Por Neusa Barbosa, do Cineweb
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Desde o seu longa de estreia, "De Punhos Cerrados" (65), realizado quando tinha apenas 26 anos, o diretor italiano Marco Bellocchio define os pontos cardeais de um universo temático, que vem explorando ao longo de mais de quatro décadas com notável liberdade de pensamento e coerência: a família, a religião e o poder instituído, seja na política, na polícia ou no sistema hospitalar.
O pessoal e o coletivo se unem, mais uma vez, em "A Bela que Dorme", o mais recente trabalho do cineasta, que competiu pelo Leão de Ouro no Festival de Veneza em 2012 e estreia em São Paulo e Belo Horizonte.
A história parte de um evento real, o caso Eluana Englaro, moça que ficou por 17 anos em coma na Itália e cujo pai lutou na justiça para desligar os aparelhos que a mantinham viva, em 2009.
Sem citar o nome de Eluana, mas remetendo claramente à batalha judicial e parlamentar que sacudiu a Itália em torno da eutanásia, Bellocchio afasta-se cada vez mais dos acontecimentos reais, usando-os como pretexto e pano de fundo para ficcionalizar e falar do que lhe interessa. Ou seja, de como o institucional pesa sobre a vida pessoal e vice-versa, em prejuízo da liberdade de pensamento e ação.
Toni Servillo interpreta Uliano Beffardi, um senador que passou pela dramática escolha de desligar os aparelhos da própria mulher, ganhando a oposição da filha, Maria (Alba Rohrwacher), que se torna uma militante pró-vida, mas se apaixona por um rapaz que defende posições opostas, Roberto (Michele Rondino).
Agora, o senador deve votar contra ou a favor de um projeto de lei que procura restringir a liberdade de decisão de familiares em caso da manutenção do suporte de vida a pacientes cronicamente incapacitados.
Isabelle Huppert atua como a Divina Madre, uma grande atriz que abandonou a carreira para cuidar da filha jovem, presa a um coma sem solução à vista. Maya Sansa, atriz de "Bom Dia, Noite", aqui é Rossa, uma drogada que tenta se suicidar, impedida por um médico, o persistente doutor Pallido (Pier Giorgio Bellocchio).
O veterano Roberto Herlitzka (o Aldo Moro em "Bom dia, Noite") interpreta um político e psiquiatra, a quem cabem alguns dos melhores diálogos deste filme profundamente contemporâneo e rico em significados, ao qual não falta uma ironia da melhor qualidade, fora a criatividade visual.
As sequências que mostram os políticos numa espécie de sauna, envolvidos em panos brancos, lembrando os antigos senadores romanos, diante da televisão que acompanha a votação do projeto de lei, estão entre algumas de suas melhores imagens.
A marca do mestre em ação está na segurança com que Bellocchio maneja as diversas posições em jogo sem procurar impor suas certezas sobre o público. Este enfoque plural permite que "A Bela que Dorme" escape da camisa-de-força que cerca os chamados "filmes de tese", até porque ele não elege nenhuma.
Na Mostra Internacional de São Paulo em 2012, Bellocchio venceu o prêmio de melhor filme para o júri de críticos. Em Veneza, foi premiado como revelação o ator Fabrizio Falco, que interpreta o irmão do militante Roberto, que tem problemas psicológicos e atormenta a rotina de sua família.
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Reuters
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