13/11/2013

Anátema para um economista


Marcus Eduardo: o mundo está entulhado de mercadorias (Foto: Divulgação)
Marcus Eduardo de Oliveira

As palavras a seguir foram proferidas pelo professor da Universidade de Surrey, Tim Jackson: “A ideia de uma economia de não crescimento pode ser um anátema para um economista. Mas a ideia de uma economia continuamente crescente o é para um ecologista. Nenhum subsistema pode crescer indefinidamente, em termos físicos. Os economistas têm de conseguir responder à questão de como um sistema econômico de crescimento contínuo pode caber em um sistema ecológico finito”.

No discurso entre as duas disciplinas - Economia e Ecologia -, talvez o maior dilema a ser resolvido seja justamente esse mencionado por Jackson: o de promover a conciliação entre os desejos ilimitados que vem com a economia, com a limitação de recursos oferecida pela natureza (ecologia), uma vez que a economia (sistema econômico) – um subsistema da bioesfera – não pode, por explícita limitação da natureza (sistema ecológico), crescer exponencialmente.

Se o objetivo maior é alcançar o desenvolvimento sustentável, enfrentando com rigor a crise ambiental que aflige o presente e ameaça seriamente as condições de vida no futuro, o debate entre essas disciplinas, entre esses sistemas, precisa evoluir e superar impasses.

Todos, sem exceção, querem viver melhor. Todos almejam uma vida com prosperidade. Todos querem ter um nível de vida razoável, digno, harmonioso, salutar. No entanto, não é possível levar crescimento econômico a todos, até mesmo porque crescimento econômico excessivo, além dos limites, não resolve a questão social, ao contrário: agrava as condições de vida, uma vez que fere os principais serviços ecossistêmicos que dão suporte à vida.

Ademais, não é (e nunca será) o crescimento quantitativo da economia aquilo que mais importa, mas sim o desenvolvimento qualitativo. Esse é um dos principais problemas que os economistas modernos precisam encarar: deixar de lado a ideia de “quantidade” e passar a perseguir a “qualidade”. Logo, é deixar de enaltecer o crescimento (quantidade), buscando pelo desenvolvimento (qualidade).

Foi justamente por buscar somente o crescimento físico, expandindo largamente a capacidade produtiva industrial, que a economia levou à humanidade a conviver com a mais séria crise climática de todos os tempos. 

Por isso urge quebrar a espinha dorsal do paradigma econômico que faz do aumento da produção e do consumo as bases de avanço (?) das economias modernas. Será que realmente isso é uma condição de avanço?

Por isso, os economistas tradicionais ainda encaram como um anátema (reprovação) a ideia de uma economia de não crescimento.

Os economistas “abrigados” na escola de pensamento neoclássico precisam entender que a economia é termodinâmica. O sistema produtivo é claramente termodinâmico e respeita, por isso, a lei da entropia. Toda produção econômica gera calor, e quanto mais produção (mais crescimento), mais calor, mais degradação, mais impacto entrópico. 

Não é possível produzir PIB (objetivo sagrado para os economistas tradicionais) sem produzir impacto ambiental e emissão de gás carbônico. Por isso, o crescimento expansivo deve ser veementemente condenado.

A economia está de corpo e alma inserida dentro da dinâmica do capitalismo que depende, para sobreviver, da criação de necessidades materiais cada vez mais artificiais e fúteis. 

Na verdade, parece que estamos presos a uma corrida armamentista de consumo desenfreado, no qual o vencedor será aquele que mais consumir, não importa o quê; o que importa é o quanto.

Para alimentar essas “necessidades”, para satisfazer essa gana por mais mercadorias, a economia “percebeu” que a natureza é um bem sem dono e rapidamente se apropriou dela, mas ignorou o fato desse bem ser de “natureza” escassa. 

Eis então que para produzir tudo quanto possível, a atividade econômica desfigurou completamente o semblante da natureza, dilapidando-a em várias frentes, ultrapassando quase todas as fronteiras ecossistêmicas (60% dos 24 principais ecossistemas estão totalmente degradados), “produzindo”, na ponta final, emissão de carbono. 

O aumento exponencial das emissões de carbono está diretamente associado à arrancada de produtividade e prosperidade do capitalismo. O mundo está entulhado de mercadorias, de uma produção sem limites, repleto de futilidades. E certamente não foi para isso que a economia surgiu. 

A economia nasceu para libertar o homem, para dar a ele condições de vida digna; hoje, no entanto, a economia o escraviza, além de degradar o planeta. 

Não é mais possível ignorar essa sentença. Definitivamente, o planeta não precisa de mais produção, de mais crescimento, de quantidade; precisa, sim, de mais desenvolvimento, de qualidade.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. prof.marcuseduardo@bol.com.br

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