amigo, encantado com o sucesso da última bienal do livro. Segundo ele, a bienal do livro deveria ocorrer todos os anos. A ideia é boa, mas a primeira providência será a troca do nome. Bienal é só de dois em dois anos.
Outra curiosidade é a dúvida de uma leitora: “Ouvi de um personagem de novela: ‘Me inclua fora dessa’. É correto? Pode haver inclusão na exclusão?”
É lógico que não. Mas, provavelmente, deve ter sido usado ironicamente. Deve ter sido uma brincadeira. A frase ‘Me inclua fora disso’ já virou piada. É bom não levá-la a sério.
E, para terminar, a “pérola” de um aluno: “Aquele cara tem o corpo todo malhado porque toma muito asteróide.” Sem comentários.

DESMISTIFICAR ou DESMITIFICAR?
DESMISTIFICAR = “desfazer uma mistificação ou impostura. Desmoralizar-se, desmascarar-se.” (Dicionário Ilustrado da Língua Portuguesa, elaborado por Antenor Nascentes)
DESMITIFICAR = “desfazer a mitificação existente acerca de pessoa ou coisa.” (Dicionário Larousse)
Os dois verbos estão registrados no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, entretanto o verbo DESMITIFICAR não aparece em muitos dicionários.
A diferença prática, no meu modo de ver, é a seguinte:
DESMISTIFICAR é “acabar com uma farsa”;
DESMITIFICAR é “deixar de ser mito”.

Dúvidas dos leitores

qua, 09/11/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
Um ou uma telefonema?
Telefonema é um substantivo masculino. Devemos, portanto, dar um telefonema.
As palavras terminadas em “-ema”, geralmente de origem grega, são masculinas: o problema, o estratagema, o trema, o telefonema…
Nem todas as palavras terminadas em “a” são femininas. Não esqueça que “a grama” é a relva e que “o grama” refere-se à massa (peso): mil gramas = um quilograma.
 um telefonema para a mercearia e peça duzentos gramas de mortadela.

A NÍVEL DE ou EM NÍVEL DE?
Muitos leitores querem saber qual é a forma correta: “A nível de ou em nível de usuário de informática…”?
É a “famosa” dúvida de nada com coisa alguma. Não há “níveis”. Ninguém está se referindo ao “nível” dos usuários de informática.
Dependendo do restante da frase, poderíamos usar:
“Como usuário de informática…”
“Quanto ao usuário de informática…”
“Em referência ao usuário de informática…”
“Sendo usuário de informática…”
Quando houver “níveis”, podemos usar a forma “EM NÍVEL”:
“São problemas a serem resolvidos em nível federal.”
A expressão “a nível de” não passa de um modismo linguístico, totalmente desnecessário, principalmente por ser usado em situações em que não há “níveis”:
“O problema só será resolvido a nível de reunião” (basta: “só será resolvido em reunião”);
“O projeto ainda está a nível de discussão” (basta: “ainda está sendo discutido ou em fase de discussão”).

NÃO-CONFORMIDADE ou NÃO CONFORMIDADE?
Embora alguns autores contestem a tendência de usarmos o advérbio “não” no papel de prefixo, não podemos fechar os olhos à realidade.
Antes do novo acordo ortográfico, a tendência era seguir as seguintes regras:
1) “Quando o ‘não‘ funciona como autêntico prefixo, equivalente a ‘in-’, liga-se ao substantivo mediante hífen. Portanto: o não-conformismo, o não-comparecimento, a não-intervenção, o não-pagamento, a não-quitação, a não-flexão.
2) Quando, porém, o ‘não‘ antecede adjetivo não há hífen. Portanto: não descartável, não durável, não flexionado, não resolvido…”
Assim sendo, o correto era NÃO-CONFORMIDADE com hífen, pois conformidade é substantivo.
Essa polêmica toda acabou. O novo acordo ortográfico decretou o fim do hífen com o elemento “não”, seja advérbio de negação ou fazendo papel de prefixo.
Devemos escrever sem hífen: organização não governamental, tratado de não agressão, diante do não pagamento, o relatório apresentou muitas não conformidades…

DISPONIBILIZAR?
“Afinal, disponibilizar virou verbo, ou não? Ou trata-se de mais um modismo que com o tempo acaba incorporando-se à língua, sem lembrarmos mais da origem?”
A dúvida se devia ao fato de, embora muito usado, principalmente no meio empresarial, não haver registro do tal verbo em nossos dicionários. Não aparecia nem Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela Academia Brasileira de Letras em 1998.
O problema acabou. As novas edições de nossos dicionários e a última edição do VOLP registram finalmente o verbo DISPONIBILIZAR (= tornar disponível).

MELHOR ou MAIS BEM?
Leitora pergunta: “O certo não é usar, antes de particípio, mais bem e mais mal em vez de melhore pior ?”
Este caso é polêmico. Para alguns autores, o certo é “melhor distribuídos”; outros afirmam que o certo é “mais bem distribuídos”; e há ainda os que dizem que é um caso facultativo.
Costumo não reduzir o caso a uma discussão de certo ou errado. Para agilizar o nosso trabalho, simplificamos o fato: diante de qualquer particípio, devemos usar “mais bem” ou “mais mal”.
Como ninguém diria que “Ronaldinho é o jogador brasileiro melhor pago” ou que “o trabalho foipior feito”, preferimos usar “mais bem” e “mais mal” diante de qualquer particípio: “Ronaldinho é o jogador brasileiro mais bem pago”, “O trabalho foi mais mal feito”, “Ele está mais bem preparado”, “O corredor mais bem colocado”…
Assim sendo, a nossa leitora tem razão em sua crítica. Devíamos ter escrito: “Negócios serãomais bem distribuídos”.

Dúvidas dos leitores

qua, 02/11/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
O inferno É ou SÃO os outros?
Rigorosamente, seria um caso facultativo: “Tudo é flores” ou “Tudo são flores”.
A realidade, porém, tem nos ensinado que a preferência pelo plural é incontestável. Entre o singular e o plural, o verbo ser concorda no plural:
“O inferno são os outros.”
“O resultado da pesquisa são números assustadores.
“A prioridade do governo são os pobres.”
“O maior problema do Rio de Janeiro são as chuvas.”
Estes dados são parte de um relatório confidencial.”

Solicitamos um talão ou caderno de cheques?
No Brasil, usamos talão de cheques. Talão de cheque pode ser também o cheque solitário, e não necessariamente o talonário.

Um milhão de reais foi gasto ou foram gastos?
As duas formas são aceitáveis.
Prefiro a concordância com o especificador:
“Um milhão de reais foram gastos neste investimento.”
“Um milhão de vacinas foram retiradas do mercado.”
“Um milhão de mulheres estão grávidas.”

Autocuidado ou auto-cuidado?
Segundo o novo acordo ortográfico, com o prefixo auto, só devemos usar hífen se a palavra seguinte começar por “h” ou por vogal igual: auto-hipnose, auto-observação…
Com as demais letras, devemos escrever sem hífen ou, como se diz popularmente, “tudo junto”.
Com as consoantes “r” e “s”, deveremos dobrar o “r” e o “s”: autorretrato, autosserviço…
Com as outras vogais, não haverá mais hífen: autoajuda, autoestima, autoanálise, autoatendimento…
Se a palavra seguinte começar com qualquer outra letra, devemos escrever sem hífen, como sempre foi: autobiografia, autocontrole, autocrítica, autodeterminação, autogestão, automedicação, automutilação, autopromoção…
Segundo a regra, deveríamos escrever “autocuidado”. O problema é que não há registro da palavra no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.

Dia a dia ou  dia-a-dia?
Antes do novo acordo ortográfico, a regra era a seguinte:
a)    Devíamos escrever sem hífen quando “dia a dia” significa
“diariamente” (=expressão adverbial):
“Sua fama cresce dia a dia.”
b)    Devíamos escrever com hífen quando a expressão “dia-a-dia”
aparece substantivada (=cotidiano):
“Os atletas falam do dia-a-dia na semana decisiva.”
Segundo o novo acordo, palavras compostas que apresentem elementos de conexão só terão hífen se forem nomes ligados à zoologia ou à botânica: joão-de-barro, copo-de-leite…
Os demais compostos não terão hífen: dona de casa, fim de semana, lua de mel, pé de moleque, cara de pau, pé de cabra, passo a passo, disse me disse, sobe e desce…
Assim sendo, DIA A DIA não terá mais hífen quando usado como substantivo, com o sentido de “cotidiano”:
“Isso tudo faz parte do dia a dia do carioca”.

O uso do pronome LHE
Leitor nos escreve: “Como nordestino uso muitas vezes o pronome “lhe”. Pergunto: quando usá-lo?”
O pronome “lhe”, como complemento verbal, substitui os objetos indiretos:
“Eu não lhe obedeço.”
“Eu devo dizer-lhe a verdade.”
“Eu lhe entreguei os documentos.”
Quem decide se o objeto é direto ou indireto é o verbo. Em caso de dúvida, vá ao dicionário. Lá você vai encontrar a regência do verbo (=se pede preposição ou não).
Quem obedece obedece “a” alguém. Obedecer é um verbo transitivo indireto, por isso “eu não lheobedeço”.
A forma “eu lhe amo” deve ser evitada na língua padrão, porque o verbo amar é transitivo direto. Pede objeto direto, por isso não poderíamos usar o pronome “lhe”.

Dúvidas dos leitores

qua, 26/10/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
À DOMICÍLIO ou A DOMICÍLIO?
Segundo o poeta Ferreira Gullar, a crase não foi feita para humilhar ninguém. Concordo. Humilhar não humilha, mas dá uma enorme dor de cabeça.
Quando o assunto é crase, é briga na certa. As questões polêmicas são muitas.
A pergunta campeã é … à domicílio ou a domicílio?
Quanto ao uso do acento grave indicativo da crase, não há discussão. É um caso de crase impossível, por uma razão muito simples: domicílio é um substantivo masculino.
É importante lembrar que, antes de substantivos masculinos, é impossível haver crase, porque, se houvesse artigo definido, seria o artigo “o”. Não esqueça que para ocorrer a crase, precisamos da preposição “a” + artigo definido feminino “a”. Assim sendo, não perca tempo: a serviço, a pé, a álcool, a jato, a tiros, a 100 metros, a prazo…
A controvérsia que existe quanto à famosa expressão “entrega a domicílio” não é a crase. O que se discute é a preposição. Se toda entrega se faz “em” algum lugar, por que devemos fazer a entrega “a domicílio”?
Se fazemos qualquer entrega “em casa, no escritório, no quarto do hotel”, devemos também fazer a entrega “em domicílio”.
Alguns autores alegam que a expressão “entrega a domicílio” já está consagrada pelo uso. Posso até concordar com o fato de ela ser muito usada, mas discordo daqueles que afirmam que“ninguém usa entrega em domicílio”. Para provar isso, tenho dois bons exemplos. Basta observar o que está escrito nas novas caminhonetes de uma grande rede de supermercados no Rio de Janeiro ou então na propaganda de outro enorme supermercado na Barra da Tijuca, onde se lê em letras garrafais: “ENTREGAS EM DOMICÍLIO”.
Embora a forma “entrega a domicílio” seja aceitável, prefiro que usemos “entrega em domicílio”e sugiro que esse tipo de dúvida não seja questão de provas e concursos.

CAJU x GRAJAÚ?
Embora alguns insistam, caju, Bangu, urubu, bauru e Pacaembu não tem acento agudo.
Regra 1 – Só acentuamos as palavras oxítonas (=sílaba tônica na última sílaba) terminadas em “a”, “e” e “o”, seguidas ou não de “s”:
“a(s)” = cajá, Paraná, atrás, aliás…
“e(s)” = jacaré, você, através, português…
“o(s)” = paletó, avô, após, compôs…
Não se acentuam as oxítonas terminadas em “i” ou “u”:
“i(s)”  = aqui, Parati, eu dividi, anis…
“u(s)” = caju, bauru, urubu, Bangu, Pacaembu, Nova Iguaçu…
Regra 2 – Acentuam-se as vogais “i” e “u” tônicas, formando hiato com a vogal anterior e formando sílaba sozinhas ou com “s”:
Gra-ja-ú, ba-ú, I-ta-ú, I-ca-ra-í, eu sa-í, eu in-flu-í, eu a-tra-í, pa-ís…
A diferença, portanto, é o hiato: CA-JU, mas GRA-JA-Ú; I-CA-TU, mas I-TA-Ú…
É importante lembrar que o novo acordo ortográfico aboliu o acento agudo somente nas palavras em que as vogais “i” e “u” tônicas formam hiato com um ditongo decrescente:
feiúra > feiura (fei-u-ra);
baiúca > baiuca (bai-u-ca);
Bocaiúva > Bocaiuva (bo-cai-u-va).

QUE NEM?
Leitora nos escreve: “Li num anúncio: ‘Se você estiver…tome cuidado para não sair gritando, pulando e comemorando que nem um louco’. Que nem está correto? É um advérbio de modo?Que nem = como?”
Vamos por partes.
1o) A expressão que nem é característica da linguagem coloquial brasileira. Deveria, portanto, ser evitada em textos mais formais.
2o) O caso não deve ser reduzido à discussão de certo ou errado.
3o) A expressão que nem é equivalente a conjunção comparativa como. Não se classifica, portanto, como advérbio de modo. Poderia ser classificada como uma conjunção subordinativa comparativa.

MINIMIZAR = reduzir ao máximo ou ao mínimo?
Eu prefiro a lógica: em vez de ‘reduzir ao máximo’, reduzir ao mínimo.
Muitos leitores me escreveram com valiosas observações. Não houve propriamente uma discordância quanto à minha preferência, mas sim uma sugestão.
Em vez de “reduzir ao máximo”, seria correto também: reduzir o máximo.
A explicação é a seguinte: se o governo quer reduzir suas despesas ao mínimo, deve reduzir o máximo possível.
Observe outro exemplo:
“Ela reduziu o volume do rádio ao mínimo.
“Ela reduziu o volume do rádio o máximo possível.”
Os leitores mais uma vez têm razão.

Dúvidas dos leitores

qua, 19/10/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
A volta da polêmica crase
O leitor assíduo desta coluna já deve ter percebido a paixão deste professor por temas polêmicos.
Eu realmente adoro enfrentar assuntos que provocam discussão. Para mim, é um meio de aprendizado e consequente crescimento.
E nesse aspecto não poderia faltar a crase.
Depois de muito sofrer, o brasileiro consegue finalmente entender o uso do acento indicativo da crase: fusão de duas vogais iguais (preposição “a” + outro “a”).
O caso mais frequente de crase é a contração da preposição “a” com o artigo definido feminino “a(s)”.
Aí, quando o brasileiro acha que sabe tudo de crase, ele se depara com alguns “probleminhas”. O certo é … a vista ou à vista, a distância ou à distância?
O grande mestre Napoleão Mendes de Almeida em suas “Questões Vernáculas” dizia não haver crase. Segundo ele, não há artigo definido. Em “a vista”, a prova da ausência do artigo está no correspondente masculino “a prazo”.
No caso de “a distância”, a ausência do artigo definido se deve à ideia de distância indeterminada. Se fosse uma distância definida, haveria crase: “Estamos à distância de cinco metros”.
Por outro lado, existem autores que defendem a crase. Entre eles, está o mestre Adriano da Gama Kury que, no seu livro Ortografia, Pontuação, Crase, afirma: “Desde tempos antigos da nossa língua se vêm usando com acento no a (ou com dois aa, quando ainda não era generalizado o uso dos acentos) numerosas locuções adverbiais e prepositivas formadas de substantivos femininos, tais como à custa de, à espada, à farta, à fome, à força, à pressa, à toa, à vela, às avessas, às cegas, às claras, às pressas, às vezes e tantas mais. (…) Além disso, cumpre levar em conta estes dois fatores que aconselham a utilização do acento no a nas locuções com nomes femininos:
1o) o uso tradicional do acento pelos melhores escritores da nossa língua;
2o) a pronúncia aberta do a, em Portugal, nessas locuções, tal como qualquer a resultante de crase – diferente do timbre fechado do a pronome, artigo ou preposição. (…)
De quanto se expôs acima, deve-se recomendar o uso do acento no a em locuções como as seguintes (adverbiais, prepositivas, conjuntivas): à beça, à deriva, à distância, à mão, à medida que, à moda de, à procura de, à proporção que, à revelia, à toda, à vista…”
Se os grandes mestres divergem, o que me resta é assumir uma posição que pode perfeitamente mudar, pois estou aberto a novas informações e a fortes argumentos.
No meio jornalístico, não posso responder “tanto faz”. De nada adianta afirmar que fulano diz “sim” e que cicrano diz “não”.
É inaceitável usarmos “à vista” na primeira página e “a vista” na página 3. Somos criticados quando escrevemos “ensino à distância” no título e “a distância” no corpo da matéria. Necessitamos de uma uniformidade de pensamento, de um padrão, mesmo que isso não agrade a todos.
Em razão disso, com o intuito de simplificar e de facilitar o nosso trabalho, adotamos a crase, ou seja, sugerimos o uso do acento grave para todos os adjuntos adverbiais femininos: à vista (de modo), à distância (de lugar), às vezes (de tempo), à mão (de instrumento)…
Isso não significa que somos os donos da verdade e que estão errados todos aqueles que defendem o uso de “a vista” e “a distância”.
O tema é polêmico, existem opiniões divergentes e não podemos reduzir a questão a uma simples discussão de certo ou errado.
Hoje eu penso assim, amanhã…

MAU ou MAL?
Leitor critica manchete jornalística: “Saúde em mal estado”.
O leitor tem razão. Estamos escrevendo muito mal. Quem está em mau estado é o nosso texto.
Não esqueça:
MAU é o contrário de BOM;
MAL é o contrário de BEM.
Se você não escreve bem, é porque escreve mal; se a Saúde não está em bom estado, é porque está em mau estado.

DA ONDE ou DE ONDE?
Leitora escreve: “Outra coisa que me irrita é ouvir alguém perguntar: Você é da onde?
A irritação da leitora é justificável. A forma “da onde” simplesmente não existe.
Sempre que houver a ideia de procedência “de” algum lugar, devemos usar a forma DE ONDE.
Portanto, devemos falar:
“Esta é a cidade de onde ele veio.”
“Quero saber de onde você vem.”

Dúvidas dos leitores

qua, 12/10/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
“Eu acho que eu não vou vim não…”
Alguns leitores desta coluna querem a minha opinião a respeito do uso do verbo ir como auxiliar na formação do futuro.
Leitor reclama: “…sinto calafrios quando ouço ou leio coisas terríveis como o comercial de um curso de inglês em que a jovem pergunta: …e você não vai vir estudar…?
Outro leitor pergunta: “É costume no sul, principalmente entre os gaúchos, usar a expressão vou ir, ou então, vinha vindo. Estas expressões estão certas?”
Na linguagem dos brasileiros, está cada vez mais frequente o uso do verbo ir como auxiliar do futuro: em vez de eu falarei, a maioria diz eu vou falar; em vez de ele jogará, preferem ele vai jogar; em vez de nós proporemos, fica melhor nós vamos propor.
Até aqui, tudo bem. Em determinadas situações, eu também prefiro o uso do verbo ir como auxiliar. Na linguagem falada, por exemplo, a forma ele vai querer é muito melhor que o horrorosoele quererá.
Entretanto, o uso excessivo do verbo ir empobrece o estilo e com alguns verbos fica no mínimo estranho.
O problema maior ocorre quando o verbo ir acompanha o próprio verbo ir ou o verbo vir. É a história do “eu vou ir” e do ridículo “eu vou vir”.
A forma eu vou ir parece redundante. Eu irei fica melhor. E a forma eu vou vir parece absurda. É melhor falar eu virei.
Agora, inexplicável é o tal do “eu vou vim”. É importante lembrar que a forma “eu vou vim” é inaceitável. Está totalmente errada. A forma “eu vou vim” simplesmente não existe.
Então, para ficar bem claro, eu vou repetir: dizer eu vou sair, ele vai viajar, nós vamos estudar…tudo bem; em vez de eu vou ir, diga eu irei; em vez de eu vou vir, diga eu virei; e nunca mais diga “eu vou vim”.
MANDADO ou MANDATO?
O leitor tem razão. Muitos confundem os parônimos (=palavras formalmente parecidas e com significados diferentes).
a) MANDATO significa “representação, delegação, poderes que os eleitores conferem aos vereadores, aos deputados, aos senadores, aos prefeitos, aos governadores e aos presidentes para os representar”. Daí, “O mandato do Presidente da República é de quatro anos”; “Querem cassar o mandato de três deputados federais”.
b) MANDADO é “o ato de mandar; ordem ou despacho escrito por autoridade judicial ou administrativa”. Portanto, uma ordem judicial é um mandado: “mandado de prisão, mandado de segurança, mandado de busca e apreensão…”

TRAGO ou TRAZIDO?
Leitora quer saber:
“Como se usa tinha trago/trazido ou havia trago/trazido?”
A forma do particípio do verbo trazer é TRAZIDO. O certo, portanto, é dizer ele tinha trazido ouele havia trazido.
A forma trago só existe como primeira pessoa do singular do presente do indicativo do verbotrazer e do verbo tragar: “Eu trago os meus documentos sempre comigo” e “Às vezes eu fumo um cigarrinho, mas não trago.”
Isso significa que “tinha trago” e “havia trago” são formas inaceitáveis na língua padrão.
Fato semelhante ocorre com o verbo chegar. O certo é: ele tinha chegado ou ele havia chegado. As formas “ele tinha chego” e “ele havia chego” são inaceitáveis. A forma “chego”, como particípio, não existe.
A forma chego só existe na primeira pessoa do singular do presente do indicativo: “Eu semprechego antes da hora”.

Regência do verbo PROCEDER
Segundo o dicionário Aurélio, o verbo proceder, no sentido de “levar a efeito, fazer, executar, realizar”, é transitivo indireto.
O certo, portanto, é:
“Estamos impossibilitados de proceder ao pagamento da indenização relativa, haja vista…”

Eminente ou Iminente?
Leitor quer saber se está correta a frase: “Nessas ocasiões o clima fica tenso e as brigas sãoeminentes.”
O certo é: “Nessas ocasiões a clima fica tenso e as brigas são IMINENTES.”
Veja a diferença:
Eminente significa “ilustre, elevado, sublime”: “Ele é um político eminente”.
Iminente é “o que está prestes a acontecer”: “A chuva é iminente”, “Há um perigo iminente de explosão”.

Dúvidas dos leitores

qua, 05/10/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
Hoje é dia de “briga”.
São perguntas endereçadas a esta coluna cujas respostas certamente causarão alguma polêmica.
1a) A regência do verbo DESCULPAR
Leitor afirma: “Não concordo com a frase : Que tal? Desculpem a falta de modéstia. Aprendi: quem desculpa, desculpa alguém de alguma coisa. Portanto, o certo não seria: Desculpem da falta de modéstia? Alguns locutores de noticiário, sobretudo da Rede Globo, dizem: Desculpem a nossa falha. Quando o correto é: Desculpem da nossa falha técnica.”
O professor Luiz Antônio Sacconi, em seu livro 1000 erros de Português, 5ª edição, também critica a tal frase. Segundo o mestre, “a frase que os homens da televisão devem dizer, após um problema técnico, é esta: Desculpem-nos da nossa falha.” O mesmo professor, no livro Não erre mais, defende mais uma vez a regência do verbo: “Tanto desculpar (absolver, relevar) quantodesculpar-se (pedir desculpas) regem “de”, e não por.” Mais adiante afirma: “Desculpar-se(perdoar) ‘’é transitivo direto e indireto e rege a preposição “a” (…) Nesse mesmo sentido pode ser construído como transitivo direto: O chefe não desculpava os erros de seus funcionários.”
Não há dúvida de que o verbo desculpar, no sentido de “perdoar”, pode ser usado como transitivo direto (=sem preposição). Os nossos dicionários comprovam isso: “Não sabia como desculpasse …os pecados do povo” (Caldas Aulete), “Desculpou a inadvertência do funcionário.” (Michaelis).
O problema é o uso do verbo desculpar-se, no sentido de “pedir desculpas”. Nesse caso, há uma certa uniformidade entre nossos autores: desculpar-se “de” alguma coisa. Assim sendo, em textos formais, a regência clássica exigiria: “Desculpem-me da falta de modéstia” e “Desculpem-nos da nossa falha”.
Entretanto, na linguagem coloquial brasileira, não há dúvida de que a regência popular vem consagrando o verbo desculpar, tanto no sentido de “perdoar” quanto no de “pedir desculpas”, como transitivo direto (=sem preposição). Não devemos, portanto, reduzir o caso a uma simples questão de certo ou errado. É, portanto, mais um problema de adequação da linguagem: em textos formais, você deve “desculpar-se de alguma coisa”; em textos informais, você pode“desculpar alguma coisa”.
Fim do 1º “round”.
2a) Uso do INFINITIVO PESSOAL
Carta de leitor: “A minha dúvida é sobre as seguintes construções:
1ª) Fama e Beleza Plástica, malhação e outros truques das celebridades para FICAR mais bonitas.
2ª) Os pacientes da doutora Valéria, uma atrasada assumida, aguardam em média uma hora para SER atendidos.”
A dúvida do nosso leitor é a mesma de muita gente boa. Quanto ao uso do infinitivo, há muita divergência entre os estudiosos. Já discutimos o assunto mais de uma vez. Para alguns autores, o infinitivo nunca se flexiona; outros afirmam que é um caso facultativo; e há aqueles que exigem a concordância no plural.
A minha preferência é flexionar o infinitivo em três situações:
1a) Quando o sujeito plural vier expresso imediatamente antes do infinitivo:
“Houve uma ordem para os alunos saírem.”
“O professor mandou os alunos saírem.”
2a) Quando houver perigo de ambiguidade:
“O professor liberou os alunos para verem o jogo.”
(=para que os alunos vissem o jogo, e não somente o professor)
3a) Na voz passiva ou com verbos de ligação:
“…e outros truques das celebridades para ficarem mais bonitas.”
“Os pacientes aguardam em média uma hora para serem atendidos.”
Fim do 2o round.
3a) Regência do verbo INFORMAR
O verbo informar é transitivo direto e indireto. Você pode informar alguma coisa (OD) a alguém (OI) ou informar alguém (OD) de alguma coisa (OI).
Construir a frase com dois objetos indiretos é considerado erro: “Venho informar aos senhores associados (OI) das novas alterações estatutárias (OI).”
Há duas opções corretas:
1a) “Venho informar aos senhores associados (OI) as novas alterações estatutárias (OD).” ou
2a) “Venho informar os senhores associados (OD) das novas alterações estatutárias (OI).”
Leitor quer saber se a construção “Vem informá-lo que…” estaria certa ou errada.
Sem dúvida, não é a melhor construção.
Prefiro: “Vem informar-lhe (OI) que…(OD)” ou
“Vem informá-lo (OD) de que… (OI)”.
Na frase “Vem informá-lo que…”, teríamos dois objetos diretos. Entretanto, não posso considerar uma construção errada, pois muitos autores afirmam que o uso de preposições antes da conjunção integrante “que” não é obrigatório:
“Eu preciso (de) que você me ajude.”
“Eu acredito (em) que ele volte.”
“Tenho a certeza (de) que ele voltará.”
Assim sendo, a frase “Ele vem informá-lo (de) que a reunião será às 10h” é aceitável.
Fim do 3o round e da briga.

Dúvidas dos leitores

qua, 28/09/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
MANTERIA-SE  ou  MANTER-SE-IA?
Não existe ênclise (=pronome átono depois do verbo) quando o verbo está no futuro do presente do indicativo ou no futuro do pretérito. Isso significa que as formas “manteria-se, tornarei-me, sentará-se, realizaria-se” são inaceitáveis.
Quando o verbo está no futuro do indicativo, podemos usar o pronome em mesóclise: manter-se-ia, tornar-me-ei, sentar-se-á, realizar-se-ia.
Se a ênclise (=manteria-se) está errada e a mesóclise (=manter-se-ia) está correta, mas ficaria inadequada num texto mais coloquial, que fazer?
Basta pôr o sujeito antes do verbo. Assim, poderemos usar o pronome em próclise (=antes do verbo): “A pressão se manteria…”, “Eu me tornarei…”, “Ele se sentará…”, “A reunião se realizaria…”.

Via de ESCAPE PRINCIPAL ou Via PRINCIPAL DE ESCAPE?
Leitor quer saber qual é a forma correta.
Não é uma questão de certo ou errado. É uma questão de clareza. O adjetivo principal se refere àvia, e não ao escape. Portanto, a melhor construção é “Via PRINCIPAL de escape”.
O mesmo ocorre em “Via ALTERNATIVA de escape”. Não é um “escape alternativo”, e sim uma “via alternativa”.
Isso tudo me fez lembrar a loja que vendia “roupas para homens de segunda mão”.

VERBOS
O uso dos verbos sempre merece atenção especial. Hoje, temos duas observações a fazer:
1a) O abandono do modo subjuntivo.
É frequente ouvirmos:
“Acredito que ele vai ao jogo.”
“Eu acho que ele está de férias.”
Como são duas suposições, deveríamos usar o modo subjuntivo:
“Acredito que ele  ao jogo.”
“Eu acho que ele esteja de férias.”
Pior que não usar o modo subjuntivo é usá-lo erradamente: “…que esteje de férias”, “…que eleseje convidado”.
Não esqueça que “coisas” do tipo esteje, teje, seje simplesmente não existem.
2a) A troca do futuro do pretérito pelo pretérito imperfeito do indicativo.
Observe:
“Se não chovesse, eu ia ao jogo.”
“Se fosse permitido, eu fazia o trabalho.”
É importante lembrar que há uma correspondência entre o pretérito imperfeito do subjuntivo (=chovesse, fosse) com o futuro do pretérito do indicativo (=iria, faria).
Deveríamos, portanto, dizer:
“Se não chovesse, eu iria ao jogo.”
“Se fosse permitido, eu faria o trabalho.”
Leitora quer saber se uso do pretérito imperfeito do indicativo em vez do futuro do pretérito é correto na linguagem informal.
O nosso problema é sempre reduzir o caso à história do certo ou errado. O que eu posso dizer é que o uso do pretérito imperfeito do indicativo (=ia, fazia, devia), em substituição ao futuro do pretérito do indicativo (=iria, faria, deveria), era frequente no português arcaico e ainda é muito usado no português de Portugal.
Aqui no Brasil, é uma característica da nossa linguagem coloquial (=linguagem informal). Sugiro que evitemos em textos formais.

SENÃO ou SE NÃO?
Atendendo a pedidos, estamos voltando ao assunto.
1o) SE NÃO = se (conjunção condicional = caso) + não (advérbio de negação):
Se não houver dinheiro, cancelaremos o projeto.” (=Caso não haja dinheiro);
“Ele será demitido, se não apresentar uma boa justificativa.” (=caso não apresente uma boa justificativa).
“Assine o contrato hoje, se não, perderemos o prazo.” (antes de vírgula = caso não assine/ caso contrário).
2o) Usaremos SENÃO em três situações:
a)    SENÃO = mas sim, porém:
“Não era caso de expulsão, senão de advertência.” (=mas sim de advertência);
b)    SENÃO = apenas, somente:
“Não se ouviam senão os tambores.” (=Somente os tambores eram ouvidos);
c)    SENÃO = defeito, falha:
“Não houve um senão em sua apresentação.” (=Não houve falha alguma, nenhum defeito).

Dúvidas dos leitores

qua, 21/09/11
por snogueira.sn |
categoria Dicas
O uso do ponto e vírgula
O ponto e vírgula indica uma pausa maior que a vírgula.
Vejamos as situações em que o seu emprego é mais frequente:
1a) para separar os membros de um período longo, especialmente se um deles já estiver subdividido por vírgula:
“Na linguagem escrita é o leitor; na fala, o ouvinte.”
“Nas sociedades anônimas ou limitadas existem problemas: nestas, porque a incidência de impostos é maior; naquelas, porque as responsabilidades são gerais.”
2a) para separar orações coordenadas adversativas (=porém, contudo, entretanto) e conclusivas (=portanto, logo, por conseguinte):
“Ele trabalha muito; não foi, porém, promovido.” (indica que a primeira pausa é maior, pois separa duas orações)
“Os empregados iriam todos; não havia necessidade, por conseguinte, de ficar alguém no pátio.”
3a) para separar os itens de uma explicação:
“A introdução dos computadores pode acarretar duas consequências: uma, de natureza econômica, é a redução de custos; a outra, de implicações sociais, é a demissão de funcionários.”
4a) para separar os itens de uma enumeração:
“Deveremos tratar, nesta reunião, dos seguintes assuntos:
a)    cursos a serem oferecidos, no próximo ano, a nossos empregados;
b)    objetivos a serem atingidos;
c)    metodologia de ensino e recursos audiovisuais;
d)    verba necessária.

Se dirigir, não beba; se beber, não dirija.
Em frente ao Hospital Pinel, no Rio de Janeiro, havia um painel luminoso da CET-Rio. Lá estava a seguinte mensagem:
“Se dirigir; não beba
se beber; não dirija”
Certamente o hospital não tem culpa alguma. Louco ou bêbado estava quem escreveu a tal frase. Não pela mensagem em si, mas pela pontuação da frase. Provavelmente alguém disse para o autor: “Olha, tem um ponto e vírgula aí.” E o “letrado”, por garantia, tascou logo dois.
Ora, onde encontramos o ponto e vírgula bastaria a vírgula, pois se trata de uma oração subordinada adverbial condicional deslocada: “Se dirigir, não beba”. O ponto e vírgula seria perfeito entre as duas ideias, apontando, assim, uma pausa maior que a vírgula:
“Se dirigir, não beba; se beber, não dirija.”
É essa uma das utilidades do ponto e vírgula: indicar uma pausa maior que a vírgula e não tão forte quanto o ponto-final.
Portanto, o autor da frase acaba de perder três pontos na sua carteira de habilitação, por uma infração média contra a gramática.
Depois que grandes escritores já confessaram que não têm segurança para usar o ponto e vírgula, não serei eu o louco que vai considerar o mau uso do ponto e vírgula uma infração gravíssima, a menos que isso prejudique os aposentados…

Mais ponto e vírgula
Alguns leitores insistem em perguntar a respeito do “ponto e vírgula da Previdência”.
Afinal, está certo ou errado?
Quanto ao uso do ponto e vírgula, a frase está correta. O problema é a interpretação.
Primeiro, vamos lembrar a tal frase que está no artigo 201 da reforma da Previdência:
“…é assegurada a aposentadoria no regime geral de Previdência Social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: 35 anos de contribuição, se homem e 30 anos, se mulher; 65 anos de idade, se homem e 60 anos, se mulher…”
Segundo alguns juristas, o ponto e vírgula após a palavra mulher teria a função de um “e”, tornando as exigências cumulativas. Para outros, o ponto e vírgula teria uma ideia de exclusão, ou seja, anos de contribuição ou anos de idade. As exigências não seriam cumulativas.
A interpretação de que as exigências são cumulativas (=ideia aditiva) é a mais provável. Numa enumeração, geralmente o ponto e vírgula tem valor aditivo (=e). Entretanto, o ponto e vírgula permite outras interpretações. Na frase “Se dirigir, não beba; se beber, não dirija”, o ponto e vírgula tem valor de “ou”.
Dizer que o ponto e vírgula tem sempre o valor aditivo(=que é sempre igual a “e”) é no mínimo uma afirmativa perigosa.
Na verdade, faltou clareza ao texto, o que é inconcebível na redação de uma lei.
Se a intenção do autor do texto fosse realmente deixar clara a ideia de exigências não cumulativas, deveria ter substituído o ponto e vírgula pela conjunção alternativa “ou”: “…obedecida uma das seguintes condições: 35 anos de contribuição, se homem e 30 anos, se mulher ou 65 anos de idade, se homem e 60 anos, se mulher…”
Se, ao contrário, a ideia fosse de exigências cumulativas, o autor, em nome da clareza, poderia usar o “amado” ponto e vírgula desde que fizesse uma nova redação: “…obedecidas as seguintes condições: 35 anos de contribuição e 65 anos de idade, se homem; 30 anos de contribuição e 60 anos de idade, se mulher…”

Nenhum comentário :

Postar um comentário