23/07/2014

Plano funerário e seguro não se confundem

Apesar de ambos serem contratos de adesão, evolvendo relação de consumo, suas naturezas são distintas.
A morte não pode ser conceituada como um risco predeterminado.
Por Daniela Galvão
Repórter Dom Total

Com o argumento de que a venda de planos funerários por uma funerária de Minas Gerais, sem autorização e sem a observância dos requisitos legais configurava, em tese, crime contra o sistema financeiro, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) ajuizou uma ação civil pública pedindo a declaração de ilicitude das atividades da sociedade. Liminarmente ela requereu que a condenação da funerária a se abster de comercializar, realizar a oferta, veicular ou anunciar qualquer modalidade de seguro; a suspensão da cobrança de valores devidos pelos associados ou consumidores; o envio de correspondência aos associados comunicando a concessão da tutela; a fixação de multa em caso de descumprimento das determinações anteriores; a indisponibilidade de todos os bens da empresa ré e dos administradores, bem como a exibição de documentos em juízo pela funerária.
 
Por sua vez, a funerária, em sua defesa, afirmou que como não atua como sociedade seguradora, não precisava da autorização da Susep para comercializar planos funerários. Segundo a juíza federal substituta da 14ª Vara da Justiça Federal em Minas Gerais, Anna Cristina Rocha Gonçalves, a questão fulcral é saber se plano funerário ofertado por uma funerária pode ser enquadrado como plano de seguro, nos termos da legislação civil. A magistrada ressalta que o contrato de prestação de serviço oferecido pela funerária, apesar de ter alguma semelhança com os contratos de seguro ofertados no mercado, não deve ser com eles confundido.
 
“Embora ambos sejam contratos de adesão, envolvendo relações de consumo, cada qual possui natureza absolutamente distinta, pois a prestação de serviços funerários, tal como ajustada no contrato ofertado pela parte ré, não se equipara ao pagamento de prêmios securitários, não se podendo dizer, tampouco, que seria uma garantia contra riscos predeterminados. A morte de um ser humano não pode ser conceituada como um risco predeterminado e sim como um evento futuro e certo. Dies certus an incertus quando (evento que ocorrerá com certeza, só não se sabendo quando)”, distingue a magistrada.
 
Ainda em sua decisão, ela registrou que “o contrato de prestação de serviços funerários não se amolda ao contrato de seguro definido no artigo 757, do Código Civil, e, assim sendo, a pretensão da requerente em restringir a atuação da requerida viola o preconizado pelo artigo 1º, IV, da Constituição Federal, que estabelece, como fundamentos da República Federativa do Brasil, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”. Essa foi a tese sustentada pelo ouvidor-geral da OAB-MG, advogado e professor de Estágio em Direito Administrativo da Escola Superior Dom Helder Câmara, André Luiz Lopes, que defendeu a funerária. De acordo com ele, “esta decisão tranquiliza as empresas que comercializam os planos funerários e que podem também ser acionadas pela Susep”.
 
Ainda conforme Anna Cristina Rocha Gonçalves, nenhum dos benefícios previstos no contrato da funerária tem natureza de prêmio, pois envolvem tão somente aspectos específicos de cerimônias fúnebres, tais como urnas funerárias, cremação, registro do óbito em cartório e ornamentação. O pedido da Susep foi julgado improcedente e os autos foram remetidos para o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, para o necessário reexame da matéria.
Redação Dom Total

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