Por trás das grades, erguem-se alguns prédios em tons de verde-claro. Pela entrada lateral, percebe-se uma oficial de segurança, fardada e atenta. Ela logo percebe a presença de pessoas estranhas à comunidade e se aproxima. Anota os nomes de cada um, dá as boas vindas e volta ao posto de vigilância. Outros dois seguranças também são avistados, trajando o mesmo uniforme e posicionados em outros pontos do local.
Sem a mesma visibilidade do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, o Centro Cultural Bom Jardim envolve a comunidade do bairro em torno de projetos como o cineclube e sessões gratuitas de teatro FOTO: KLEBER A. GONÇALVES
O estigma do bairro se reflete à primeira impressão, mas rapidamente se desfaz durante os primeiros passos no Centro Cultural Bom Jardim (CCBJ). O equipamento é mantido Insituto de Arte e Cultura do Ceará (IACC), o mesmo que gere o Centro Dragão do Mar de Arte E Cultura. No pátio em frente ao teatro, encontram-se dezenas de estudantes vestidos com o uniforme das escolas públicas municipais. Agitados e brincando entre si, eles esperam para assistir a uma peça. A visita, já corriqueira no cotidiano do CCBJ, é uma parceria entre o centro e colégios para integrar crianças e adolescentes ao cenário cultural.
"É uma oportunidade de ter acesso à cultura de qualidade, porque a gente é muito exigente com nossos artistas e apresentações", descreve Diana Pinheiro, gerente administrativa do CCBJ. Enquanto conversa com nossa equipe, a supervisora é interrompida por algumas crianças. Elas a abraçam, cumprimentam. Diana pergunta: "Vai fazer o que hoje?". A resposta é uma saída apressada, já que o espetáculo já estava prestes a começar no teatro.
"É fácil perceber como a comunidade gosta do espaço", conta a gerente. O equipamento foi inaugurado em 2006 e, com o passar do tempo e das necessidades, apresenta algumas carências. Diana Pinheiro relata que sente vergonha das paredes do local, cuja pintura nunca foi reforçada, mas contrapõe que o espaço é bem mantido e bem cuidado pela própria comunidade. Apesar de todo o entorno de violência presente no bairro, "(o CCBJ) não tem uma pichação, uma depredação de banheiro, eu nunca vi uma quebra de banco aqui dentro", afirma a administradora. Para ela, em questão de infraestrutura, as maiores necessidades do centro cultural são reparos em infiltrações causadas pelas chuvas e melhoramento na acústica das salas, que reverberam bastante e atrapalham algumas atividades, principalmente os cineclubes.
Violência e arte
Quanto à segurança do equipamento, Diana Pinheiro confessa que, no começo, sentia receio pelo estigma da violência ligado ao bairro. "Quando chegamos aqui, eram quatro seguranças. Com o tempo, percebemos que não era necessário tudo isso. A comunidade foi se apropriando (do Centro) de uma forma muito pacífica", relata. Conforme a diretora, os moradores e frequentadores do CCBJ sofrem com o preconceito atrelado ao lugar onde vivem, uma consequência do comportamento de apenas uma parcela dos residentes. "Essas são pessoas dignas, trabalhadoras", afirma Diana. A diretora acrescenta "criativas" como característica dos moradores, apresentando algumas esculturas de argila que decoram o Centro. "Esse é o produto de uma oficina realizada com crianças que nunca haviam trabalhado com isso antes", conta, ressaltando a revelação de talentos escondidos pelo estigma. "Só no Grande Bom Jardim, são 60 bandas e mais de 60 grupos de teatro".
A gerente afirma que, mesmo em períodos de dificuldade ou de fim de contratos, o Centro nunca deixou de ofertar programação à comunidade. De acordo com a administração do CCBJ, somente no mês de maio foram atendidas 6550 pessoas. Ao todo, o Centro conta com 41 funcionários.

Segundo Diana, o CCBJ trabalha com formação de plateias, parceria com artistas e realização de cursos diversos - todos gratuitos. "Uma vez por mês, é sagrado, a gente faz uma reunião com todos os artistas para que eles apresentem suas propostas para o Centro. É aí que a gente resolve a programação" detalha a gerente administrativa. Desses projetos saem as opções de ocupação dos espaços disponíveis no Centro Cultural Bom Jardim: cineclube, teatro, estúdio de música, biblioteca, ateliê de pintura, salas de informática, sala de dança e galeria. "Independente das verbas que a gente tenha ou não tenha, a comunidade aqui é muito carente de espetáculos, então a gente tá sempre movimentando", afirma Diana Pinheiro.
Dentre as atividades, uma das principais procuras são as aulas de dança. O número de alunos passa dos 200; "as professoras não sabem dizer não, é uma loucura", comenta a gerente administrativa, aos risos. A sala onde acontecem as práticas é destinada a comportar apenas 20 dançarinos por vez, mas há momentos em que os bailarinos ultrapassam os 30 ou 40. Já a biblioteca dispõe de mais de três mil livros e 500 periódicos. O acervo, contudo, ainda é muito pequeno para permitir empréstimos. De acordo com a bibliotecária, 80 pessoas visitam o espaço todos os dias. Uma reforma no espaço já está prevista, de modo a criar um segundo andar e permitir a separação entre crianças e adultos.
O Teatro Marcus Miranda, com capacidade para acomodar confortavelmente 180 pessoas, permite vários tipos de apresentação, já que o palco modular também é móvel.
Segundo a administração, 40 novos cursos gratuitos serão ofertados à população em geral e à comunidade a partir de julho. O Centro já conta com equipamentos para oficinas de pintura, design, costura, informática e inglês.
Mais informações:
Centro Cultural Bom Jardim
Rua Três Corações, 400 - Bom Jardim. Contato: 55 (85) 3488 8600 / 55 (85) 3488 8608
Programação disponível em dragaodomar.org.br/ccbj/
Diário do Nordeste
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