Reportagem da Ecclesia nas ruas de Lisboa e na instituição Comunidade Vida e Paz mostra a morte e o nascimento de outros «Jesus»
Lisboa, 07 abr 2012 (Ecclesia) - Lisboa é outra aos olhos de quem noite após noite é voluntário na Comunidade Vida e Paz, vivendo a ressurreição no renascer dos sem-abrigo.
Carlos Castanheira recorda, ainda com dificuldade, o tempo em que, apesar de não ser sem-abrigo, conheceu a realidade das ruas: “Dormi em vãos de escada e passei algumas noites na rua para não chegar a casa num estado que me envergonhava”. “Hoje consigo compreender o que se passou, mas no princípio era como explorar novos pensamentos, que pensava eu, me levariam a algo significativo ou me iria mostrar algo positivo”, refere à ECCLESIA, lembrando a mulher e as três filhas de quem acabou por se afastar. Desde os 16 anos que as drogas eram o mundo do mecânico e motorista de profissão Carlos Castanheira, hoje com quase 54 anos de vida. Depois de várias tentativas de suicídio e internamentos, este é um processo que, assume, ser para toda a vida. “Quando o organismo se sente bem com as substâncias que consumimos é muito perigoso. Só há duas saídas: a loucura ou a morte. Eu estive próximo das duas. Perdi valores como homem, como pai, vivia apenas para aquilo. Tudo o resto foi posto de parte. Bati mesmo no fundo do poço”, recorda. O Centro Regional de Alcoologia do Sul, as Taipas, o Hospital Júlio de Matos, o Hospital Curry Cabral, Carlos passou por todos, até que optou pela recuperação e bateu à porta da Comunidade Vida e Paz. O presidente desta instituição diz ser determinante ter a pessoa como sujeito do processo. “Sem impor, devemos cativar para que ela acredite que pode vir a ter uma vida diferente. O voluntário tem um papel fundamental”, indica Henrique Joaquim. Não há anonimato nas relações entre a pessoa sem-abrigo e voluntário da Comunidade Vida e Paz, num trabalho sem hora marcada, onde a liberdade e a confiança sustenta o aparente insucesso. “Há pessoas que estiveram na rua um ou dois anos. Mas há também quem estivesse 12 anos na rua todas as noites a ser contactado e ao fim de 12 anos tenha aceitado”, relata Henrique Joaquim, falando num trabalho gratuito e pessoal. O presidente da Comunidade Vida e Paz indica que a sua função é “ajudar a tirar a pedra do sepulcro” para que a outra pessoa “perceba a luz e a evidência para dizer «eu posso viver de outra forma»”. “Eles chamam-lhe um renascer”, indica Henrique Joaquim, fazendo referência ao “nascer de novo, sem voltar à barriga da mãe”. "Atrás da pedra está uma realidade que não foi inventada por mim. A minha função é tirar o que está à frente, mesmo sem saber o que vai dar aquela pessoa e aquela vida. É um ato de fé brutal”, prossegue. Três anos depois, Carlos Castanheira renasceu e é funcionário da Comunidade Vida e Paz, uma casa que é sua “segunda mãe”, encerrando o passado. “Eu estou aqui porque aparece alguém que pede ajuda, a mesma ajuda que eu vim cá pedir, e partilho a minha história. Eu sou uma pessoa que recebeu e recebi para dar. Essa é a minha missão nesta casa”, precisa. A ressurreição é o tema do programa Ecclesia na Antena 1 deste domingo de Páscoa, principal festa do calendário cristão, transmitido a partir das 06h00. LS/OC |
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