Com as ruas tomadas por manifestantes nesses últimos 15 dias, fica a questão: continuaremos a ter uma estabilidade política? Até quando? Enquanto isso, nas redes sociais crescem os boatos de possíveis golpes de Estado, derrubada de governos ou entrada de um estado de exceção por conta da turbulência dos eventos. Ainda no ´calor´ dos debates, algo parece certo, especialistas afirmam, porém, que não sabem ainda em que o movimento pode resultar daqui para frente.
Ministros Antonio Patriota e Maria do Rosário e mais centenas de pessoas participaram na tarde de ontem de um abraço simbólico ao Palácio Itamaraty, que foi depredado no último dia 20 FOTO: AGÊNCIA CÂMARA
Um alerta foi dado pelo titular da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame. Ele afirma que o Exército pode ser acionado para reforço durante protestos. Beltrame reconheceu não ter conseguido controlar todas as situações que aconteceram durante as últimas manifestações e disse que a segurança é um jogo que ninguém nunca vai vencer. "Controlamos muitas coisas que poderiam ter tomado dimensões maiores".
Apesar de subliminar, o discurso de possível derrubada de poder se alastra nas redes sociais: são vídeos, manifestos, abaixo-assinados pedindo a saída da atual presidenta. Tudo especulação, informe oficioso.
Sites e perfis das redes foram atacados por grupos anônimos.
Mas, para o constitucionalista cearense Valmir Pontes qualquer golpe de Estado é improvável nesse momento. Para ele, o maior legado desses últimos dias é o fortalecimento das ruas, o anseio do povo por ser ouvido.
Indevidas
"O amadurecimento da democracia é nosso maior legado hoje", afirma o constitucionalista. Para ele, essas cogitações são indevidas e oportunistas. Não há necessidade de se pensar em estado de exceção. "Isso é atitude de oposição querendo desestabilizar e fazer com que o atual processo de conscientização seja abortado". Sobre os atos de vandalismo ao património público, "é preciso coibir os danos. É necessário que o governo reprima os excessos, mas tudo dentro da lei, com responsabilidade.
"A hipótese de Estado de Sítio é impossível, político e juridicamente. Só se admite em caso de uma extrema convulsão interna", aponta o constitucionalista. Para ele, a maioria das manifestações têm sido pacíficas. Atos e pedidos são mais que legítimos.
Por isso, conforme Pontes, é preciso compreender e tolerar. "Só tem medo de negociar quem tem medo de perder o poder. Estamos vivendo um teste definitivo da nossa maturidade democrática. É um importante passo na vida brasileira", finaliza.
Imagem
Centenas de pessoas participaram na tarde de ontem de um abraço simbólico ao Palácio Itamaraty, que foi depredado, no último dia 20, durante as manifestações nas ruas de Brasília.
O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, criticou a violência ao prédio, considerado um dos mais belos exemplos de arquitetura, mas disse que os atos de vandalismo não prejudicam a imagem no exterior.
Preocupação
"A imagem do Brasil é de uma democracia, de uma sociedade aberta e plural, de amantes da paz, amantes do diálogo, e isso não será afetado por um fato isolado. O que eu estou preocupado é em transmitir essa mensagem aos jovens que se manifestam: façam de maneira pacífica que suas vozes serão respeitadas e ouvidas. Destruindo o patrimônio público, vocês não serão respeitados e não terão autoridade política e moral", diz Patriota.
O prédio, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, ficou com 62 janelas quebradas, além de vidros pichados e móveis destruídos. Peritos da Polícia Federal fizeram análises técnicas para verificar danos, prejuízos e problemas e o laudo deve ser concluído em cinco dias.
O abraço ao prédio reuniu principalmente funcionários do Itamaraty e alguns parentes, mas também teve a presença de servidores de outros ministérios. O ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, atual ministro da Defesa, também participou do ato.
Consolidada
A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, disse que, apesar dos atos de violência, a democracia no Brasil não está em risco porque ela está consolidada. "A democracia no Brasil é consolidada, inclusive com a liberdade de opinião nas ruas. Por isso, o reconhecimento de toda manifestação, mas nenhuma manifestação violenta é democrática, nenhum ato de violência é democrático".
Segundo Maria do Rosário, o governo e também a sociedade não apoiam nenhum tipo de manifestação violenta. "Quem utiliza de métodos violentos está abrindo mão do direito de usar a palavra, que é a principal ferramenta para a mudança do mundo", avaliou a ministra.
Mais cedo, ontem, um caminhão do Corpo de Bombeiros teve que ser acionado para retirar uma bandeira que foi pichada pelos manifestantes ontem e hasteada no mastro do Itamaraty.
Mídia internacional destaca mobilização de brasileiros
São Paulo. Os protestos que levaram mais de 1 milhão de pessoas às ruas de dezenas cidades brasileiras foram tratados com destaque pelos principais veículos de informação estrangeiros.

Principais sites de jornais e versões em impresso de todo o mundo destacaram os diferentes protestos que levaram
mais de 1 milhão de pessoas às ruas de várias cidades brasileiras, na última quinta-feira
Em sua página na internet, a rede pública britânica BBC destacou o reforço da segurança e a ação da Polícia no Rio de Janeiro, Brasília e em outras capitais. Ao falar sobre Rio de Janeiro e Brasília, a BBC apontou que os agentes de segurança usaram gás lacrimogêneo e balas de borracha contra os manifestantes. Por outro lado, a rede britânica também destacou que muitos prédios públicos na capital do País, inclusive o Itamaraty, foram alvo de violência.
Outro veículo de comunicação britânico, "The Guardian", também enfatizou os conflitos no Rio de Janeiro. Com o título, "Protestos no Brasil: polícia dispersa multidões no Rio", o texto publicado no site do jornal disse que uma minoria de manifestantes jogou pedras contra a Polícia, que respondeu com gás e balas de borracha em meio a viadutos "onde motoristas e passageiros de ônibus estavam presos no trânsito".
O periódico espanhol "El País" enfatizou a vitória dos manifestantes em São Paulo e Rio, onde os governos locais voltaram atrás no reajuste das tarifas do transporte público.
Já o "Le Monde", da França, e o "Clarín", da Argentina, destacaram a morte de um manifestante em Ribeirão Preto. Segundo a publicação francesa, o movimento de protestos "foi ofuscado pela morte de um manifestante, atropelado por um carro".
O "Le Monde" disse também que a grande novidade desta quinta-feira foi que alguns sindicatos, partidos políticos e a sociedade civil demonstraram a sua intenção de participar das manifestações com seus cartazes e bandeiras, mas que os manifestantes rejeitam desde o início do movimento qualquer rótulo".
Exigências
A emissora pan-árabe de televisão "Al Jazeera" afirmou que a presença dos manifestantes nas ruas denuncia a precariedade dos serviços públicos e a corrupção. Já o canal de televisão norte-americano CNN noticia a entrega, pelos manifestantes, de uma lista com uma ampla variedade de exigências ao governo federal.
Reportagem da versão online do jornal britânico "Financial Times" sobre os protestos no Brasil diz que a onda de descontentamento popular pode ser uma "séria ameaça" à presidente Dilma Rousseff nas eleições de 2014.
Em um editorial ontem com o título "O despertar social no Brasil", o jornal "The New York Times (NYT)" diz que a maioria silenciosa da população do Brasil parece estar encontrando sua voz política. E, nesse cenário, a presidente Dilma Rousseff terá que endereçar novas demandas com substância e entendimento.
Agressões contra jornalistas no País
A organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) afirmou ontem que aproximadamente vinte jornalistas foram agredidos pela Polícia ou manifestantes durante a onda de protestos que vem ocorrendo em diversas cidades do País. A RSF disse que a crítica aos meios de comunicação e sua cobertura não autoriza em absoluto as expressões de ódio contra os informadores e ainda menos as agressões físicas, e alertou que os episódios de violência registrados são "transbordamentos perigosos para o exercício das liberdades públicas".

O jornalista Caco Barcellos, da Rede Globo, foi um dos jornalistas atacados por manifestantes na cidade de São Paulo FOTO: AGÊNCIA ESTADO
Segundo a entidade, a maior parte das agressões sofridas por jornalistas presentes nas manifestações "são atribuíveis à Polícia Militar", mas "alguns manifestantes" também demonstraram hostilidade ao questionar "o modelo midiático dominante", disse a organização defensora da liberdade de imprensa.
Em São Paulo, Caco Barcellos, da Rede Globo, foi agredido por manifestantes. Um grupo de radicais destruiu veículos da TV Record e do SBT. Rita Lisauskas, da TV Bandeirantes, foi atingida no rosto por vinagre arremessado por manifestantes. O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) também publicou uma nota em seu site sobre a violência contra jornalistas durante os atos: 25 profissionais relataram terem sido atacados ou detidos nas manifestações.
Diário do Nordeste
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